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SÉRIE TEXTOS DE DISCUSSÃO CEAG/UnB
004/14
Mudança Institucional via Institucionalização: Proposta de um Modelo Analítico para Pesquisa no Setor
Público
Luciana de Oliveira Miranda Gomes Paulo Carlos Du Pin Calmon
Centro de Estudos Avançados de Governo e de Administração Pública - CEAG
Brasília
2014
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Universidade de Brasília
Reitor Ivan Marques de Toledo Camargo
Centro de Estudos Avançados de Governo e
Administração Pública
Coordenador: Paulo Carlos Du Pin Calmon
Laboratório de Análise de Políticas Públicas do
CEAG (LAPP/CEAG)
O Laboratório de Análise de Políticas Públicas do CEAG
(LAPP/CEAG) é formado por professores e alunos da
Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
(FACE/UnB), Instituto de Ciência Política (IPOL/UnB) e
Faculdade de Tecnologia (FT/UnB). Seu objetivo é
desenvolver atividades de pesquisa sobre temas
relacionados à avaliação e análise de políticas
econômicas e sociais. Com esse intuito o grupo apoia o
desenvolvimento de pesquisas fundamentadas em
diferentes abordagens metodológicas, estimula a
elaboração de artigos, dissertações e teses, promove
encontros acadêmicos e incentiva a participação de seus
pesquisadores em eventos científicos no Brasil e no
exterior.
Textos para Discussão (TD)
Mudança Institucional via Institucionalização:
Proposta de um Modelo Analítico para Pesquisa no
Setor Público
Luciana de Oliveira Miranda Gomes
Paulo Carlos Du Pin Calmon
Editor: Luiz Guilherme de Oliveira
Editor Executivo: Mauro G. M. Capelari
Publicação cujo objetivo é divulgar resultados de estudos
desenvolvidos por pesquisadores do CEAG da
Universidade de Brasília (UnB).
As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e
de inteira responsabilidade dos autores, não exprimindo,
necessariamente, o ponto de vista do CEAG/UnB.
É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele
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comerciais são proibidas.
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Mudança Institucional via Institucionalização: Proposta de um Modelo para Pesquisa
no Setor Público
Luciana Miranda de Oliveira Gomes1
Paulo Carlos du Pin Calmon2
2014
1 Docente Universidade de Brasília e pesquisador do CEAG.
2 Docente do Programa Pós-Graduação em Administração – PPGA/UnB e Coordenador do CEAG.
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Mudança Institucional via Institucionalização: Proposta de um Modelo para Pesquisa
no Setor Público
1. Introdução
Durante a década de 1980 observa-se a aplicação da teoria institucional com o intuito de
explicar a homogeneidade organizacional dentro do campo de estudos das organizações
(DIMAGGIO; POWELL, 1983). Embora esta tenha sido uma reconhecida contribuição aos
estudos organizacionais, com o destaque à importância do ambiente nos quais as organizações
estão inseridas, e a explicação do isomorfismo observado entre organizações sujeitas a
pressões institucionais similares, estes estudos não foram capazes de efetivamente entender a
mudança institucional. O conceito de instituição utilizado nesses estudos é extremamente
amplo, podendo incluir regras formais (leis, normas e outros procedimentos regimentais) e
informais relacionadas a códigos de conduta, hábitos e convenções em geral. Mas as
instituições também podem ser vistas a partir dos atores que definem e defendem interesses.
De qualquer modo, os neoinstitucionalistas tendem a enfatizar o caráter mais amplo de
instituições se comparado ao das organizações (NORTH, 1991). Segundo estes autores, por
instituições entendem-se as regras do jogo em uma sociedade, ou mais formalmente, são os
constrangimentos que moldam a interação humana concebida pelos seres humanos (NORTH,
1991). Já Thelen e Steinmo (1992) destacam que as instituições devem ser compreendidas
segundo duas funções principais: a de agentes e a de produtos da história. Isto porque elas dão
forma e restringem a atuação dos atores políticos, mas também são resultados das estratégias
conscientes ou involuntárias desenvolvidas pelos atores.
Os teóricos da vertente histórica do denominado neoinstitucionalismo observam os
limites das explicações dadas pelo institucionalismo da escolha racional para o
comportamento dos atores. Embora reconhecendo a ação estratégica de indivíduos e grupos,
destacam a necessidade de uma análise histórica que apresente o contexto institucional em
que preferências são moldadas e objetivos são privilegiados em detrimento de outros
(THELEN; STEINMO, 1992). As preferências dos atores são construídas, portanto, de forma
endógena, no contexto social e institucional em que as interações se estabelecem
(MARQUES, 1997). As análises são feitas de forma indutiva, com formulação de proposições
a partir da interpretação do material empírico (THELEN; STEINMO, 1992). Os
levantamentos históricos mostram como resultados anteriores estabelecem parâmetros para
eventos subsequentes (SKOCPOL, 1995). Um conceito destacado nos estudos dessa corrente
é o de dependência de trajetória (path-dependence), relacionada à ideia de que
acontecimentos do passado podem dar vazão a uma cadeia de determinações que influenciam
as decisões políticas no presente (THELEN; STEINMO, 1992). Portanto, o
neoinstitucionalismo histórico inclui, na definição de instituição, regras formais e informais e
procedimentos que estruturam a conduta (THELEN; STEINMO, 1992). Para fins conceituais,
admite-se a definição de instituição como o conjunto de regras formais, os mecanismos
procedimentais que fazem as regras serem observadas, as práticas operacionais padronizadas
que estruturam as relações entre os indivíduos. Essas instituições dão forma ao modo como os
diferentes atores políticos definem seus interesses e metas e como estruturam as relações de
poder de uns em relação aos outros, bem como a distribuição de recursos.
Sendo assim, o objetivo deste ensaio teórico é propor um modelo analítico alternativo
para investigar diferentes processos de mudança institucional (MAHONEY; THELEN, 2010)
através da institucionalização conduzida de distintas formas por atores institucionais
(OLIVER, 1991, 1992); (LAWRENCE; SUDDABY, 2006). As seções a seguir apresentam o
tema mudança institucional e os tipos de institucionalização, assim como o papel dos atores
institucionais neste processo. A seguir são apresentadas proposições iniciais geradas através
do modelo analítico proposto, e uma agenda inicial de pesquisa futura.
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2. Processos de Institucionalização
Thelen (2003) propõe uma teoria sistemática da mudança institucional, onde um dos
seus aspectos mais importantes é a crítica do modelo do equilíbrio pontuado de mudança
institucional. Este modelo, desenvolvido por True, Jones e Baumgartner (1999) parte da
noção de que os processos de política pública se caracterizam por períodos de “equilíbrio”
que são “pontuados” por períodos de mudança, quando um determinado tema ganharia espaço
na agenda do governo e, portanto, deixaria de estar restrito às discussões e ingerências dos
atores que pertencem exclusivamente a um subsistema. Desta forma, o modelo do equilíbrio
pontuado preconiza a existência de momentos críticos, que interrompem a inércia
institucional e provocam mudanças radicais. Esses momentos críticos seriam decorrentes,
principalmente, de choques exógenos e, portanto, seriam gerados por processos cuja dinâmica
é externa ao subsistema de políticas públicas específico. A proposta de que instituições são
“dependentes da trajetória” (path dependency) e de que o processo de mudança institucional é
decorrente de “momentos críticos” (critical junctures) alcançou grande aceitação e tornou-se,
em grande medida, hegemônica na ampla maioria dos estudos conduzidos no âmbito do
paradigma neoinstitucionalista, especialmente para os chamados neoinstitucionalistas
históricos.
No entanto, ao longo dos anos, várias críticas surgiram a essa perspectiva de dinâmica
institucional. Thelen (2003), por exemplo, sem rejeitar os conceitos de momentos críticos e de
dependência da trajetória, argumenta que a maioria das formas de mudanças institucionais
ocorre na ausência de momentos críticos e que, em muitos contextos, os mecanismos
endógenos (internos) de mudança são mais influentes que os decorrentes de choques
exógenos. Isso significa que, a fim de compreender a dinâmica institucional, os cientistas
sociais deveriam prestar mais atenção a processos de mudança que ocorrem durante longos
episódios de relativa estabilidade política ou organizacional (THELEN, 2003). Streeck e
Thelen (2005) especificam esses processos de mudança, propondo uma taxonomia de
processos incrementais e abruptos que resultam em continuidade ou não das instituições. O
Quadro nº 1 abaixo descreve esses processos.
RESULTADOS DA MUDANÇA
Continuidade Descontinuidade
PROCESSOS DE
MUDANÇA
Incremental Reprodução por
Adaptação
Transformação
Gradual
Abrupta Sobrevivência e Retorno Ruptura e
Substituição
Fonte: Streeck e Thelen, 2005, p. 9 (tradução livre).
Quadro 1: Tipos de Mudança Institucional – Processos e Resultados
A tradição do modelo do equilíbrio pontuado é representada pela combinação de
mudança abrupta com descontinuidade, resultando em ruptura e substituição. Mas, além
disso, haveria três outros possíveis combinações de dinâmica institucional. Por exemplo,
reprodução por adaptação seria resultado de mudanças incrementais com continuidade.
Consiste em uma contribuição extremamente importante a possibilidade de ocorrência dos
dois outros tipos de dinâmica institucional, não previstos adequadamente pelos demais
autores. A primeira delas é a existência de mudanças incrementais que podem provocar
transformações graduais nas instituições, gerando, segundo os citados autores, uma
“transformação gradual”. Essa situação pode advir porque as mudanças nem sempre ocorrem
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nas composições institucionais, mas suas intenções ou formatos de ação. A outra forma é a
denominada mudança abrupta, mas cujo efeito seria de relativa conservação das instituições
vigentes, através de estratégias de sobrevivência e retorno.
Neste aspecto, Thelen (2003) propõe uma investigação acerca de como instituições são
renegociadas periodicamente e internamente, sem mudanças drásticas - também chamadas de
“causas constantes” (THELEN, 2003, p. 213), apresentado na célula acima, à direita do
Quadro 1. A referida autora utiliza dois conceitos: estratificação institucional (renegociação
parcial de alguns elementos de um dado conjunto de instituições, deixando os outros no lugar)
e conversão (quando as instituições já existentes são redirecionadas para novos fins,
impulsionando as transformações no papel que eles desempenham ou a função elas servem)
(THELEN, 2003, p. 226).
Como conceituar então esse tipo de mudança gradual dentro de um processo de
continuidade? Thelen (2003) aponta dois passos para se tentar fazer isso. Primeiramente, ela
traz explicações de agência em conjunto com as explicações de estrutura. De fato, conceito de
agência tem papel primordial na teoria institucional. Agência pode ser conceituada como a
capacidade de produzir efeito, ou interferir em eventos, não sendo a intencionalidade um pré-
requisito. Ou seja, a agência incorpora ações intencionais, bem como as não intencionais.
Conforme Giddens (2003, p. 10-11, grifo do autor e aspas no original):
“Agência” não se refere às intenções que as pessoas têm de fazer as
coisas, mas à capacidade delas para realizar essas coisas em primeiro
lugar [...] diz respeito a eventos dos quais um indivíduo é o
perpetrador, no sentido de que ele poderia em qualquer fase de uma
dada sequência de conduta, ter atuado de modo diferente. O que quer
que tenha acontecido não o teria se esse indivíduo não tivesse
interferido.
Thelen (2003), no entanto, salienta que os agentes não constroem soluções institucionais
na forma que quiserem. Pelo contrário, os problemas que enfrentam e a sua percepção do que
é possível é moldada pelos contornos da paisagem institucional e política em que elas estão
localizadas. Thelen enfatiza, então, que esta condição constrange os agentes, proporcionando-
lhes um cardápio de opções do que eles são obrigados a propor. A mudança, ao longo do
tempo, nas condições descritas e onde os agentes agem, pode, além disso, remover a
possibilidade de estratégias e metas que até pouco tempo eram muito favorecidas pelos atores.
Mas a relação agência versus estrutura na análise de Thelen (2003) não termina aí.
Agentes e estrutura são separados e, normalmente, a constituição da estrutura precede a
constituição do agente. A estrutura impõe restrição a certos tipos de ação, enquanto, ao
mesmo tempo, permite outros tipos de ação. Fundamentalmente, para a citada autora, isso não
determina necessariamente a forma pela qual os agentes vão agir, porque eles se envolvem em
"política" com outros interessados ou atores concorrentes. As estratégias e o
comprometimento que tal política alude, alteram, invariavelmente, os resultados obtidos a
partir de que teria sido desejado por qualquer ator, individualmente.
Observa-se também o interesse de Thelen (2003) pela contingência no tratamento da
relação estrutura e agência, onde ela ressalta o papel e faz deferência para com o poder da
estrutura sobre o escopo das possibilidades de enfrentar atores. No entanto, uma vez que os
atores criaram um novo arranjo, esta nova estrutura define claramente os interesses destes e os
leques de possibilidades para a ação que os enfrenta. Mas este privilégio da estrutura sobre
agentes independentes não é a única forma de conceber essa relação. Também é possível
pensar os agentes e a estrutura sendo constituídos simultaneamente no processo de ação. Para
fazer isso, é preciso entender se os imperativos impostos pelo projeto estrutural serão
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ambíguos e os interesses e identidades dos atores serão mal definidos e plásticos, existindo
num fluxo de trocas comunicativas entre atores rivais nas suas possibilidades de ação e os fins
desejados (THELEN, 2003).
Streeck e Thelen (2005) delineiam cinco tipos de transformações institucionais
graduais: deslocamento, acréscimo em camadas, deslizamento, conversão e exaustão. Para os
autores, o deslocamento (displacement) é um conceito surgido por meio do ‘novo’
institucionalismo na sua corrente sociológica (STREECK e THELEN, 2005, p. 19), quando
novos modelos emergem e se difundem, desafiando a existência de formas e práticas
organizacionais já tomadas como certas. De fato, Streeck e Thelen (2005) destacam que
estruturas institucionais pré-existentes em uma dada sociedade não são completamente
coerentes, e assim suas configurações são vulneráveis à mudança através do deslocamento,
visto que acondicionamentos tradicionais são desacreditados e impelidos ao largo em favor de
novas instituições e lógicas comportamentais associadas.
O tipo denominado acréscimo em camadas (layering) é considerado para Streeck e
Thelen (2005) a mudança que põe em marcha caminhos que alteram uma dada dinâmica por
meio de um mecanismo denominado crescimento diferenciado. Assim, os mencionados
autores argumentam que a introdução de novos elementos desencadeia uma dinâmica que, ao
longo do tempo, pode – ativamente – expulsar ou suplantar sistemas antigos, já que o domínio
desse último progressivamente se retrai em relação aos primeiros. Para eles, a questão mais
importante é saber em que medida a margem (ou sistemas novos) e o núcleo (ou sistemas
antigos) poderão coexistir pacificamente, ou se a margem poderá atrair “desertores”
suficientes do núcleo para eventualmente substituí-lo.
O conceito de deslizamento (drift) parte da constatação de que a constância institucional
nunca é automática, apesar do termo “instituição” estar relacionado com a ideia de
estabilidade e aderência (STREECK; THELEN, 2005). Thelen (2003) já comentava acerca da
dificuldade da sobrevivência de instituições se estas permanecessem imóveis, ou ainda, que
confiassem que sua reprodução fosse sempre uma simples questão de feedback positivo ou de
retornos crescentes. Deste modo, segundo a autora, instituições requerem uma manutenção
ativa. A fim de permanecer o que são, as instituições precisam ser repostas e reorientadas e,
em alguns casos, ser reavaliadas e renegociadas, em resposta às mudanças no ambiente
político e econômico nas quais elas estão incorporadas (STREECK; THELEN, 2005). Se esta
manutenção é deliberadamente negada, a instituição pode não sobreviver.
Streeck e Thelen (2005) apontam a conversão (conversion) como uma forma de
mudança institucional diferente dos denominados “acréscimos em camadas” e
“deslizamento”. Neste tipo de mudança institucional, as instituições não são muito
desfiguradas ou permitidas à decadência, já que são redirecionadas para novos objetivos,
funções ou escopos. Este redirecionamento pode acontecer por meio de novos desafios
ambientais, mudanças nas relações de poder e contestações políticas acerca das funções e
propósitos que uma dada instituição deveria servir.
O último tipo de mudança institucional mediante transformações graduais descrito por
Streeck e Thelen (2005) é a exaustão (exhaustion). Neste caso, os autores salientam que o
processo em foco conduzirá necessariamente para a ruptura institucional, apesar de a falência
ser descrita como gradual, e não abrupta. Os autores apresentam o conceito de exaustão
institucional como um processo, no qual comportamentos evocados ou permitidos pelas
regras existentes são cometidos para enfraquecê-las. O Quadro nº 2 sintetiza esses tipos de
mudança institucional.
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DEFINIÇÃO MECANISMO PREPARAÇÃO
DESLOCAMENTO
Crescimento
gradual de
instituições
previamente
subordinadas.
Deserção
Incoerência institucional
abrindo espaço para
comportamentos
desviantes;
Produção ativa de uma
nova “lógica” de ação
dentro de uma
configuração institucional
existente;
Redescoberta e catalisação
de recursos institucionais
latentes;
“Invasão” e assimilação
de práticas externas.
ACRÉSCIMO EM
CAMADAS
Novos elementos
agregados a
instituições já
existentes, que
gradualmente
alteram seu status
e estrutura.
Crescimento
diferenciado
Crescimento rápido de
novas instituições criadas
à margem de antigas;
Nova margem se mantém
através de um núcleo
antigo;
Novas camadas
institucionais desviam o
apoio às antigas;
Uma “correção”
presumida
desestabilizando
instituições existentes;
Compromisso entre a
antiga e a nova instituição
transforma-se lentamente
em anulação da primeira.
DESLIZAMENTO
Negligenciamento
determinado da
manutenção de
uma instituição
Negligência
deliberada
Mudança nos resultados
institucionais afetados por
uma (estratégica)
adaptação descuidada das
alterações circunstanciais;
Mudança na sanção de
uma instituição, não
através de reformas ou
regras, mas sim através de
regras que permanecem
inalteradas face à evolução
de condições externas.
CONVERSÃO
Readequação de
antigas
instituições a
novos propósitos;
Redirecionamento,
reinterpretação
Lacunas entre regras e sua
divulgação devido à falta
de antevisão; ambiguidade
intencional de regras
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novos propósitos
ligados a antigas
estruturas.
institucionais;
reinterpretação de regras
“por baixo”; mudança de
condições contextuais e
coalizões dando acesso
para reimplantação de
instituições.
EXAUSTÃO
Desmantelamento
(ou decadência)
gradual de
instituições ao
longo do tempo
Esgotamento
O funcionamento normal
de uma instituição
compromete suas
precondições externas;
Mudanças generalizadas
modificam as relações
custo-benefício;
Limites para o
crescimento.
Fonte: Streeck e Thelen, 2005, p. 31 (tradução livre das definições, mecanismos e
preparações).
Quadro 2: Mudança Institucional – Cinco Tipos de Transformação Gradual.
Em trabalho recente, Mahoney e Thelen (2010) apresentam um modelo básico para
explicar diferentes formas de mudança institucional. O modelo em questão está apresentado
na Figura nº 1.
Fonte: Mahoney e Thelen, 2010, p. 15 (tradução livre).
Figura 1: Estrutura Teórica para Explicar Formas de Mudança Institucional
A concepção teórica de Mahoney e Thelen (2010) afirma que ambas as características
do contexto político e da instituição em questão conduzem a um tipo de mudança institucional
esperada (relação “I”). Este fato acontece, ainda segundo os autores, por que a forma
institucional e o contexto político influenciam o tipo dominante de agente de mudança
(relação “III”) que irá surgir e desenvolver-se num contexto institucional específico (relação
“II”).
Mahoney e Thelen (2010) propõem, ainda, a partir de reflexões anteriores (STREECK;
THELEN, 2005; THELEN, 2003) uma teoria da mudança institucional gradual. A
contribuição dos autores parte da crítica de que a maioria dos estudiosos da área tem
concentrado suas pesquisas nas consequências de choques exógenos, que trazem algumas
Características do Contexto Político
Características da Instituição
III Tipo Dominante de Agente de
Mudança
II Tipo de Mudança
Institucional
I
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reconfigurações institucionais básicas, e negligenciam mudanças que são baseadas em
desenvolvimentos endógenos, que frequentemente se desdobram incrementalmente. A
proposta dos autores esquematiza quatro tipos formais de mudança institucional gradual:
deslocamento (displacement), acréscimo em camadas (layering), deslizamento (drift) e
conversão (conversion). Cada tipo é definido por meio da ponderação acerca do ponto aonde
a transformação institucional acontece. O entendimento desses diferentes tipos de mudança
institucional, incluindo aí os papeis que defensores institucionais e de seus desafiantes
desempenham, prepara o terreno para análise do como e do porque um tipo pode ocorrer com
mais frequência que outro. Nota-se que a exaustão, discutida em Streeck e Thelen (2005), não
está incluída nesta proposta. De fato, Mahoney e Thelen (2010) demonstram um progresso
teórico a partir do trabalho de Streeck e Thelen (2005), com o arrefecimento das categorias e
do relacionamento destas com o tipo de agentes, apresentado no Quadro nº 3 e discutido a
seguir.
A teoria proposta também destaca os diferentes tipos de agentes de mudança, cujas
estratégias diferenciadas (insurrectionaries, symbionts, subversives e opportunists) irão
desenvolver-se em ambientes institucionais específicos (MAHONEY; THELEN, 2010).
Segundo os autores, agentes insurgentes procuram deliberadamente eliminar instituições ou
regras existentes, e agem para isso, de forma deliberada visível a todos. Já os agentes
simbiontes existem em duas variedades – parasitários e mutualísticos. Ambos agentes
simbiontes dependem (e prosperam) em instituições que não são de sua própria criação.
Enquanto agentes simbiontes parasitários exploram uma instituição com intuito de ganho
próprio a despeito de atrapalhar a eficácia da instituição, as ações dos agentes simbiontes
mutualísticos não chegam a comprometer a eficiência das regras ou mesmo a sobrevivência
da instituição. Isto porque estes últimos, segundo Mahoney e Thelen (2010), desobedecem ao
caráter da regra a fim de apoiar e sustentar seu espírito, ao contrário dos parasitários, que
exploram esse caráter enquanto transgridem seu espírito. Agentes denominados subversivos
são aqueles que procuram substituir instituições, mas o fazem sem invalidar as regras da
instituição em questão. Ao contrário, esses agentes dissimulam efetivamente a sua preferência
pela mudança institucional seguindo expectativas institucionais e trabalhando dentro do
sistema. Eles aguardam a sua vez, esperando o momento propício para que possam
abertamente mover-se em direção a uma postura de oposição.
Finalmente, agentes oportunistas são aqueles que têm preferências ambíguas acerca da
continuidade institucional – o Quadro nº 3 expõe essa característica de forma evidente. No
entanto, já que se opor a uma instituição tem seu custo, eles também não tentam mudar as
regras. A ação pretendida é tirar partido de todas as possibilidades que o sistema dominante
para alcançar seus objetivos. Mahoney e Thelen (2010) demonstram as diferenças entre estes
tipos de agente de mudança, por meio de duas questões básicas: (i) O ator busca preservar as
regras institucionais existentes? E (ii) O ator cumpre as regras institucionais? O Quadro nº 3
exemplifica o comportamento dos tipos de atores. Os autores concluem que existe uma
extensa agenda de pesquisa potencial, por meio de novos conceitos e suposições causais
propostas.
Procuram Preservar a
Instituição
Seguem as Regras da
Instituição
Insurrectionaries (insurgentes) Não Não
Symbionts (simbiontes) Sim Não
Subversives (subversivos) Não Sim
Opportunists (oportunistas) Sim/Não Sim/Não
Fonte: Mahoney e Thelen, 2010, p. 23 (tradução livre).
Quadro 3: Tipos de Agente de Mudança
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3. O Papel de Atores Institucionais
Esta seção irá apresentar e discutir o papel de atores na elaboração, transformação,
manutenção e desmembramento de instituições. Para tanto, é introduzido o conceito de
“institutional work” (ação institucional), com base no trabalho de Lawrence e Suddaby,
pesquisadores canadenses que têm como foco de estudos como as organizações e as
instituições mudam. O trabalho desses autores relaciona-se com a seção anterior porque
permite um exercício de complementariedade com teoria da mudança institucional
(MAHONEY; THELEN, 2010), assim como dos tipos de agente de mudança descritos no
Quadro nº 3. A seção finaliza apontando possíveis análises e comparações acerca das
contribuições de Mahoney e Thelen (2010) e Lawrence e Suddaby (2006).
Recentemente, estudos institucionais sobre a compreensão do papel dos atores na
elaboração, transformação e manutenção de instituições (OLIVER, 1991, 1992;
LAWRENCE; SUDDABY, 2006; MAHONEY; THELEN, 2010); vêm ganhando destaque na
literatura. No entanto, o papel dos atores na criação de novas instituições, foi examinado em
primeiro lugar no âmbito do empreendedorismo institucional por DiMaggio (1988). O
referido autor chamou atenção para a importância da retomada dos conceitos de poder e
interesse tendo em vista a compreensão das instituições, sobretudo no que se refere à
transformação e à criação de novas instituições. A partir desse marco, pesquisas sobre a
mudança institucional, provocadas pela atividade de empreendedores institucionais surgiram
(LECA; BATTILANA; BOXENBAUM, 2008).
Segundo Lawrence e Suddaby (2006, p. 215), o conceito de empreendedorismo
institucional é importante porque chama a atenção para três grupos de estudos. No primeiro,
atores interessados agem para influenciar contextos institucionais, através, por exemplo, de
estratégias acerca de liderança tecnológica e de mercado, campanhas para mudanças na
regulação e ações discursivas. Outro grupo de estudos dentro da pesquisa institucional que se
destaca, conforme os citados autores, são os papeis dos atores na transformação de
instituições pré-existentes. De fato, os autores destacam o registro das habilidades de atores
organizacionais, particularmente aqueles que detêm recursos estratégicos ou outras formas de
poder, em ter um impacto significativo na transformação das instituições. Um terceiro grupo
de estudos lembrado por Lawrence e Suddaby (2006) é o que analisa o papel dos atores em
manter instituições. Apesar da argumentação clássica de que instituições são de natureza
duradoura (MEYER; ROWAN, 1991), as instituições dependem da ação de indivíduos e de
organizações para sua reprodução ao longo do tempo (BERGER; LUCKMANN, 2004).
De fato, a intenção de Lawrence e Suddaby (2006) ao chamar a atenção sobre pesquisas
acerca do papel de atores, é propor o conceito de “institutional work” (ação institucional)3
para descrever a ação intencional de indivíduos e organizações com o objetivo de criar,
manter e desfazer instituições. Segundo os autores, apesar do aporte de outros pesquisadores,
a contribuição de DiMaggio (1988) e Oliver (1991, 1992) são uns dos componentes teóricos
fundamentais que sinalizarão a mudança do interesse de pesquisadores institucionalistas para
o impacto de atores individuais e coletivos sobre instituições que regulam os campos nos
quais eles atuam. O outro é inspirado nos estudos da sociologia da prática, que enfoca a ação
localizada de indivíduos e grupos e como eles lidam e tentam reagir às demandas do dia a dia
(LAWRENCE; SUDDABY, 2006).
Lawrence e Suddaby (2006) sugerem uma abordagem para o estudo e entendimento da
ação institucional com três elementos-chave: o conhecimento, habilidade e reflexibilidade de
atores individuais e coletivos; a ação mais ou menos consciente destes atores; e o conjunto de
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práticas através das quais os atores criam, mantém e desfazem instituições. A partir de uma
extensa revisão de literatura, os referidos autores apresentam conjuntos distintos de práticas
por meio das quais atores encarregam-se em ações que resultam na criação, manutenção e
desmantelamento de instituições.
Ações de criação refletem três grandes categorias de atividades: a ação política notória,
em que atores reconstroem regras, direitos de propriedade e limites que definem o acesso a
recursos materiais; ações que dão ênfase à reconfiguração do sistema de crenças dos atores; e
ações concebidas para alterar categorizações abstratas nas quais os limites dos sistemas de
significado são alterados. O Quadro nº 4 apresenta estas formas de ação institucional
associadas à criação de instituições. Já que o conceito de ação institucional destaca o esforço e
as práticas engenhosas dos atores, Lawrence e Suddaby (2006) enumeram algumas sugestões
para a investigação acerca da criação de instituições por estes. A primeira diz respeito à
habilidade de estabelecer regras e construir recompensas e sanções que consagram estas
regras. Segundo os autores, somente alguns atores em um dado campo de análise terão essa
habilidade vinculada a sua posição; em algumas situações, esse papel é restrito ao Estado ou a
um representante deste, tal como um órgão profissional. Outra sugestão de investigação é a
ação institucional que foca na mudança de normas e sistemas de crenças, associada, segundo
Lawrence e Suddaby (2006), à criação de normas, práticas e tecnologias institucionalizadas
que emparelham ou complementam instituições já existentes. De acordo com esses autores,
este tipo de ação normativa apoia-se sobre a força cultural e moral, as quais são incorporadas
em práticas comunitárias. Finalmente, a terceira proposta de pesquisa concerne à mudança de
significado de categorias abstratas e irá se preocupar tanto com atores bem estruturados no
campo de análise quanto com aqueles isolados e periféricos, mas com grande potencial de
empreendimento para a ação institucional.
FORMAS DE AÇÃO
INSTITUCIONAL DEFINIÇÃO
Advocacia Mobilização de apoio político e regulatório por meio de
técnicas deliberadas e diretas de persuasão social.
Determinação
Construção de sistemas de regras que conferem status
ou identidade, definição de limites de adesão ou criação
de uma hierarquia de status dentro de uma área de
atuação.
Aquisição Criação de uma estrutura de regras que confere direitos
de propriedade.
Construção de identidades Definição do relacionamento entre um ator e a área de
atuação onde esse ator age.
Mudança de associações
normativas
Reconstrução das conexões entre conjunto de práticas e
as fundações morais e culturais destas práticas.
Construção de redes normativas
Construções de conexões inter-organizacionais mediante
as quais práticas se tornam sancionadas
normativamente, formando grupos equiparados em
respeito à execução, monitoramento e avaliação.
Mimetismo
Associação de novas práticas com conjuntos de práticas,
tecnologias e regras já existentes com o objetivo de
facilitar a sua adoção.
Teorização Desenvolvimento e especificação de categorias abstratas
e elaboração de cadeias de causa e efeito.
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Aperfeiçoamento Educação de atores em habilidades e conhecimento
necessários para apoiar a nova instituição.
Fonte: Lawrence e Suddaby, 2006, p. 221 (tradução livre).
Quadro 4: Criação de Instituições
A questão acerca da manutenção de instituições por atores – individuais e coletivos –
em áreas de atuação organizacional recebeu, segundo Lawrence e Suddaby (2006),
significadamente menos atenção acerca de sua criação do que a descrita acima. Comumente,
ações institucionais que têm como objetivo a manutenção de instituições implicam em apoio,
reparação ou recriação de mecanismos sociais que garantam a sua efetivação. Os autores
identificam seis tipos de ações institucionais dedicadas à manutenção de instituições. Esses
seis tipos são divididos em dois conjuntos de categorias que, visam, primeiramente, à
manutenção de instituições por meio da garantia de aderência ao sistema de valores, e, em
segundo lugar, através da reprodução de normas existentes e sistemas de crenças. O Quadro
nº 05 apresenta estas formas de manutenção de instituições.
Lawrence e Suddaby (2006, p. 234) destacam a importância de estudar as maneiras
pelas quais instituições se reproduzem (e se mantêm). Os autores inclusive ressaltam que,
talvez, esta seja uma pergunta mais importante para a pesquisa institucional do que aquela
sobre a criação de instituições. Estratégias de investigação são então listadas:
uma série de ações institucionais utilizadas para manutenção de instituições
pode ser ordenada em um continuum de “compreensibilidade”: a ação utilizada
para manter sistemas de regras (habilitação, policiamento e dissuasão) destaca-se
pelo alto grau de entendimento; e, no outro lado do espectro, a manutenção de
instituições mediante a reprodução de normas e sistemas de crenças (valorização
e demonização, mitologização, e incorporação e rotinização) é geralmente
menos compreensível; e
a manutenção de instituições deve ser distinguida da simples estabilidade ou
ausência de mudança, uma vez que a ação institucional que mantêm instituições
envolve um considerável esforço e frequentemente ocorre como uma
consequência de uma mudança da organização ou do seu ambiente.
Dessa forma, os autores argumentam que, para investigar como instituições se
mantêm, é necessário enfocar no entendimento de como os atores estão aptos a agir, para
efeito de persistência e estabilidade, num contexto de sublevação e mudança.
FORMAS DE AÇÃO
INSTITUCIONAL DEFINIÇÃO
Habilitação para a ação Criação de regras que facilitam, completam e apoiam
instituições.
Policiamento Garantia do seu cumprimento por meio de
implementação, auditoria e acompanhamento.
Dissuasão Estabelecimento de barreiras coercitivas para a mudança
institucional.
Valorização e Demonização
Provisão para o consumo público exemplos positivos e
negativos que ilustram o fundamento normativo de uma
instituição.
Mitologização
Preservação das normas subjacentes de uma instituição
por meio da criação e acolhimento de mitos a respeito de
sua história.
15
Incorporação e rotinização
Imposição ativa dos fundamentos normativos de uma
instituição no dia a dia da rotina de seus participantes e
das práticas organizacionais.
Fonte: Lawrence e Suddaby, 2006, p. 230 (tradução livre)
Quadro 5: Manutenção de Instituições
A ação institucional que tem como objetivo desfazer instituições opera para afrontar ou
para debilitar os mecanismos que conduzem os membros a corresponder a elas. Lawrence e
Suddaby (2006) destacam que a investigação da ação institucional com objetivo de desfazer
instituições é infrequente na literatura. No Quadro nº 06 são apresentadas, então, as formas de
ação institucional que têm como objetivo desfazer (ou desmembrar) instituições, segundo os
citados autores. Estes apontam que esses estudos focam fundamentalmente no relacionamento
entre uma instituição e os controles sociais que o perpetuam, ou seja, as formas de ação
institucional descritas no Quadro nº 06 diminuem, de alguma forma, o impacto desses
controles sociais sobre a não conformidade de atores individuais e coletivos. Além disso,
Lawrence e Suddaby (2006) afirmam que este grupo de categorias somente descreve um
pequeno subconjunto de estratégias potenciais disponíveis para atores, tanto individuais
quanto coletivos, com a intenção de desfazer instituições.
FORMAS DE AÇÃO
INSTITUCIONAL DEFINIÇÃO
Desconexão de sanções
Atuação, por meio do aparato situacional, para
desconexão de recompensas e sanções de alguns
conjuntos de práticas, tecnologias e regras.
Dissociação de fundamentos morais
Dissociação da prática, regra ou tecnologia do
seu fundamento moral, como apropriado
somente aos limites de um contexto cultural
específico.
Enfraquecimento de pressupostos e
crenças
Diminuição da percepção dos riscos de inovação
e diferenciação pelo enfraquecimento do cerne
de pressupostos e crenças.
Fonte: Lawrence e Suddaby, 2006, p. 235 (tradução livre)
Quadro 6: Desmembramento de Instituições
No entanto, Lawrence e Suddaby (2006) observam dois possíveis caminhos para
investigação desse tipo de ação institucional: a influência relativa de pressões institucionais
sobre diferentes tipos de atores; e as atividades que esses atores comprometem-se para
desfazer estruturas institucionalizadas. No primeiro, os autores asseguram que pressões
institucionais são menos “totalizantes” do que a literatura afirma para alguns atores e em
alguns contextos. Por exemplo, a habilidade de desconectar recompensas e sanções de
comportamentos é mais diretamente associada ao Estado e ao Judiciário, assim como àquelas
profissões e elites que detêm recursos intelectuais e financeiros para se proteger da
capacidade do Estado e do Judiciário de desprivilegiá-los de alguma forma. Ou seja, essa
questão sugere um caminho de investigação acerca do por que e como esses atores ganham
essa imunidade.
Na segunda observação, Lawrence e Suddaby (2006) comentam que as atividades que
estes atores se empenham para desfazer estruturas institucionalizadas são, em grande parte,
discursivas, e relacionadas aos contornos da ação institucional. Esses limites, segundo os
autores, podem ser sociais ou simbólicos. Limites sociais referem-se a demarcações
econômicas, físicas e políticas. Limites simbólicos incluem contornos morais,
16
socioeconômicos e culturais. De acordo com Lawrence e Suddaby (2006), atores individuais e
coletivos desfazem instituições por meio da redefinição, recategorização, reconfiguração,
abstração, problematização e, geralmente, manipulando os limites sociais e simbólicos que
constituem estas instituições.
Observa-se então, na taxonomia das ações institucionais elaboradas por Lawrence e
Suddaby (2006), considerável potencial para contribuir com o desenvolvimento da pesquisa
institucional. Os autores sugerem, inclusive, possíveis linhas de investigação, como, por
exemplo, a análise do conceito de difusão. Para os autores, a ideia de difusão é central na
teoria institucional. Nas palavras deles:
O padrão de eventos e relações que definem o processo de
institucionalização envolve primeiro um objeto a ser reconhecido,
então é aceito por relativamente poucos atores, e depois amplamente
difundido e aceito dentro de um campo [...]. O que essas discussões de
difusão tendem a encobrir, no entanto, é o trabalho prático e criativo
necessário para fazer a difusão acontecer: as organizações raramente
assumem por inteiro as estruturas e práticas de outras organizações,
sem conflitos e sem esforço. Pelo contrário, a difusão da inovação ao
longo de um campo envolve o trabalho institucional considerável por
parte dos atores organizacionais, que têm de persuadir outros em suas
organizações do mérito da inovação, ensaiar a inovação em um
esforço para compreendê-la e como ela pode se aplicar a sua própria
situação, modificá-la para ganhar legitimidade interna e estabelecer
conexões concretas para a nova estrutura ou prática (LAWRENCE;
SUDDABY, 2006, p. 247 – tradução livre).
Em outro artigo, Lawrence, Suddaby e Leca (2011) chamam a atenção para uma
questão esquecida ao longo do desenvolvimento da teoria institucional: a experiência vivida
de atores organizacionais, especialmente a conexão entre essa experiência vivida e as
instituições que estruturam e são estruturadas por ela. De fato, os autores buscam salientar o
ponto onde a ação institucional se afasta das preocupações tradicionais do enfoque
institucional. Este ponto está na rejeição, na perspectiva da ação institucional, da noção de
que somente atividades de interesse estão associadas com instâncias de mudança institucional
“bem sucedidas”. Lawrence et al. (2011) destacam, então, as equivocadas atividades
rotineiras e inumeráveis que:
[...] embora destinada a atentar contra a ordem institucional,
representam uma mistura complexa de formas de agência – exitosas
ou não, ao mesmo tempo radical e conservadora, estratégicas e
emocionais, cheia de compromissos, e cheia de consequências
inesperadas (LAWRENCE et al., 2011, p. 52 – tradução livre).
Assim, os autores apontam como ponto de partida para o estudo da ação institucional a
análise da ação, ou seja, os esforços de atores individuais e coletivos para afrontar, escoltar,
amparar, demolir, mover, modificar ou criar novamente as estruturas institucionais em que
vivem, trabalham e se divertem, e que lhes oferecem seus papeis, relações, recursos e rotinas.
Em resumo, o conceito de ação institucional estimula pesquisadores a adotar diferentes
pontos de vista, por meio da mudança do olhar de larga escala acerca das transformações
sociais, para o relacionamento entre instituições e os indivíduos que as difundem. A
perspectiva da ação institucional ressalta, assim, mais a prática e o processo do que as
consequências, ou seja, pergunta por que e como e não necessariamente o quê e quando.
As discussões apresentadas até agora assinalam abordagens acerca de mudanças
institucionais graduais que valorizam as relações entre atores e os campos nos quais estes
atuam, destacando em particular o papel das estruturas racionais formais e o papel do
17
comportamento destes atores. De fato, uma contribuição fundamental destas abordagens tem
sido o desenvolvimento das análises das influências dos processos mediante os quais as
instituições – supostamente – governam uma dada ação nas organizações. Desta forma, o
objetivo até aqui foi discutir um diferente ponto de vista em contraponto aos tradicionais
estudos institucionais de organizações. Percebe-se que o conceito de ação institucional –
“institutional work” – apresentado por Lawrence e Suddaby (2006), os cinco tipos de
transformações institucionais graduais (STREECK; THELEN, 2005) e a teoria da mudança
institucional gradual (MAHONEY; THELEN, 2010) demonstra uma significativa
reorientação da teoria institucional, já que valorizam o papel ativo dos atores – individuais e
coletivos – na criação, manutenção e o desmembramento de instituições.
Examinando os modelos de mudança institucional de Lawrence e Suddaby (2006),
Streeck e Thelen (2005) e Mahoney e Thelen (2010), discutidos acima, percebem-se pontos
críticos que merecem ser mais bem analisados. Lawrence e Suddaby (2006) avançam em
relação ao modelo proposto por Oliver (1991, 1992), incluindo novas categorias. No entanto,
também não estabelecem possíveis relações causais entre as ações institucionais descritas e o
contexto de onde elas poderiam surgir. Por outro lado, Streeck e Thelen (2005) e Mahoney e
Thelen (2010) desenvolvem um modelo (Figura nº 1) onde a relação de causalidade é
especificada, porém, os autores só consideram o contexto político, e não o social e funcional.
Também não levam em consideração as ações estratégicas de atores (LAWRENCE;
SUDDABY, 2006).
A proposta de investigação que então se apresenta é pesquisar a conduta dos principais
atores responsáveis frente às possíveis ações de criação, desenvolvimento e desmantelamento
de instituições. Para tanto, como sintetizado na Figura nº 2, sugere-se a inserção (na cor
vermelha), no modelo original proposto por Mahoney e Thelen (2010) e apresentado na
Figura nº 1, das contribuições conceituais de Lawrence e Suddaby (2006). A Figura nº 2
expõe essa sugestão de estrutura teórica. Propõem-se essas inserções em consequência das
limitações que o modelo de Mahoney e Thelen (2010) apresenta, descritas anteriormente.
Observa-se na Figura nº 2 uma seta, em vermelho, de características bidirecionais. Esta
seta bidirecional relaciona o tipo dominante de agente de mudança (MAHONEY; THELEN,
2010) e as formas de ação institucional destes agentes (LAWRENCE; SUDABBY, 2006)
explica-se pela possibilidade de detalhar que ações institucionais os tipos de agentes descritos
por Mahoney e Thelen (2010, p. 23) podem exercer. Em outras palavras, auxilia a entender
mais especificamente quem está fazendo o quê.
18
Figura 2: Modelo Analítico Proposto
O objetivo do esforço de concepção de um modelo analítico aperfeiçoado, agregando a
contribuição de Lawrence e Suddaby (2006) ao modelo de Mahoney e Thelen (2010), foi a
aproximação mais fidedigna de como a realidade se apresenta nesta dinâmica e, dessa forma,
poder responder como ocorrem os processos e os mecanismos de mudança institucional
(MAHONEY; THELEN, 2010) na institucionalização – criação, manutenção ou
desmembramento (LAWRENCE; SUDDABY, 2006) – de, por exemplo, um dado setor, área,
agência ou empresa pública? As respostas a essas perguntas trarão contribuição às teorias de
mudança institucional, e especificamente, ao papel desempenhado por atores, por meio de
processos e mecanismos utilizados, por estes, na criação, manutenção e desmembramento de
instituições. Assim, propõe-se essa inserção em consequência das limitações que o modelo de
Mahoney & Thelen (2010) apresenta e debatidas anteriormente.
4. Possíveis Proposições a Partir do Modelo Analítico Proposto
É possível um exercício de possíveis proposições a partir do modelo analítico proposto,
e através da afinidade entre tipos particulares de atores e formas de mudança descritos. Por
exemplo, agentes denominados insurgentes procuram um deslocamento rápido, mas poderão
concordar com uma ação gradual do mesmo. Para isso, podem lançar mão de táticas da ação
institucional designada como desmembramento de instituições, já que trabalham contra o
status quo, atacando diretamente e ameaçando destruí-lo. Se forem bem sucedidos, os arranjos
pré-existentes são substituídos inteiramente por novos.
Já agentes simbiontes procuram preservar o status quo institucional formalizado, através
da manutenção de instituições, mas poderão conduzir ações que resultariam em
desmembramento, já que podem executar atividades que acabam minando arranjos do status
quo, mesmo que dependam destes arranjos para sua própria sobrevivência, ou seja, quando a
mudança é via deslizamento. No entanto, estes mesmos agentes podem sobreviver em longo
prazo se o seu sistema “anfitrião” fornece um ambiente que absorva seus comportamentos
Formas de ação institucional dos agentes de mudança
(LAWRENCE e SUDDABY, 2006).
19
degenerativos sem entrar em colapso ou eliminá-los completamente, através de ações
institucionais típicas de manutenção de instituições.
Agentes denominados subversivos são, frequentemente, inovadores que procuram
transformar o status quo sem derrubar regras e as estruturas existentes, utilizando, para isso,
a ação institucional criação, para tanto. Eles podem atuar tanto através do deslocamento, mas
frequentemente trabalham a curto prazo através do tipo de mudança denominado acréscimo
em camadas. Neste segundo tipo de mudança, estes agentes trabalham – discretamente -
contra o status quo, mas sem jamais quebrarem as regras já instituídas.
Finalmente, com o tipo de mudança gradual denominado conversão, agentes de
mudança conhecidos oportunistas podem, lentamente, mudar instituições alterando a forma
como elas são aprovadas e realizadas na prática (embora as regras formais permaneçam as
mesmas). Para isso, podem praticar as táticas da ação institucional designada como
manutenção. Porém, como foi apontado no Quadro 3, estes agentes de mudança tem conduta
dúbia tanto em relação a preservação quanto a obediência das regras de uma dada instituição.
Desta forma, é aceitável também sugerir que estes agentes poderão atuar através tanto da ação
institucional denominada criação quanto o desmembramento de instituições.
Além destas proposições teóricas iniciais, o modelo analítico proposto pode ser
utilizado no estudo do setor público no Brasil a partir da análise das características do
contexto político e da instituição em questão, que irão conduzir, segundo os autores utilizados
na Figura 2, a um tipo de mudança institucional esperada. Por exemplo, pode-se refletir como
organizações públicas reagem à proposta de mudança institucional, quais os mecanismos
subjacentes e, especialmente, qual o papel dos atores (LAWRENCE; SUDDABY, 2006) neste
processo. As mudanças institucionais das políticas públicas ao longo do processo de
redemocratização política no país também são possíveis itens de uma futura agenda de
pesquisa. Outra investigação sugerida é a análise dos fatores que precipitam um processo de
mudança institucional na administração pública. Nesta dada situação, as perguntas iniciais
seriam: qual é a conduta dos agentes de mudança identificados no processo em questão? Esta
conduta levou a que tipo de mudança institucional? As proposições acima apresentadas,
podem de fato, serem confirmadas? Ou não?
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