LIMA, Sostenes C. Hipergênero - agrupamento ordenado de gêneros [Tese de doutorado]
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UNIVERSIDADE DE BRASLIA
INSTITUTO DE LETRASDEPARTAMENTO DE LINGUSTICA, PORTUGUS E LNGUAS CLSSICAS
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LINGUSTICA
Sostenes Cezar de Lima
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HIPERGNERO AGRUPAMENTO ORDENADO DE GNEROS NA
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Sostenes Cezar de Lima
HIPERGNERO: AGRUPAMENTO ORDENADO DE GNEROS NA CONSTITUIO DEUM MACROENUNCIADO
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DEDICATRIA
Para as pessoas com quem formo uma s vida:
P i ill A G b i l M i
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AGRADECIMENTOSTese um evento que encerra um longo ciclo de vida. Com ela termina nossacarreira de estudante. Chegam ao fim uma identidade, um papel social e um estilode viver. Perdemos um lugar social; perdemos um jeito de ser e de agir no mundo.
Depois da tese, podemos at ter outras experincias estudantis, mas nenhumadelas, imagino, ter a mesma natureza. A condio de ser estudante no ser maisa mesma.
Ningum passa por esse longo trajeto de vida sozinho; ningum chega ao fim deum doutorado sozinho; ningum vive sozinho. Em minha vida, sempre estiverodeado de pessoas que me fizeram acreditar que eu poderia chegar aoencerramento desse ciclo. Essas pessoas no apenas me incentivaram e me
apoiaram; elas me ajudaram a construir um jeito bom e eficaz de ser estudante.Aqui deixo o meu tributo a todas as pessoas que fizeram e fazem parte de minhavida de estudante e da minha vida pessoal como um todo. Um agradecimentoespecial:
A Deus,por ter semeado no corao humano o desejo de saber. No tenho dvidasde que a fascinao que ns humanos temos pelo conhecimento um movimentode Deus em nossa interioridade.
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Ao meu sogro e sogra, Adilson Ribeiro e Ebe Ribeiro, e aos meus cunhad@s,pelo acolhimento afetuoso e por oferecem Gabi e Mari aconchego e cuidado,quando eu e a Priscilla tnhamos que ir Braslia ou a Goinia.
minha orientadora, Maria Luiza M. S. Coroa, pela primorosa orientao epela afetuosa companhia. Conheci voc, Malu, ainda no primeiro ano de mestrado.Desde ento me senti cativado por uma profissional extraordinariamentecompetente. Mas voc no apenas uma profissional competente; voc no umapessoa comum. Aliado ao seu profissionalismo, existe uma ternura sublime. Vocme fez ver que vida, afeto, companheirismo so perfeitamente compatveis comuma jornada de pesquisa.
Aos amigos, Andr Lcio Bento e Marco Antonio R. Machado, por teremparticipado intensamente do meu percurso de doutorado e da minha pesquisa. Emnossas trocas de ideia, sempre tive a oportunidade de aprender e de perceber novasnuances do discurso e do texto. Alm disso, vocs me ajudaram em certosaspectos, que talvez nem se lembrem ou nem saibam.
Aos meus amig@s, pela boa companhia, pelas boas conversas e pelo apoio ecolaborao. Muitas pessoas estiveram comigo nestes anos de doutorado e emoutras fases da vida. O que posso dizer a vocs : sem os amigos a vida invivel.
Aos amig@s do curso de Letras da UEG e da UniEvanglica, pelo apoio eincentivo.
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RESUMO
Esta tese tem como objetivo apresentar um arcabouo terico-conceitual com vistas a
explicar o modo como se constitui e se organiza, sociorretrica e discursivamente, umhipergnero. Prope-se que o hipergnero seja visto como um macroenunciado composto
por um conjunto de gneros tpicos que se agrupam de modo ordenado e articulado. Para a
construo desse arcabouo terico, revejo os conceitos de mdia, como uma unidade de
interao (BONINI, 2011) e de mediao dos gneros, e o conceito de suporte, como um
componente material da mdia no qual se ancoram os gneros. Esta reflexo terica sedesenvolve a partir de um quadro de confluncia disciplinar, composto pela Anlise
Sociorretrica de Gneros (ASG), Anlise Crtica de Gneros (ACG) e Anlise de Discurso
Crtica (ADC). A revista semanal de informao tomada aqui como objeto de anlise, com
fim de ilustrar as categorias tericas propostas. Analisa-se uma amostra de quatro exemplares
d i d d d d i i i i i d i f
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ABSTRACT
This dissertation aims to present a theoretical and conceptual approach in order to explain
how a hypergenre is socio-rhetoric and discursively constituted and organized. It is proposed
that the hypergenre is a macro enunciation composed by a set of typical genres that are
orderly grouped together. In order to construct this theoretical framework, I review the
concepts of textual media, as a unit of interaction (BONINI, 2011) and mediation of genres,
and the concept of textual support, as a material component of the media in which the genres
are anchored. This theoretical reflection grows out of a confluence of disciplinary
framework, composed by Socio-rhetoric Genre Analysis (SGA), Critical Genre Analysis
(CGA) and Critical Discourse Analysis (CDA). The weekly news magazine is taken here as
an object of analysis, to illustrate the theoretical categories proposed. A sample of four copies
of the magazine is analyzed, one copy from each of the four major weekly news magazines
of Brazil: CartaCapital, poca, Isto and Veja. In applying the theoretical framework
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RESUMENEsta tesis tiene como objetivo presentar una estructura terica y conceptual para explicar
cmo el hypergnero es constituido y organizado, socio retrica y discursivamente. Se
propone que el hypergnero sea conceptualizado cmo un macroenunciado compuesto de unconjunto de gneros tpicos que se agrupan juntos, de un modo ordenado y coordinado. Para
la construccin de este marco terico, se revisan los conceptos de medios, como una unidad
de interaccin (BONINI, 2011) y de mediacin de los gneros, y el concepto de apoyo, como
un componente material de los medios en el que se anclan los gneros. Esta reflexin terica
surge de la confluencia de un marco disciplinario, compuesto por el Anlisis de GnerosSocio Retrica (AGSR), Anlisis Crtico de Gneros (ACG) y Anlisis Crtico del Discurso
(ACD). La revista semanal de informacin se toma aqu como un objeto de anlisis, para
ilustrar las propuestas de categoras tericas. Se analiz una muestra de cuatro ejemplares de
la revista, siendo uno de cada una de las cuatro principales revistas semanales de informacin
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LISTA DE FIGURAS E QUADROSQuadro 1Modelo multidimensional de anlise do discurso escrito............................................................ 31Quadro 2Nveis nas anlises de gneros e de discurso ............................................................................. 35Quadro 3Movimentos retricos da introduo de artigos de pesquisa ....................................................... 50Quadro 4Modelo CARS para introduo de artigos de pesquisa............................................................... 50Quadro 5Anncio publicitrio na forma de bula de remdio .................................................................... 57 Quadro 6Cadeia de gneros para submisso de Artigo em Congresso ...................................................... 63 Figura 1Disposio em contnuo: mdia, suporte, hipergnero e gnero.................................................... 77Figura 2Correlao entre gnero, hipergnero, mdia e suporte ................................................................ 78 Quadro 7Tipos de interao segundo Fairclough (2003) ........................................................................ 114Quadro 8Mudana nos instrumentos e tcnicas de registros da escrita .................................................... 134Quadro 9Caractersticas do enunciado (BAKHTIN, 2010[1952-53], p. 281) aplicadas ao jornal ...... ...... .... 151Figura 3Gneros e hipergneros na relao oralidade e escrita ............................................................... 154Quadro 10Estruturao retrica do hipergnero sesso plenria ............................................................. 163Figura 4Exemplo do gnero organizadorsumrio.................................................................................. 164Figura 5Sesso plenria transposta para o sistema de mediao eletrnico-digital.................................. 166Figura 6Menu em hiperlink do hipergnero sesso plenria ................................................................... 167
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Quadro 19Estruturao retrica do gnero legenda ................................................................................ 223Quadro 20Classificao dos gneros formadores dos blocos retricos .................................................... 224
Figuras 19 e 20Capa No podemos ceder presso e Sumrio .......................................................... 250Figura 21Nota A pobreza tem cor ..................................................................................................... 251Figura 22Reportagem Um poeta na mais alta corte ........................................................................... 252Figuras 23 e 24Artigos de opinio O julgamento do mensalo e Poltica de uma nota s ............... 255Figura 25Reportagem Contra a austeridade...................................................................................... 256Figura 27Capa ...................................................................................................................................... 259Figura 28Reportagem Para tirar o ministro ...................................................................................... 260Figura 29Micro reportagem De carona nos carros da Delta.............................................................. 261Figura 30Reportagem Um jogo de perde-perde................................................................................. 262Figura 31Micro reportagem Ponte area entre Rio e Paris................................................................ 263Figuras 32 e 33Capa Veta, Dilma e Editorial Atentado floresta................................................... 264Figura 34Reportagem Conexo Hawala............................................................................................ 265Figura 35Reportagem Inimigos na trincheira.................................................................................... 267Figura 36Reportagem Veta, Dilma.................................................................................................... 268Figura 37Capa Nas guas do Cachoeira ........................................................................................... 271Figura 38Reportagem Os dois senadores"........................................................................................... 272
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SUMRIO
DEDICATRIA .......................................................................................................................................... 4AGRADECIMENTOS ................................................................................................................................. 5RESUMO .................................................................................................................................................... 7ABSTRACT ................................................................................................................................................ 8RESUMEN .................................................................................................................................................. 9LISTA DE FIGURAS E QUADROS .......................................................................................................... 11LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS .................................................................................................. 12SUMRIO ................................................................................................................................................. 13INTRODUO ......................................................................................................................................... 17CAPTULO 1............................................................................................................................................. 21CAMPOS TERICOS INTERDISCIPLINARES ........................................................................ ............... 21
1.1 Percurso histrico da Anlise de Gneros ......................................................................................... 22
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2.1 Em torno do conceito de mdia ......................................................................................................... 772.1.1 Escolha terminolgica............................................................................................................... 78
2.1.2 Conceito de mdia na midiologia de Debray .............................................................................. 792.1.3 Conceito de mdia em Bonini .................................................................................................... 88
2.2 O torno do conceito desuporte......................................................................................................... 892.2.1 Conceito de suporte em Debray................................................................................................. 902.2.2 Conceito de suporte em Marcuschi ............................................................................................ 922.2.3 Conceito de suporte em Bonini ................................................................................................. 99
2.3 Em torno do conceito de hipergnero ............................................................................................. 1022.3.1 Hipergnero nos estudos da cibercultura ................................................................................. 1022.3.4 Conceito de hipergnero em Bonini ........................................................................................ 103
2.4 Resumo do captulo........................................................................................................................ 106CAPTULO 3........................................................................................................................................... 109MDIA, SUPORTE E HIPERGNERO: CONSTIUIO DOS PROCESSOS DE MEDIAO E
AGRUPAMENTO ORDENADO DOS GNEROS .................................................................................. 1093.1 Mdia e mediao de gneros ......................................................................................................... 110
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INTRODUO
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Assim, paralelo s mudanas feitas no roteiro da viagem, comeamos a elaborar umaespcie de dirio de bordo, no qual registramos os encontros e desencontros que vo
acontecendo no percurso. Quando chegamos ao fim, o dirio deve estar pronto. ora de
apresent-lo pblica e oficialmente, para que se avalie a vivacidade, relevncia, coerncia,
plausibilidade do que se realizou durante a viagem e do destino a que se chegou.
Esta tese segue, em linhas gerais, o panorama de viagem brevemente relatado acima. um dirio no qual expresso o que fiz, e o destino a que cheguei, depois de percorrer esses
anos de doutorado.
No projeto apresentado inicialmente, estava previsto, como objetivo geral, analisar a
constituio sociorretrica da revista semanal de informao, vista aqui como um grande
gnero formado a partir do agrupamento ordenado de vrios outros gneros. O foco estava,portanto, na anlise que se faria do objeto, no propriamente na caracterizao terico-
conceitual desse objeto. Os caminhos e movimentos da viagem acabaram mostrando a
necessidade de uma parada na teorizao do objeto. Essa parada acabou se tornando o destino
final desta tese. Fiz uma pequena viagem ao campo da anlise, mas apenas para mostrar
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Essas trs questes passaram a sinalizar os caminhos a serem tomados nesta tese.Nessa perspectiva, assumi o desafio de parar num determinado ponto da viagem para, assim,
construir uma pesquisa muito mais voltada reflexo terica que anlise.
Contudo, antes da parar no campo da elaborao terica, notei ser necessrio fazer
uma viagem ao campo das disciplinas, as quais indicam as fronteiras tericas e
epistemolgicas do percurso. No Capitulo 1, Campos tericos interdisciplinares,apresento incialmente as duas disciplinas, a Anlise Sociorretrica de Gneros (ASG) e a
Anlise de Discurso Crtica (ADC), que oferecem a plataforma para as exploraes terico-
conceituais. O estudo da ASG e ADC, como campos dentro quais poderia elaborar a reflexo
terica, me mostrou um campo interdisciplinar, a Anlise Crtica de Gneros, bastante frtil
explorao simultnea do gnero e do discurso. Assim, a partir da confluncia desses trscampos ASG, ACG e ADC apresentada uma srie de asseres tericas, que visam
caracterizar o gnero como uma categoria fundante para a explorao dos conceitos de mdia,
suporte e hipergnero.
No Captulo 2, Revisitando os conceitos de mdias, suporte e hipergneroprocedo
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difuso, prope-se a seguinte classificao para os sistemas de mediao da escrita: a)sistema de mediao pr-manuscrito, b) sistema de mediao manuscrito, c) sistema de
mediao impresso, d) sistema de mediao eletrnico-digital. Discute-se o papel que esses
sistemas desempenharam e desempenham nos processos de mudana histrico-social e nos
processos de emergncia de novos gneros e hipergneros. O ponto central do captulo a
conceituao do hipergnero. apresentada uma srie de categorias que do sustentao aoconceito de hipergnero como um agrupamento ordenado de um conjunto de gneros tpicos
que formam um macroenunciado.
O captulo 4 dedicado aplicao da estrutura conceitual proposta no Captulo 3,
com vistas anlise da revista semanal de informao como um hipergnero. Para a anlise
foram selecionados quatro exemplares de revista semanal de informao, sendo um de cadauma das principais revistas brasileiras: CartaCapital, poca, Isto e Veja. Prope-se
incialmente uma classificao para os gneros da revista, segundo o papel que exercem em
sua constituio discursiva (gneros fundantes e gneros coadjuvantes) e segundo o papel
que exercem em sua organizao (gneros organizadores e gneros funcionais). A parte
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CAPTULO 1
CAMPOS TERICOS
INTERDISCIPLINARES
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CAPTULO 1CAMPOS TERICOS INTERDISCIPLINARES | 22
O objeto a ser estudado nesta tese, o hipergnero, perpassa os domnios do texto,
gnero,discurso e mdia. Isso implica a necessidade de se buscar algumas convergncias
terico-conceituais e interdisciplinares. A busca por compreender o funcionamento e as
implicaes sociais de um objeto exige que se lance mo de uma confluncia disciplinar,
para se chegar a uma investigao mais contextualizada, capaz de desvelar suas faces einterfaces. Da o motivo por que busco agregar s bases da Anlise de Gneros alguns
conceitos e teorizaes provenientes da ADC e, em menor quantidade, de outras reas
disciplinares que recobrem a mdia.
Nas sees seguintes, apresento uma breve exposio das bases tericas disciplinares
que do sustentao s postulaes terico-conceituais aqui propostas, buscando um
caminho de convergncia entre Anlise de Gneros e Anlise de Discurso Crtica, j
sinalizado em diversos trabalhos, dentre eles: Meurer (2002), Bhatia (2004, 2007, 2008,
2010), Mota-Roth (2008), Bonini (2010), Heberle (2011).
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CAPTULO 1CAMPOS TERICOS INTERDISCIPLINARES | 23
tanto literrias como religiosas, polticas, profissionais etc. Essa mudana foi desencadeada
por trs grandes movimentos tericos, brevemente apresentados a seguir: Dialogismo
bakhtiniano, Contextualismo e Virada retrica2.
1.1.1 Dialogismo Bakhtiniano
ODialogismo bakhtiniano uma corrente de pensamento fundada por um grupo de
intelectuais, entre eles o linguista, filsofo e crtico literrio russo Mikhail M. Bakhtin3, a
partir dos anos de 1920. As obras O mtodo formal nos estudos literrios
(MEDVEDEV/CRCULO DE BAKHTIN, 2012[1928]) e Marxismo e filosofia da linguagem(BAKHTIN/VOLOCHNOV, 2006[1929])so consideradas as que do incio a essa ampla escola
terica, cujos conceitos bsicos circulam em vrias reas das cincias humanas e sociais,
especialmente na Crtica Literria e na Lingustica.
Em geral, os anos de 1950 so vistos como um marco na renovao dos estudos de
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CAPTULO 1CAMPOS TERICOS INTERDISCIPLINARES | 24
Bakhtin desde o final da dcada de 1920. Roxane Rojo tem chamado a ateno para isso em
diversos textos. Em Gneros do discurso no crculo de Bakhtin - ferramentas para a anlise
transdisciplinar de enunciados em dispositivos e prticas didticas, a autora afirma que o
conceito de gnero discursivo tem todo um processo histrico de constituio na obra do
Crculo e lamentvel que a produo acadmica em LA tome como referncia quase queexclusivamente o texto de 1952-53/1979 [Gneros do discurso] (ROJO, 2007, p. 1765).
Nesse mesmo artigo, a autora retoma um trecho da obraMarxismo e filosofia da linguagem
(BAKHTIN/VOLOCHNOV, 2006[1929]), o qual mostra que conceito de gnero, que viria a ser
teorizado em Gneros do discurso, j estava em elaborao. De acordo com Rojo, na
verdade, a elaborao do conceito parece ter-se iniciado na obra O mtodo de estudo formal
nos estudos literrios (MEDVEDEV/CRCULO DE BAKHTIN, 2012[1928]), em que o Crculo
se confronta com o formalismo. Nessa obra, o Crculo trata dos gneros literrios ou
poticos, mas j comea a estender o conceito a outros campos ou esferas de circulao do
discurso, prenunciando a ideia degnerosdiscursivos (ROJO, 2007, p. 1765-1766).
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teoria contextual do significado.
Alguns princpios tericos de Firth foram bastante importantes para o
desenvolvimento dos estudos da escola de Sidney, fundada por Halliday, seu ex-aluno,
inicialmente identificado como neofirthiano. Entre os mais importantes esto: a) a lngua
um fenmeno em uso; b) a lngua um modo de fazer as coisas no mundo; c) os significadosso construdos contextualmente. A partir da influncia de Firth, Halliday funda a
Lingustica Sistmico-Funcional (LSF), uma ampla corrente terica que investiga tanto
questes sistmico-gramaticais (Gramtica Sistmico-Funcional) como questes discursivo-
textuais (Registro, Gnero, Discurso).
1.1.3 Virada retrica
Embora, s vezes, alguns trabalhos no apresentem uma distino rigorosa entre
Nova Retrica, Crtica Retrica e Sociorretrica, temos razo para dizer que essas correntes
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b) Crtica Retrica
Surgida nos anos de 1960, essa escola propiciou uma nova guinada nos estudos
retricos, ao incorporar em sua teoria a anlise dassituaes retricas. Passou-se a analisar
no apenas o material lingustico e os efeitos argumentativos usados pelo orador, mastambm o contexto e cenrio sociocultural recorrente em que determinadas aes retricas
ocorrem (BITZER, 1968; FISHER,1980;JAMIESON, 1973, 1975; CAMPBELL; JAMIESON, 1978,
1982). Foi no contexto das novas abordagens retricas da escritaque foi introduzida a noo
do gnero como uma ao retrica recorrente em determinadas situaes de discurso
(FREEDMAN; MEDWAY, 1994a).
A identificao do gnero como uma entidade lingustica formal de natureza
exclusivamente literria j tinha sido superada pela Crtica Retrica, nos anos 60 e 70.
Faltava ainda um delineamento mais preciso do que constitui um gnero, j que vigorava
uma profuso de critrios para sua definio 6 (MILLER, 1984, p. 151), e da correlao entre
gnero e ao (efeito) social. Essas tarefas foram desenvolvidas no interior da sociorretrica
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todas as abordagens.
A partir dos anos de 1990, a Anlise de Gneros (AG), j estabelecida em suas bases,
se torna amplamente popular. Passou a cobrir um vasto campo de investigao, interagindo
com uma extensa quantidade de reas de estudo. A partir de ento, a AG tem apresentado
avanos em vrias direes: a) anlise composicional e estrutural de formas genricas, b)interpretao do funcionamento dos gneros em determinados domnios7 e comunidades
discursivas8, em especial os domnios acadmico (SWALES, 1990, 1998; MOTA-ROTH, 1995;
MOTTA-ROTH; HENDGES, 1996), organizacional (DEVITT,1991;YATES;ORLIKOWSKI, 1992;
ORLIKOWSKI; YATES, 1994) e profissional (BHATIA, 1993), c) aplicao da teoria de gneros
no campo pedaggico, d) estudo do funcionamento dos gneros na cibercultura (ARAJO;
BIASI-RODRIGUES, 2005). Contudo, novos desafios se impem; ainda existem reas pouco
exploradas. Isso deve motivar os analistas de gneros a encarar novos enfrentamentos.
1.2 Surgimento da Anlise Sociorretrica de Gneros (ASG)
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rene num mesmo feixe terico questes retricas (situao de discurso, efeitos sociais do
discurso, argumentatividade do discurso, esquemas retricos etc.) e questes de gnero
(estratgias de textualizao recorrentes numa dada comunidade discursiva, padres de
textualizao, aes de linguagem, tipos de enunciados relativamente estabilizados,
propsitos discursivos etc.).Embora outros trabalhos de orientao sociorretrica tenham sido publicados antes
do artigo Genre as social action, de Miller (1984)9, este visto como seminal, em funo da
fecundidade e repercusso de suas formulaes tericas. As teses de Miller (1984), em
especial a concepo do gnero como uma ao social, passaram a ter ressonncia em quase
todos os trabalhos que se alinham a uma abordagem social e retrica de gnero. Na esteira
das teorizaes de Miller, surgiram os dois principais modelos de teoria e anlise
sociorretrica, o de Bazerman (1988, 1994, 2004[2006b]) e o de Swales (1990). A proposta
de Bazerman (1988, 1994, 2006b), denominada de anlise dos sistemas de atividade por
Bonini, Biasi-Rodrigues e Carvalho (2006), enfoca o funcionamento social de um ou um
conjunto de gneros numa determinada esfera de atividade humana. J a abordagem de
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discursiva (SWALES, 1998). Questes discursivas propriamente ditas no ocupam um papel
importante em sua anlise.
No Brasil, o trabalho de Meurer (2002), no comeo dos anos 2000, apresentou
algumas preocupaes tericas importantes sobre a necessidade de se fazer uma anlise de
gneros incorporando questes discursivas (sistema de representao e crenas,estabelecimento de relaes e identidades sociais, construo, manuteno, transformao
dos processos e estruturas sociais etc.). Mesmo no fazendo uma anlise crtica de gneros
propriamente dita, o autor apresentou insights importantes sobre a necessidade de se
combinar a ADC com a AG. Vale a pena retomar aqui as palavras de Meurer (2002, p. 18)
sobre os objetivos de seu texto:
Neste trabalho, procuro contribuir com uma possvel direo para se lidar comessas questes, tendo em mente uma anlise que possa ser aplicada a qualquergnero textual, isto , tipo especfico de texto de qualquer natureza, literrio ouno, oral ou escrito, caracterizado e reconhecido por funo especfica eorganizao retrica mais ou menos tpica, e pelo(s) contexto(s) onde utilizado(grifo meu).
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Na segunda fase, identificada como Organizao do discurso, a dimenso do objeto
analisado estendida, passando de estruturas lxico-gramaticais para unidades e estruturas
do texto. Busca-se mapear o esquema retrico do texto, isto , sua organizao em termos
de elementos hierarquicamente estruturados.
As regularidades do texto so vistas como movimentos retricos (SWALES, 1990;
BHATIA, 1993) que contribuem para a realizao do propsito comunicativo do gnero, no
interior de uma comunidade discursiva. De acordo com Bhatia (2004), nesse momento, a
anlise do discurso escrito, visto como um gnero, se torna um esquema terico-
metodolgico bastante popular e til na investigao do funcionamento dos gneros em
contextos institucionais e disciplinares especficos.
A terceira fase, Contextualizao do discurso, resulta da busca por aumentar o papel
do contexto social na anlise do discurso escrito, promovendo-se uma forte interseco entre
os estudos de gnero e do discurso. Nessa fase, os analistas de gnero/discurso se tornam
cada vez mais sensveis s questes sociais implicadas nas prticas sociodiscursivas
desenvolvidas em contextos profissionais e institucionais.
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Quadro 1Modelo multidimensional de anlise do discurso escrito
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acionistas e outros interessados.
De acordo com Bhatia (2008b), nos ltimos anos, os relatrios corporativos anuais
tm gradualmente mudado de direo retrica, passando de uma base informacional para
uma base promocional. Esse deslocamento sutil, que permite mitigar pontos negativos do
desempenho da companhia, feito atravs de algumas normas comunicativas aceitveis em
gneros corporativos de divulgao.
De fato, ACG e ADC no constituem terrenos tericos separados, com fronteiras
disciplinares descontnuas. As anlises se sobrepem em vrios momentos. O que filia as
anlises aos diferentes arcabouos tericos geralmente o ponto de partida. A ADC parte,
em geral, do macro para o micro: Estruturas Sociais > Prticas Sociais > Discurso > Gnero
> Texto; a ACG parte, na maior parte dos casos, do micro para o macro: Texto > Gnero >
Discurso > Prticas Sociais > Estruturas Sociais (cf. BONINI, 2010, 2011).
O quadro conceitual proposto por Bonini em (2009) e reassumido em (2010) ajuda,
ainda mais, a esclarecer os pontos de continuidade e sobreposies nos estudos de gnero e
do discurso. De acordo com o autor, as anlises podem ser feitas a partir de trs nveis:
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Quadro 2Nveis nas anlises de gneros e de discurso
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histrico e da organizao da sociedade em que o texto se inscreve, para assiminterpretar os atos realizados no discurso e as atividades constitudas nos gnerosemuma dada situao de interao social (MOTTA-ROTH; MARCUZZO, 2010, p.520).
Portanto, analisar criticamente diferentes textos com enfoque nos gneros pressupe
a busca por uma melhor compreenso do modo como o gnero est encaixado nos processosde: a) representao da realidade (produo, reproduo e transformao dos sistemas de
conhecimento e crenas); b) construo das relaes sociais; c) constituio, reforo e
reconstituio das identidades sociais (FAIRCLOUGH, 2001[1992], 2003; MEURER, 2002).
1.4 Asseres tericas convergentes: ASG, ACG e ADC
Nas sees seguintes apresento uma srie de asseres tericas sobre gnero,
extradas de pontos convergentes entre Anlise Sociorretrica de Gneros (ASG), Anlise
Crtica de Gneros (ACG) e Anlise de Discurso Crtica (ADC), que vo constituir a base
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(BITZER, 1968, p. 1).
Antes de aprofundar o conceito de situao retrica, contexto tpico de
funcionamento de um gnero, convm discutir brevemente o que se entende porato ou ao
retrica. Sigo a orientao de Bitzer (1968, p. 3-4), quando diz:
Para esclarecer a retrica como essencialmente relacionada com a situao,devemos reconhecer um ponto de vista que comum, mas fundamental: um atoretrico pragmtico; existe por causa de algo que vai alm de si mesmo. Emltima anlise, o ato retrico funciona para produzir uma ao ou mudana nomundo; ele realiza alguma tarefa. Em suma, a retrica um modo de alterar arealidade, no pela aplicao direta de fora nos objetos, mas pela criao de umdiscurso que muda a realidade atravs da mediao entre pensamento eao (BITZER, 1968, p. 3-4).
Estendendo a concepo de Bitzer (1968) ao campo da AG, pode-se dizer que
retrica refere-se a uma ao de linguagem orientada por um propsito, atravs da qual o
participante (pessoal ou institucional) de um evento sociodiscursivo age no mundo, buscando
o engajamento de um ou mais interactantes (tambm pessoais ou institucionais) na
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Contudo, importante salientar que, segundo os paradigmas da Crtica Retrica e da
Sociorretrica, h uma relao de constituio dialtica entre a situao retrica e as aes
de linguagem que lhe so caractersticas. Isso quer dizer que uma atividade retrica, ao
mesmo tempo em que estabelecida em decorrncia da repetio de uma situao, passa, ela
mesma, a regular o modo de funcionamento da situao. Portanto, a situao retrica tanto
constitui certos gneros tpicos como constituda por eles. Assim, a realizao de um
gnero tanto uma forma de responder s demandas retricas da situao recorrente como
um ato de construir a prpria situao (DEVITT, 1993, p. 578). Parte das aes que o gnero
realiza consiste exatamente em reproduzir a situao a que ele responde (BAWARSHI; REIFF,
2010).
Um ponto bastante importante levantado por Miller (1984) que a recorrncia de
uma situao retrica no constitui um fato material, mas um construto social, um fenmeno
intersubjetivo (MILLER,1984,p. 156). Isso quer dizer que uma situao s existe quando os
interactantes a constroem (DEVITT, 1993) no interior de uma prtica social.
Nesse sentido, cada situao retrica est encaixada numa determinada estrutura
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avaliao institucional, ensino de cincias, ensino de artes, acompanhamento pedaggico,
prtica esportiva etc. Cada uma dessas prticas pode ser desenvolvida em diversos eventos
sociais. A avaliao didtica pode, por exemplo, ser desenvolvida numa aula, numa
apresentao artstica, numafeira escolaretc.
Podemos dizer, portanto, que uma situao retrica, quando est em atividade,
constitui parte de uma prtica social, na qual so realizados alguns gneros tpicos. Assim a
situao retrica pode ser vista como um evento social (FAIRCLOUGH, 2003, 2006), dentro
do qual as aes discursivas so desenvolvidas por meio dos textos/gneros.
Podemos ainda estabelecer uma comparao entre situao retrica e tipo de
atividade, a partir da proposta de Fairclough (2001[1992]). Segundo o autor,
um tipo de atividade pode ser especificado em termos de uma sequnciaestruturada de aes das quais ele [o gnero] composto, e em termos dosparticipantes envolvidos na atividade isto , o conjunto de posies de sujeitoque so socialmente constitudas e reconhecidas em conexo com o tipo deatividade (FAIRCLOUGH, 2001[1992], p. 162).
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vez mais raros.
Em Genre as social action, Miller (1984), a um s tempo, tanto afirma o gnero como
uma ao social quanto nega a noo de gnero como uma entidade estritamente formal. Nas
palavras da autora, o gnero um conjunto
complexo de traos formais e acionais que cria um efeito particular numa dadasituao social. Nesse sentido, o gnero se torna algo mais que uma entidadeformal; ele se torna pragmtico, totalmente retrico, um ponto de conexo entreuma inteno e um efeito, um aspecto da ao social (MILLER, 1984, p. 153).
Seguindo essa mesma linha, Bazerman (2006a) afirma que
Os gneros so no somente formas textuais, mas tambm formas de vida e deao (BAZERMAN, 2006a, p. 10). Gnero, ento, no simplesmente uma categorialingustica definida pelo arranjo estruturado de traos textuais. Gnero umacategoria [...] que usamos para reconhecer e construir aes tipificadas dentro desituaes tipificadas. uma maneira de criar ordem num mundo simblico semprefluido (BAZERMAN, 2006a, p. 60).
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Fairclough (2003), partindo de uma base sistmico-funcional, assume que os textos
so multifuncionais, ou seja, incorporam simultaneamente as metafunes ideacional,
interpessoal e textual (HALLIDAY; MATTHIESSEN, 1994). Assim, os textos simultaneamente
a) representam aspectos do mundo (material, social e mental), b) estabelecem relaes
sociais no curso dos eventos sociais, realizando as atitudes, valores e desejos dos
participantes, e c) conectam, de forma coesa e coerente, as partes do texto num todo,
vinculando-o ao seu contexto situacional.
Contudo, Fairclough (2003), mesmo partindo da perspectiva sistmico-funcional,
prefere falar em tipologias do significado textual e no em funes textuais. Assim, o texto
realiza trs grandes categorias de significados: representao, ao e identificao. Essa
proposta permite ao autor conectar sua concepo tripartite do discurso (discurso, gnero e
estilo) com uma concepo tripartite das aes semiticas e/ou semnticas do texto
(representao, ao e identificao).
Considerando especificamente o gnero, Fairclough (2003) afirma que
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para alcanarobjetivos culturalmente motivados (EGGINS, 1994, p. 25 apud VIAN JR.; LIMA-
LOPES, 2005, p. 31). S se pode realizar algo no mundo atravs da linguagem porque h
algum tipo de conhecimento culturalmente partilhado, a partir do qual os sujeitos sociais
reconhecem determinadas formas de organizao e uso da linguagem como efetivos e
funcionais em certas situaes sociais (BERKENKOTTER; HUCKIN, 1995; EGGINS, 2004;
MILLER, 1984). Portanto, pode-se dizer que os propsitos sociodiscursivos incorporados por
um gnero so construdos a partir desse reconhecimento sociocultural.
De forma simplificada, podemos propor a seguinte trajetria para o surgimento de
certos propsitos sociodiscursivos associados a um gnero13: agentes sociais usam uma
determinada configurao de linguagem com sucesso numa dada situao social. A situao
se repete e a mesma configurao de linguagem usada novamente, repetindo-se o xito
tambm. Como isso, a ao alcanada passa a ser vinculada ao modo como a linguagem foi
usada, constituindo-se umfim ou um telos, nos termos de Martin (1992). Cria-se, ento, um
conhecimento tipificado, cujo teor diz aos agentes sociais que, para se chegar consumao
daquela ao especfica, preciso utilizar a linguagem de um modo especfico, que j se
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A principal caracterstica que serve de critrio para se tomar uma coleo deeventos comunicativos como pertencentes a um gnero a existncia de umconjunto de propsitos comunicativos compartilhados pelos exemplares do gnero(SWALES, 1990, p. 46).
O gnero um evento comunicativo reconhecvel, caracterizado por um conjuntode propsito(s) comunicativo(s) (BHATIA, 1993, p. 13).
Cada gnero exemplifica a realizao bem sucedida de um determinado propsitocomunicativo, utilizando o conhecimento convencionado de recursos lingusticose discursivos (BHATIA, 1993, p. 16).
Ns normalmente consideramos o texto, de forma geral, como tendo algumasaes dominantes que definem sua inteno e propsito (BAZERMAN, 2006b, p.35).
Cada gnero textual tem propsito bastante claro que o determina e lhe d uma
esfera de circulao (MARCUSCHI, 2008, p. 150).
O estabelecimento do propsito comunicativo como um critrio de identificao do
gnero representou, num primeiro momento da AG, um passo em direo a uma abordagem
social. Swales (1990) argumenta que, ao colocar o propsito comunicativo compartilhado
pelos exemplares de um gnero como um critrio proeminente, seguiu a mesma proposta de
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No cenrio da ADC, se reconhece o propsito sociodiscursivo como um elemento
importante na constituio do gnero. Fairclough (2003, p. 70-71) afirma que comum o
gnero ser definido em termos de propsitos e atividades. Estes podem ser
hierarquicamente ordenados e relativamente explcitos ou implcitos.
Mesmo reconhecendo que o gnero realiza certos propsitos e atividades, preciso
considerar que
h problemas em se privilegiar muito o propsito como um critrio de definiodo gnero. Enquanto muitos gneros tm realmente propsitos definidos,claramente vinculados a propsitos sociais amplamente reconhecidos, isso no seaplica a todos os gneros (FAIRCLOUGH, 2003, p. 71).
Portanto, compartilho da concluso de Fairclough (2003, p. 72): no devemos deixar
de ver o propsito como relevante para o gnero, mas evitar conceb-lo como o centro de
nossa definio de gnero.
1.4.4 O gnero constitui um evento sociodiscursivo inscrito nas prticas de uma
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(b) A comunidade discursiva tem mecanismos para intercomunicao entre os membros.Os mecanismos de participao podem ser diversos: reunies, telecomunicaes,
correspondncia, boletins e assim por diante.
(c) Em consequncia de (a) e (b), a comunidade discursiva usa seus mecanismos departicipao para fornecer informaes efeedback, e assim criar oportunidades para que os
membros se envolvam nas tarefas da comunidade.
(d) A comunidade discursiva produz e utiliza um conjunto de gneros prprios paraalcanar seus objetivos. Uma comunidade est assentada em expectativas discursivas
desenvolvidas e em contnuo desenvolvimento. Essas expectativas podem determinar o
tpico, a forma e a funo que o discurso assume, e os papis que os textos desempenham
no funcionamento da comunidade. Assim, tais expectativas criam gneros especficos para
a articulao das operaes a desenvolvidas.
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conflitos e instabilidades, tanto em relao identidade dos participantes como em relao
natureza das prticas discursivas14.
Swales fez algumas revises no conceito de comunidade discursiva em trabalhos
posteriores (SWALES, 1992, 1993, 1998), discutindo algumas limitaes da definio de
Genre analysis (1990).
Em Genre and engagement, Swales (1993) discute o fato de o conceito original no
incorporar a ideia de avano e mudana discursiva, realizados a partir da incluso de novos
tpicos, novos gneros e novos espaos de explorao, caractersticas comuns nas
comunidades (HEMAIS; BIASI-RODRIGUES, 2005).
Em Other floors, other voices, Swales (1998) aponta que o conceito de Genre
analysis no possui mecanismos suficientes para delimitar a extenso de uma comunidade.
Por exemplo, h casos em que duas ou mais comunidades discursivas se sobrepem, ficando
difcil identificar de qual comunidade parte o discurso. Veja-se o caso dos manuais e obras
de referncia de uma determinada disciplina, como o jornalismo. Obras como Gneros
jornalsticos no Brasil(MARQUESDE MELO; ASSIS, 2010), Sotaques daqum e dalm mar
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estruturas de concreto armado, teorias da personalidade, nmeros complexos,
gramaticalizao numa nica comunidade discursiva (a acadmica), certamente cada
disciplina acadmica tem objetos de discurso particulares e formas especficas de ordenar
suas prticas discursivas, o que faz com que jornalismo, engenharia civil, psicologia,
matemtica e lingustica constituam comunidades discursivas distintas umas das outras,
dentro de uma macrocomunidade, a acadmica.
Ainda em Other floors, other voices, Swales (1998) destaca que o conceito original
de comunidade discursiva no dava conta de comunidades em fase embrionria e em fase de
transio, j que no tm gneros estveis e caractersticos (HEMAIS; BIASI-RODRIGUES,
2005).
Por fim, Swales (1998) prope o conceito de comunidade discursiva de lugarpara
designar um grupo de pessoas que regularmente trabalham juntas, partilhando uma noo
comum, embora sempre em mudana, dos objetivos que norteiam a atividade do grupo.
Essa comunidade desenvolve uma gama de gneros para orientar e monitorar os
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1.4.5 O gnero organizado em un idades e movimentos retricoshierrquicos.
O desenvolvimento dos estudos de gnero no interior da sociorretrica permitiu que
se pensasse no gnero em termos de um conjunto de aes retricas ordenadas. Essas aes
so determinadas por um grupo de fatores sociorretricos integrados (prtica social,
comunidade discursiva, propsitos sociodiscursivos, agentes sociais envolvidos na
produo, mediao e interpretao do gnero etc.) que afetam tanto o texto como o contexto.
Isso implica que a estrutura retrica de um gnero no resulta de um conjunto de escolhas
intencionais de um sujeito plenamente consciente que busca a adeso de seu(s)
interlocutor(es) a um determinado projeto enunciativo (BAKHTIN, 2010[1952-53]).
Certamente, h participao cognitiva do sujeito na instanciao do gnero e na modelao
dos recursos retricos, mas dentro de certos limites sociais e discursivos.
De acordo com a ASG, em especial a vertente de Swales, o gnero formado por um
conjunto de movimentos retricos, que lhe confere uma estruturao tpica. Assim, a
sequenciao e a progresso retrica do gnero so feitas por meio de unidades textuais que
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Quadro 3Movimentos retricos da introduo de artigos de pesquisaMovimento 1 Estabelecer o campo de pesquisa
Movimento 2 Sumarizar pesquisas prvias
Movimento 3 Preparar a presente pesquisa
Movimento 4 Introduzir a presentes pesquisa
Fonte: Swales (1984, p. 80)
Em Genre Analysis, Swales (1990) refina o modelo; reduz para trs a quantidade de
movimentos retricos e, em compensao, insere uma srie de subunidades (passos) dentro
de cada movimento. O quadro resultante o seguinte:
Quadro 4Modelo CARS para introduo de artigos de pesquisaMovimento 1 Estabelecer o territrio
Passo 1 Asseverar a importncia da pesquisae/ou
Passo 2 Fazer generalizao(es) quanto ao tpicoe/ou
Passo 3 Revisar a literatura (pesquisas anteriores)Diminuindo esforo
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Neste trabalho, usarei ambos os termos, cada um cobrindo um conceito diferente. O
termo unidade retrica designar uma poro textualformada por parte de um texto, por
um texto completo ou por um conjunto de textosque tem certa integrao formal, temtica
e retrica. J o termo movimento retrico ser usado para designar os elementos que, juntos,
formam a organizao retrica e os movimentos de sentido presentes no gnero. De certa
forma, podemos dizer que o termo unidade se relaciona mais com o plano estrutural e
organizacional do gnero, enquanto o termo movimento se relaciona mais com o plano
funcional.
No campo da ACG, a noo de estruturao retrica perdeu espao, uma vez que o
foco da anlise tem se voltado mais para os elementos do contexto do que para a anlise da
estrutura do texto. Nos estudos de Bhatia (2010) e Bonini (2010), por exemplo, no h uma
preocupao com a anlise da organizao retrica dos gneros estudados. natural que, em
estudos crticos, haja menos nfase na estrutura retrica do gnero. Contudo, analisar o modo
como se organiza retoricamente um gnero pode ser til para mostrar os efeitos de certas
determinaes discursivas.
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levando pouco em conta a rede de relaes genricas que se estabelece em seu entorno.
Recortar um dado gnero e trat-lo como algo inteiro em si mesmo tm sido
procedimentos metodolgicos bastante comuns na ASG. Parte-se do pressuposto, embora
no declarado, de que o gnero pode se estruturar e funcionar a partir de um conjunto de
propriedades internas, autorreferentes e no-partilhadas. Estudos como o de Swales (1990)
e os que foram mencionados logo acima esto assentados numa base terica que, se no
defendem a pureza do gnero, pelo menos deixam de considerar a cadeia de interconexo
necessria que um gnero estabelece com outros, tanto em relao a aspectos estruturais
como funcionais. Faz-se a um estudo simplificado e idealizado do gnero (BHATIA, 2004,
p. xiv).
H uma grande lacuna entre o estudo de um gnero individual, cuja anlise se
concentra em sua integridade e pureza, e o funcionamento efetivo desse gnero em seu
mundo sociodiscursivo real (BHATIA, 2004). A ele aparece como uma atividade discursiva
inerentemente complexa, dinmica, verstil e imprevisvel (BHATIA, 2004, p. xiv),
encaixada num amplo sistema sociodiscursivo, formando junto com outros gneros um
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so essenciais para o trabalho e para a identificao da comunidade. Gneros como
memorando administrativo, cartas comerciais (para clientes, para autoridades fiscais etc.),
protesto fiscal etc. constituem e governam a comunidade, definindo e refletindo sua
epistemologia e seus valores.
Devitt (1991), ao analisar as relaes intertextuais que um conjunto de gneros
realiza numa determinada comunidade, abriu caminho para o estudo de outros tipos de
relao que os gneros estabelecem entre si.
As prticas sociodiscursivas realizam uma rede complexa de relaes, que desafia a
teoria e a anlise de gneros em vrias direes. Os gneros, enquanto atuam conjuntamente,
no criam apenas uma cadeia intertextual. H outros tipos de relaes atuando enquanto a
trama intertextual tecida.
Desde o trabalho de Devitt (1991), tem se tornado frequente o interesse por se
compreender as relaes que os textos estabelecem entre si no interior de um sistema e de
uma comunidade discursiva, bem como no transcurso de uma rede de prticas e eventos
sociais (FAIRCLOUGH, 2001[1992], 2003; BHATIA, 2004; BONINI, 2011).
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constatar o processo de ressonncia de textos anteriores num determinado artigo de pesquisa.
preciso identificar as convenes genricas que regulam o processo de introduo e
acondicionamento de outros gneros, inteiros ou recortados, dentro do artigo de pesquisa,
processo que permite a construo de um fluxo de intertextualidade genrica.
Ressalto que o termo intertextualidade genrica se aplica aqui exclusivamente
ligao que um texto estabelece com textos anteriores, em termos do que enunciado,
ficando de fora a troca e fuso de propriedades genricas. A ressonncia das propriedades de
um gnero em outro (processos de combinao, mistura e/ou fuso de gnero) ser aqui
estudada sob o rtulo de intergenericidade ou hibridizao de gneros.
Swales (2004) utiliza o termo rede de gneros, o qual parece ter sido inspirado no
velho conceito de intertextualidade (ARAJO, J. C., 2006, p. 59), para se referir a um
fenmeno parecido com o descrito acima. Segundo Swales (2004), uma rede de gneros
instaurada quando, a partir de um gnero, se criam diversos outros. Por exemplo, uma
palestra pode ser transformada num ensaio ou artigo de pesquisa; uma tese pode assumir a
forma de um ou mais artigos de pesquisa; uma palestra, ensaio, artigo de pesquisa ou parte
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A expanso das mdias criou condies favorveis interdiscursividade (FOUCAULT,
2008; FAIRCLOUGH, 2001[1992], 2003) e ao contato entre gneros. cada vez mais comum
o intercmbio discursivo e genrico entre comunidades e domnios discursivos distantes. As
mdias oferecem inmeros recursos que possibilitam a transferncia de certos aspectos,
recursos e aes discursivos de uma dada prtica social para o contexto de outra.
Essa troca de recursos e contextos, denominada por Chouliaraki e Fairclough (1999)
como recontextualizao, constitui um fenmeno tpico da modernidade tardia (GIDDENS,
1991, 2002). De acordo com Fairclough (2003), o processo de contextualizao visto como
a apropriao, por parte de uma prtica social, de elementos que pertencem a outra, fazendo
com que a prtica social incorporadora atue num contexto similar ao da prtica social
incorporada.
Como todo gnero nasce de uma situao de contato e inter-relao, natural que os
gneros estabeleam entre si um intenso fluxo de troca de propriedades estruturais e
discursivas. Esse fenmeno ser aqui chamado de intergenericidade. Trata-se da
transferncia de propriedades lxico-gramaticais, sociorretricas e discursivas de um gnero
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(1997 apud MARCUSCHI, 2008, p. 165): o gnero anncio publicitrio assume a forma de
uma bula de remdio:
Quadro 5Anncio publicitrio na forma de bula de remdioViva saudvel com os livros
DIOGENES
Os livros Diogenes acham-se internacionalmente introduzidos na biblioterapia.
PosologiaAs reas de aplicao so muitas, principalmente resfriados, corizas, dores de garganta erouquido, mas tambm nervosismo, irritaes em geral e dificuldade de concentrao. Emgeral, os livros Diogenes atuam no processo de cura de quase todas as doenas para as quaisse prescreve descanso. Sucessos especiais foram registrados em casos de convalescena.
PropriedadesO efeito se faz notar pouco tempo depois aps iniciada a leitura e tem grande durabilidade.Livros Diogenes aliviam rapidamente a dor, estimulam a circulao sangunea e o estadogeral melhora.Precaues / riscosEm geral, os livros Digenes so bem tolerados. Para miopia, aconselham-se meios de auxlio leitura. So conhecidos casos isolados nos quais o uso prolongado produziu dependncia.Dosagem
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semntico genrico, passando a ver o gnero como um anncio publicitrio de uma editora.
Esse deslocamento resulta, em parte, da natureza do objeto de discurso referenciado, o livro
(ou editor de livros Diogenes), que tem representaes sociodiscursivas amplamente
distintas de um medicamento, por pertencer a um domnio discursivo diferente.
importante salientar que ambos os objetos (medicamento e livro) podem ser
referenciados no discurso publicitrio. Contudo, quando se realiza um evento discursivo
promocional de cada um desses objetos, sem metfora genrica, h uma preocupao em
relacionar o objeto ao domnio discursivo a que pertence. Assim, quando se tem um anncio
publicitrio de um medicamento de se esperar que haja referncia aos efeitos teraputicos
e ao contexto de fabricao do produto, mobilizando-se uma srie de referncias (diretas e
indiretas) ao discurso farmacolgico. Por outro lado, quando se faz uma campanha
promocional de um livro (ou editora), mobilizam-se objetos de discurso correferentes
prprios do discurso editorial. H no anncio Viva saudvel com os livros Diogenes
referncia a uma srie de objetos de discurso da esfera editorial, tais como: leitura,
durabilidade (do livro), qualidade do papel, qualidade da impresso etc.
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discursivos, para com isso aumentar seu efeito retrico e persuasivo.
Em geral, quando o anncio apresenta uma estruturao retrica muito conservadora,
o leitor se mantm distante da interlocuo, por no encontrar, logo no primeiro contato com
o texto, razes suficientes para se engajar numa troca de sentidos. Como um gnero
essencialmente dinmico, a falta de inovao e hibridizao pode acabar inviabilizando a
realizao do evento discursivo.
b) Intergenericidade por hibridizao
A intergenericidade por hibridizao ocorre quando aspectos (estruturais e/ou
discursivos) de um ou mais gneros so assimilados por um gnero j existente, ou se
mesclam (a partir de novas combinaes discursivas e genricas) para formar um novo
gnero. Fairclough (2003) denomina esse fenmeno de hibridizao e d como exemplo o
texto Cidade dos grandes eventosfloresce16, uma espcie de reportagem promocional
sobre a cidade de Bkscsaba, na Hungria, publicada no jornalBudapest Sun.
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arquitetnico ou histrico, localizao geogrfica, a vida cultural etc.)(FAIRCLOUGH, 2003, p. 34-35).
Chouliaraki e Fairclough (1999) consideram que gneros e discursos podem se
desencaixar de certas ordens de discurso e circular como elementos livres, passveis de ser
agrupados e articulados em novas configuraes, manifestando processos de mudana social
no discurso. O caso do texto Cidade dos grandes eventosfloresce, ilustrado acima, mostra
uma tendncia de deslocamento de alguns gneros jornalsticos para o campo publicitrio e
para o campo corporativo, fazendo nascer uma ordem de discurso hbrida, que rompe as
fronteiras entre discurso jornalstico, discurso publicitrio e discurso corporativo (BHATIA,
2007; FAIRCLOUGH, 2001[1992], 2003).
Veja-se ainda, a esse respeito, o caso do gneropress release. Esse gnero enseja um
evento discursivo que tem por objetivo divulgar uma instituio; construdo a partir da
combinao de certos recursos estruturais e discursivos do gnero reportagem com algumas
propriedades retrico-discursivas do anncio publicitrio. Usam-se os aspectos retrico-
estruturais da reportagem para incorporar ao texto certas marcas do discurso jornalstico
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1.4.6.3 Cadeia de gneros
O conceito de cadeia de gneros foi proposto inicialmente em Fairclough
(2001[1992]), sob o nome de cadeias intertextuais, definidas como sries de tipos de textos
que so transformacionalmente relacionadas umas s outras, no sentido de que cada membro
das sries transformado em um outro ou mais, de forma regular e previsvel
(FAIRCLOUGH, 2001[1992], p. 166). Nessa primeira proposta, Fairclough (2001[1992]) no
distingue intertextualidade e cadeia de gneros. A interconexo que se d entre os gneros
dentro de uma rede de discurso vista como parte da intertextualidade, no como um
processo distinto. Em Analysing discourse, Fairclough (2003) abandona o termo cadeia
intertextuale passa a utilizar o termo cadeia de gneros, estabelecendo, assim, uma ciso
conceitual ntida entre cadeia de gneros e intertextualidade.
Uma cadeia de gneros formada por um conjunto de gneros diferentes, que
ocorrem regularmente em sequncia, de modo que um, ou mais gneros, provoca a
emergncia de outro(s), formando assim uma rede de textos que se ligam e se influenciam
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espao e tempo, articulando eventos sociais em diferentes prticas sociais, em diferentes
pases e em diferentes tempos. Fairclough (2003) defende que as cadeias de gneros so
fundamentais para realizao de ao distncia. A transcendncia do tempo e espao
propiciada pela circulao mediada de gneros e outras formas simblicas (FAIRCLOUGH,
2003, p. 31; GIDDENS, 1991, 2002, 2009; HARVEY, 2000; THOMPSON, 2011) tem aumentado
a capacidade de agir e interagir em escala global, tornando a ao distncia uma
caracterstica marcante da globalizao19 contempornea e, consequentemente, um meio
facilitador de exerccio do poder (cf. FAIRCLOUGH, 2003; THOMPSON, 2011).
Swales (2004) tambm desenvolve uma noo de cadeia de gneros. Sua proposta
apresenta certa semelhana com o conceito de Fairclough (2001[1992], 2003). Em ambas as
bases tericas, uma cadeia de gneros designa uma sucesso de gneros que se interconectam
para a realizao de uma dada ao. Contudo, como o conceito de Fairclough (2001[1992],
2003) est situado numa teoria social do discurso, natural que Fairclough esteja muito mais
preocupado com o processo interdiscursivo que se instala quando uma srie de gneros se
junta numa cadeia sucessiva do que com a sequncia de gneros em si. Fairclough
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acional instaurado em torno de um grupo de gneros.
Bazerman (1994) argumenta que, embora a categoria conjunto de gneros seja
importante para mostrar o papel que certo grupo de gnero despenha na formao,
ordenamento e identificao de uma comunidade discursiva, o conceito no permite alcanar
o processo interacional completo, deixando uma parte da interlocuo de fora. Por exemplo,
na anlise de Devitt (1991) sobre os gneros que fazem parte da atividade do contador fiscal,
o conjunto de gnero representa [...] apenas o trabalho de um lado de uma interao que
envolve mltiplas pessoas (BAZERMAN, 1994, p. 98), entre os quais o contador, o cliente e
o governo. Concentrar-se no conjunto de gnero permite abordar apenas o lado do agente
discursivo que pertence comunidade, deixando de fora os gneros e as manifestaes de
interactantes que no fazem parte dessa comunidade.
Para analisar toda extenso da interao discursiva desenvolvida em torno de um
conjunto de gneros preciso estender o conceito a uma categoria mais ampla. De acordo
com Bazerman (1994), o sistema de gneros seria um conjunto de gneros que permite a
participao de todos os lados: contador, cliente e governo. Nesse caso, o conjunto de
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O conceito de sistema de gneros se assemelha bastante ao conceito de cadeia de
gneros proposto por Swales (2004). Para Bazerman (2006b), o sistema de gnero tambm
visto, a exemplo do que prope Swales (2004), como uma sequncia regular de gneros,
dentro de um fluxo comunicativo tpico de um grupo de pessoas ( BAZERMAN, 2006b, p
32).
A noo desistema de gneros como uma srie de gneros encadeados que d forma
a um evento social, do qual participam agentes sociais diversos, pode ser especialmente
importante porque lana luz sobre o modo como as pessoas usam uma sequncia de aes
comunicativas para coordenar suas atividades no tempo e no espao (YATES; ORLIKOWSKI,
2002, p. 16).
O uso do conceito desistema de atividadespermite expandir ainda mais o contexto
de atuao de um conjunto de gneros. De acordo com Bazerman (2006b, p. 33), o sistema
de atividades corresponde a umframe20, isto , um conjunto de tipificaes, que organiza o
trabalho, a ateno e a realizao de uma ou mais pessoas num contexto (local e social) de
atuao humana. osistema de atividades que fornece aos agentes sociais pistas sobre que
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bastante til na teoria de gneros porque pode servir a duas funes: a) comporta um alto
grau de versatilidade na identificao e descrio do gnero, permitindo que ele seja visto
em diferentes nveis de generalizao e tornando possvel apontar as principais relaes
estabelecidas entre supergneros (ou macrogneros22), gneros e subgnero; e b) torna
possvel relacionar essas subcategorias (os gneros e subgneros) s caractersticas do
contexto de uso (BHATIA, 2004, p. 57).
O termo colnia de gneros admite duas conceituaes. A primeira diz respeito a um
agrupamento de gneros intrinsecamente relacionados que, embora partilhem, em grande
parte, propsitos comunicativos comuns, podem ser diferenciados em outros aspectos como:
filiao disciplinar e profissional, contexto de uso e circulao, tipos de relao que se
estabelecem entre os participantes, restries determinadas pela audincia ou contexto de
recepo etc. (BHATIA, 2004). A segunda conceituao se refere colonizao de gneros.
Inspirado no conceito de comodificao de Fairclough (2001[1992]), Bhatia (2004, p. 58)
define colonizao como um processo que envolve a invaso da integridade de um gnero
por outro gnero ou outra conveno genrica, levando frequentemente criao de uma
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(2000) argumentam que os gneros so dinmicos, orgnicos e abertos, podendo ser
conectados e utilizados de diferentes maneiras (SPINUZZI, 2004, p. 5). Por isso, uma
perspectiva ecolgica, que representa o dinamismo e a interconectividade dos gneros,
fundamental para se analisar a variao nas realizaes de um determinado gnero
(SPINUZZI; ZACHRY, 2000, p. 172-173) ou de um grupo de gneros.
De acordo com a proposta terica de Spinuzzi e Zachry (2000), trs propriedades
fundamentais governam o funcionamento dos gneros numa ecologia: contingncia,
descentralizao e estabilidade.
a) Contingncia
A contingncia se refere ao modo como as pessoas coordenam os gneros de forma
complexa, oportuna e, por vezes, arriscada, quando intencionam realizar certas aes e/ou
projetos sociais (SPINUZZI; ZACHRY, 2000).
A partir do conceito de contingncia de Spinuzzi e Zachry (2000), assumo que as
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b) Descentralizao
De acordo com Spinuzzi e Zachry (2000, p. 174), a ecologia de gneros tambm
governada por uma descentralizao. Os gneros nunca so utilizados a partir de um nico
modelo e de um nico artefato (mdias e/ou instrumentos tcnicos). Diversas mediaes e
instrumentos podem ser mobilizados na utilizao de um gnero ou de um grupo de gneros,
s vezes at de forma inovadora e imprevista.
H certamente um protocolo de uso do gnero recorrente na comunidade, bem como
uma mdia ou algum artefato tcnico usualmente associado a determinado gnero ou
ecologia de gneros. Contudo, no se pode dizer que esse gnero ou ecologia ser sempre
usado de tal modo e em conexo com tal mdia ou artefato.
O conceito de descentralizao serve para mostrar que os padres de usabilidade de
um gnero so relativamente abertos. Apesar de cada gnero estar comumente associado a
determinados protocolos de usabilidade e artefatos (mdia, suporte e outros dispositivos
tecnolgicos), os agentes sociais podem experimentar certos usos e conexes pouco
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estabilidade se refere tendncia de os usurios repetirem certas interconexes genricas j
convencionadas na comunidade e em certa situao sociorretrica.
Uma ecologia de gneros tende a se tornar mais regularizada ao longo do tempo.
Spinuzzi (2002) diz que uma conexo ad hoc entre certos gneros, como por exemplo, o uso
improvisado de uma nota para fazer anotao a respeito de umafatura problemtica, pode,
ao longo do tempo, se tornar uma ligao regular. Assim, as ecologias de gneros podem
formar constelaes durveis, isto , agrupamentos e conexes genricas relativamente
estveis em vez de absolutamente imutveis, dinmicas e no estticas, flexveis e no
rgidas (SPINUZZI; ZACHRY, 2000, p. 175).
1.4.6.8 Consideraes sobre as limitaes que cercam uma discusso sobre agrupamento
genrico
Busquei nestes subitens que compem a seo 1.4.6 traar um panorama dos
principais termos e conceitos usados para teorizar o modo como os gneros se agrupam, sem
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1.5 Resumo do captulo
Este captulo teve como objetivo apresentar os conceitos, oriundos da Anlise de
Gneros (AG) e Anlise de Discurso Crtica (ADC), que do sustentao a esta tese. Gnero
e discurso constituem os objetos tericos fundantes deste trabalho, a partir dos quais ser
possvel (re)elaborar, sistematizar e analisar a noo de hipergnero. Essas duas categorias
tericas,gnero e discurso, esto na base da teorizao e anlise das relaes genricas que
se estabelecem quando os gneros so agrupados numa certa mdia, formando um
macroenunciado. Da o motivo por que busquei construir uma zona de convergncia terico-
analtica entre AG e ADC, apontando uma srie de asseres tericas que se localizam num
ponto de interseco entregnero e discurso.
A AG uma disciplina recente. Fortaleceu-se a partir do fim dos anos de 1980.
Contudo, suas razes esto associadas mudana que Bakhtin imprimiu nos estudos de
gneros, no incio dos anos de 1950, com a publicao do ensaio pioneiro Os gneros do
discurso. Junto com o surgimento doDialogismo Bakhitiano, houve tambm uma renovao
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A partir da convergncia entre ADC e AG, apresentei as seguintes asseres tericas:
a) O gnero funciona numa situao retrica recorrente.
b) O gnero uma ao social.
c) O gnero realiza determinado(s) propsito(s) sociodiscursivo(s).
d) O gnero constitui um evento sociodiscursivo inscrito nas prticas de uma comunidade
discursiva.
e) O gnero organizado em unidades e movimentos retricos hierrquicos.
f) Os gneros funcionam em conjunto, formando um complexo sistema de relaes.
H, neste captulo, discusso um pouco mais ampla sobre a ltima assero da srie,
que trata do funcionamento agrupado dos gneros. Em World of written discourse, Bhatia
(2004) chama a ateno para o aspecto essencialmente dinmico e correlativo dos gneros.
Na esfera em que atuam, isto , em seu mundo sociodiscursivo real, os gneros existem e
funcionam de modo essencialmente complexo, dinmico, verstil e imprevisvel (BHATIA,
2004, p. xiv). Da a necessidade de se levar em conta as interconexes que os gneros
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CAPTULO 2
REVISITANDO OS CONCEITOS
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As correlaes entregnero-mdia, gnero-suporte e gnero-hipergnero, que sero
objeto de teorizao e estudo nesta pesquisa, ainda so pouco exploradas no campo da
Anlise de Gneros, Midiologia e Comunicao Social. Por exemplo, uma breve reviso da
literatura clssica dessas disciplinas nos mostra que o pargnero-mdia, cujos conceitos,
considerados individualmente, j esto razoavelmente desenvolvidos, ainda pouco
explorado.
No campo da Midiologia e Comunicao social, a abordagem do gnero e mdia
como categorias correlacionadas no aparece nos estudos de Debray (1993, 1998, 2000,
2004), Bougnoux (1994), Silverstone (2005), Beltro (1976, 1980), Marques de Melo (1992,
2003, 2006), Marques de Melo e Assis (2010), Martnez Albertos (1993).
No campo da AG, os estudos de Swales (1990, 1998, 2002, 2004), Bazerman (1994,
2005), Bhatia (1993, 1997a, 1997b, 2002) no apresentam propostas tericas que articulem
a interface gnero-mdia. Bhatia (2004) faz referncia mdia como um componente do
complexo sistema de funcionamento do gnero, mas sem avanar para uma teorizao mais
aprofundada.
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funcionamento, mdia, suporte, hipergnero e gnero se sobrepem em vrios pontos
(continuidade, sobreposio). Assim, me parece ser mais apropriado pensar numa disposio
contnua e no discreta, conforme mostra a Figura 1:
Figura 1Disposio em contnuo: mdia, suporte, hipergnero e gnero.
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levadas em conta apenas subsidiariamente. Como afirma Charaudeau (2009, p. 22), toda
abordagem disciplinar, por definio, parcial.
Figura 2Correlao entre gnero, hipergnero, mdia e suporte
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2.1.2 Conceito de mdia na midiologia de Debray
Como o conceito de mdia de Debray (1993, 1998, 2004) no construdo no interior
das teorias da comunicao, embora parea primeira vista, para ele, a mdia no deve ser
estudada como um meio de comunicao. Do contrrio, corre-se o risco de afirmar que um
objeto to complexo, sempre presente na histria cultural do homem e associado a diversas
revolues, seja equivalente aos meios de comunicao de massa: imprensa, cinema, rdio,
televiso, internet.
Para tentar dar conta de toda a complexidade da mdia, Debray coloca no mercado
das cincias um novo produto: a midiologia, que tem por objeto de investigao o
fenmeno da transmisso. Os captulos introdutrios do Curso de midiologia geral(1993)
e deIntroduo mediologia (2004)25 so dedicados construo do objeto da midiologia,
distanciando-a da Comunicao Social.
Debray (2004, p. 12) defende que preciso ultrapassar o horizonte do comunicar
para chegar ao continente do transmitir que no visvel ao olho nu e que, como todos os
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recorrente) entre isto e aquilo (definio de uma lei objectiva) expor-se- acusao de
determinismo (primrio) e de reducionismo (simplista). A transmisso simblica constri
uma relao de causalidade sistmica negativa, assim formulada: A no produz B, mas se
no h A, no existe B (BOUGNOUX apud DEBRAY, 2004, p. 77). Depreende-se dessa
frmula que,
O elo causal entre uma tcnica e uma cultura no nem automtico nem unilateral.No se pode ter certezas sobre os tipos de comportamento que a escrita linear vaidesenvolver ou no numa cultura oral. Em contrapartida, h a certeza de que umacultura que ignora este processo de memorizao no ter este ou aquelecomportamento (DEBRAY, 2004, p. 77).
O deslocamento de um objeto que est fixado num espao-tempo, a comunicao,
para um objeto que perpassa vrios espaos-tempos, a transmisso, permite traar uma
histria dos impactos da mdia no curso da histria humana. A teoria da transmisso fornece
condies para se proceder a uma arqueologia da mdia (ZIELINSKI, 2006) e mostrar as
correlaes histricas, culturais, sociais, polticas e tcnicas imbricadas em cada modelo
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mediao (mdia), ancoragem (suporte) e agrupamento ordenado (hipergnero) de gneros28.
A transio de um sistema (de mediao, ancoragem e agrupamento) para outro acarreta
impactos sobre vrios setores da atividade humana: sistemas polticos (formas de governo,
hierarquizao do poder do estado etc.), sistemas culturais (religio, educao, lngua,
identidade tnica, identidade nacional etc.) e sistemas sociais (diviso do trabalho, papeis
sociais, instituies) etc.
Para ilustrar, vejamos como uma mudana no sistema de mediao, ancoragem e
agrupamento ordenado de gneros repercute no quadro das instituies sociais, fazendo
surgir novas instituies e/ou redesenhando as j existentes, com novas formas
organizacionais e novos postos na hierarquia social. O exemplo das instituies Igreja e
universidade, na passagem do sculo XV ao XVII, esclarecedor. A transio dosistema de
mediao manuscrito (tendo o cdice como cone de todo um sistema de mediao,
ancoragem e agrupamento genrico)para osistemade mediaotipogrfico (que tem o livro
como manifestao emblemtica) associa-se, tanto em termos de causa quanto de efeito, a
uma grande reconfigurao poltica e social do papel da Igreja, que deixou de ser a
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das pretenses em torno do Index librorum prohibitorum29, promulgado incialmente em
1559 e revisto seguidas vezes, o projeto de censura da Igreja operou com muitas restries,
obtendo pouco sucesso nessa rea. Os censores e inquisidores podiam atuar apenas sobre
autores e livros confiscados em seu domnio de jurisdio, pouco podendo fazer para impedir
a operao de tipografias e a circulao de livros em espaos longnquos. Os editores
sempre encontravam meios de burlar os censores, e os livros banidos numa cidade ou regio
eram editados numa outra e contrabandeados por comerciantes e mascates ( THOMPSON,
2011, p. 89). O certo que a atividade econmica que se construiu em torno das tipografias
e do transporte de livros se tornou muito grande para que pudesse ser controlada por decretos
papais, ou at mesmo decretos do rei (THOMPSON, 2011).
O projeto de censura mexeu ainda mais com a base do poder da Igreja. Para atuar em
seus prprios domnios, aqueles em que no perdera espao para os movimentos reformistas
protestantes, a Igreja passou a ter de depender da anuncia e interesse dos estados nacionais.
Para isso, teve de fazer alianas que diminuram o seu poder, beneficiando de algum modo
as organizaes e instituies polticas locais.
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A dicotomia transmisso/comunicao tem um papel decisivo na definio de mdia
em Debray (1993, 1998, 2000, 2004). Segundo o autor, a midiologia no tem como foco a
comunicao. Logo, a concepo de mdia como meio de comunicao de massa
substituda por uma nova concepo, voltada para o fenmeno da transmisso.
Em midiologia, mdio designa, em primeira abordagem, conjunto, tcnica esocialmente determinado, dos meios de transmisso e circulao. Conjunto queprecede e supera a esfera dos meios de comunicao de massa contemporneosimpressos e eletrnicos, entendidos como meios de difuso macia (imprensa,rdio, televiso, cinema, publicidade, etc.). (DEBRAY, 1993, p. 15).
Os meios de comunicao de massa fazem parte do processo de transmisso, mas
constituem apenas um entre os vrios vetores midiolgicos em funcionamento nas
sociedades urbanas. Como tal, os mass media fazem parte da existncia de determinadas
relaes midiolgicas, mas no podem constituir mdias autnomas e suficientes nos
processos de transmisso cultural.
No Curso de midiologia geral, Debray (1993) apresenta o quadro terico a partir do
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CAPTULO 2REVISITANDO CONCEITOS DE MDIA, SUPORTE E HIPERGNERO | 84
Considerando todos os tipos de mediao semitica, mdia pode designar
instituies (a escola), objetos tcnicos (aparelho de rdio, tela de cinema, tubocatdico), suportes materiais (papel, tecido fita magntica, tijolo), cdigos sociais(gramtica, sintaxe), rgos do corpo (laringe, cordas vocais), modos gerais decomunicao (oral, escrito, impresso, audiovisual, informtica) (DEBRAY, 1993,p. 18).
Considerando apenas a mediao semitica verbal, o termo mdia
poder aplicar-se tanto linguagem natural utilizada (ingls ou latim), como aorgo fsico de emisso e apreenso (voz que articula, mo que traa sinais, olhoque decifra o texto), aosuporte material dos traos (papel ou tela), ao processotcnico de coleta de dados e reproduo (impresso, eletrnico): ou seja, nomnimo, quatro acepes. Seria, ento, a midiologia a arte de exprimir conceitosimprecisos sobre um objeto impreciso? (DEBRAY, 1993, p. 18).
Na Introduo mediologia, Debray (2004) apresenta um conceito semelhante ao
anterior. Mdia pode designar:
1) um procedimento geral de simbolizao (palavra articulada, sinal grfico,imagem analgica); 2) um cdigo social de comunicao (a lngua utilizada pelo
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No so mdia, mas entram no campo da m