Metodos de Fısica Teorica I
Capıtulo I
Integracao Complexa
Prof. Ricardo Luiz Viana
Departamento de Fısica
Universidade Federal do Parana
Curitiba - Parana
3 de agosto de 2015
1 Revisao de conceitos basicos
1.1 Numeros complexos
• Forma algebrica: z = x+ iy, com i =√−1
• x = Re{z}: parte real de z, y = Im{z}: parte imaginaria de z
• Complexo conjugado: z∗ = x− iy
x =z + z∗
2, y =
z − z∗
2i, (1)
• Forma trigonometrica: (r, θ) sao coordenadas polares no plano complexo
x = r cos θ, y = r sin θ (2)
r =√
x2 + y2, tan θ =y
x(3)
x = r(cos θ + i sin θ) (4)
Figura 1: Plano complexo.
1
y
x
v
u
wz
z
z
w = f(z )0
1w = f(z )
0 0
1 1
Figura 2: Transformacao no plano complexo.
• Modulo quadrado: |z| =√z∗z =
√
x2 + y2 = r
• Argumento: θ (nos intervalos [0, 2π) ou (−π, π])
• Relacao de Euler
eiθ = cos θ + i sin θ. (5)
• Forma exponencial:z = reiθ , z∗ = re−iθ, (6)
1.2 Funcoes analıticas
• Funcao como uma transformacao no plano complexo: z = x+ iy [Fig. 2]
w = f(z) = u+ iv, u = u(x, y), v = v(x, y) (7)
• Funcao analıtica: f(z) e analıtica em z = a se f(z) for diferenciavel emz = a e em alguma vizinhanca de z = a no plano complexo.
• Condicoes de Cauchy-Riemann: condicoes necessarias e suficientes paraque f(z) = u+ iv seja analıtica [1, 2]
∂u
∂x=∂v
∂y,
∂u
∂y= −∂v
∂x, (8)
• Uma funcao e inteira se ela for analıtica em todo o plano complexo.
• Singularidade: se a derivada f ′(z) nao existe em z = a devido a existenciade uma singularidade, ou seja, se limz→a f(z) = ∞, entao f(z) nao eanalıtica nesse ponto
1.3 Algumas funcoes importantes
1.3.1 Raiz quadrada
E a funcao w = f(z) =√z, tal que
w = f(z) =√z, w =
√reiθ/2. (9)
2
y v wz
x u
z
w
w1
2
Figura 3: Imagens do ponto z = i pelo ramo principal da funcao raiz quadrada.
y v wz
x u
w1
w2
z
z
1
2
Figura 4: Imagens de dois pontos proximos ao corte de ramo da funcao raizquadrada.
Se fizermos θ → θ + 2π, embora o numero complexo z nao mude, mas o valorde f(z) sera outro:
w =√rei(
θ
2+π) =
√reiθ/2e−iπ = −
√reiθ/2.
Ex.: se θ = π/2 e r = 1, z = eiπ/2 = cos π2 + i sin π2 , cuja raiz quadrada
corresponde aos seguintes valores [Fig. 3]:
w1 = eiθ/2 = eiπ/4 = cosπ
4+ i sin
π
4=
1 + i√2,
w2 = ei(θ/2+π) = ei5π/4 = cos5π
4+ i sin
5π
4= −1 + i√
2,
Logo, a funcao√z e plurıvoca (cada ponto tem multiplas imagens): em geral
w =√z =
√rei(
θ
2+nπ
2 ) (10)
onde n = 0, 1, . . . definem os ramos da funcao. O caso n = 0 corresponde aochamado ramo principal.
Se convencionarmos que −π < θ ≤ π, entao o semi-eixo real negativo (Rez <0) e um corte de ramo para a funcao
√z. O ramo principal
√reiθ/2 nao e uma
funcao contınua no semi-eixo real negativo, por isso√z nao e analıtica no corte
de ramo. z = 0 e o ponto de ramificacao (de onde parte o corte de ramo).Ex.: vamos considerar o ramo principal para r = 1: f(z) = eiθ/2 e dois
pontos muito proximos mas separados pelo corte de ramo: z1 = ei(π−ε) e z2 =
3
ei(−π+ε). Se ε tende a zero, os dois pontos coincidem. No entanto, suas imagenspela funcao sao distantes, pois [Fig. 4]
w1 = f(z1) = ei(π/2−ε), w2 = f(z2) = ei(−π/2+ε),
De fato, se ε→ 0 entao w1 = +i e w2 = −i.
1.3.2 Raiz n-esima
Generalizando a definicao anterior, a raiz n-esima de um numero complexo z,onde n e um inteiro positivo, e definida como a funcao plurıvoca:
w = z1/n = r1/nei(θ
n+n 2kπ
n ) = r1/n[
cos
(θ + 2kπ
n
)
+ i sin
(θ + 2kπ
n
)]
,
(11)onde k = 0, 1, . . . n−1. A escolha z = 0 fornece o ramo principal da funcao, quetem cortes de ramo na forma de semi-retas partindo da origem nos angulos 0,2π/n, 4π/n, etc. Por exemplo, os cortes de ramo da raiz cubica sao semi-retasem 0, 2π/3 e 4π/3.
1.3.3 Funcao Argumento
O argumento de um numero complexo,
θ = arctan(y
x
)
, (12)
tambem e uma funcao plurıvoca, pois ha infinitos valores dos angulos que cor-respondem ao mesmo ponto do plano complexo. Definimos o ramo principal doargumento Arg(z) = θ tal que −π < Arg(z) ≤ π, de modo que este seja umafuncao unıvoca. De modo geral temos
arg(z) = Arg(z) + 2nπ, (n = 0,±1,±2, . . .), (13)
onde n = 0 corresponde ao ramo principal. E costume usarmos a letra minusculapara designar a funcao plurıvoca e a letra maiuscula para seu ramo principal.
1.3.4 Funcao Exponencial
Definida como
exp(z) = ex+iy = ex(cos y + i sin y). (14)
A funcao exponencial nao tem singularidades nem cortes de ramo, portanto elae inteira (analıtica em todo o plano complexo). No entanto, devido a presencade senos e cossenos, ela e uma funcao periodica, com perıodo 2πi:
exp(z + 2πni) = exp(z), (n = 0,±1,±2, . . .) (15)
Podemos definir funcoes trigonometricas de variaveis complexas da seguinteforma
sin z =eiz − e−iz
2i, cos z =
eiz + e−iz
2, (16)
4
y v wz
x u
z
z
1
2
w1
w2
π
−π
Figura 5: Imagens de dois pontos proximos ao corte de ramo da funcao raizlogarıtmica.
e que tambem sao funcoes inteiras e periodicas (com perıodo 2π). As funcoeshiperbolicas sao definidas como
sinh z =ez − e−z
2, cosh z =
ez + e−z
2, (17)
tais que sin z = −i sinh(iz) e cos z = cosh(iz).
1.3.5 Funcao Logarıtmica
O logaritmo neperiano (base e, esqueca a base 10!) de uma variavel complexa edefinido como
w = log(z) se exp(w) = z. (18)
Escrevendo z = |z|ei arg(z) temos que
w = log(z) = u+ iv ⇒ eu+iv = eueiv = |z|ei arg(z), (19)
donde u = ln |z| e v = arg(z), ou seja
log(z) = ln |z|+ i arg(z), (20)
Mas o argumento e uma funcao plurıvoca, entao o logaritmo tambem o sera.Usando (13) temos
log(z) = ln |z|+ iArg(z) + 2πni, (n = 0,±1,±2, . . .), (21)
onde o ramo principal corresponde a n = 0 (designado com letra maiuscula):
Log(z) = ln |z|+ iArg(z) = ln r + iθ. (22)
Se definirmos o ramo principal do argumento como −π < Arg(z) ≤ π entao ocorte de ramo da funcao Log(z) sera o semi-eixo real negativo. De fato, tomandodois pontos proximos em lados opostos dele: z1 = ei(π−ε) e z2 = e−i(π−ε), suasimagens pelo ramo principal do logaritmo serao [Fig. 5]
w1 = Log(z1) = i(π − ε), w2 = Log(z2) = −i(π − ε) = i(−π + ε)
5
Entretanto essa definicao e arbitraria. Se definıssemos um outro ramo principaldo argumento como 0 ≤ Arg0(z) < 2π, entao o ramo principal do logaritmo aele correspondente seria
Log0(z) = ln |z|+ iArg0(z)
que tem um corte de ramo no semi-eixo real positivo. Dessa forma, podemoscolocar o corte de ramo onde for da nossa conveniencia, tal que a funcao sejaunıvoca na regiao do plano complexo que seja de interesse para nos.
1.3.6 Funcao Potencia generica
Se o expoente α for um numero complexo, a funcao potencia generica sera
w = zα = elog zα
= eα log z = eα ln |z|+iα arg(z), (23)
e que tambem e uma funcao plurıvoca, assim como o argumento e o logaritmo:
zα = eα ln |z|+iαArg(z)+iα2πn = eαLog(z)eiα2πn, (n = 0,±1,±2, . . .) (24)
O ramo principal da funcao potencia generica sera dado pelo caso n = 0:
eαLog(z)
Como a funcao exponencial e inteira, o ramo principal de zα sera uma funcaoanalıtica no mesmo domınio em que Log(z) o for. Logo, cada ramo da funcaologarıtmica corresponde a um ramo da potencia generica. Adotando como cortede ramo do logaritmo o semi-eixo real positivo, este tambem o sera para apotencia. Esse fato sera utilizado mais tarde no calculo de integrais.
Ex.: ii = ei log(i) = ei(Log(i)+i2πn) = ei(iπ/2+i2πn) = e−π/2e−2πn (e umnumero real!), com n = 0,±1,±2, . . ..
2 Integrais no plano complexo
Seja a funcaow = f(z) = u(x, y) + iv(x, y).
A integral de f(z) entre os pontos z1 = x1 + iy1 e z2 = x2 + iy2 do planocomplexo depende, em geral, do caminho C de integracao escolhido. Comodz = dx+ idy teremos
∫ z2
z1
f(z)dz =
∫ z2
z1
(u+ iv)(dx+ idy)
=
∫ (x2,y2)
(x1,y1)
[udx− vdy] + i
∫ (x2,y2)
(x1,y1)
[vdx+ udy]
Ex.: Calcular∮
Cdzz−a , onde C e um cırculo de raio R com centro no ponto
z = a [Fig. 6] Um ponto sobre C e descrito por z = a+Reiθ, onde 0 ≤ θ < 2πse o cırculo for percorrido no sentido anti-horario. Entao dz = Rieiθdθ e
∮
C
dz
z − a=
∫ 2π
0
Rieiθdθ
Reiθ= i
∫ 2π
0
dθ = 2πi
Se o cırculo fosse percorrido no sentido anti-horario, entao 2π < θ ≤ 0, logo aintegral iria trocar de sinal.
6
x
y z
θR
z
a
C
Figura 6: Contorno circular.
2.1 Teoremas importantes
2.1.1 Teorema ML
Seja C um caminho no plano complexo. Entao
∣∣∣∣
∫
C
f(z)dz
∣∣∣∣≤ML, (25)
onde M e o valor maximo de f(z) ao longo de C, e L e o comprimento de C.Prova: descreveremos a curva C no plano complexo usando as seguintes
equacoes parametricasx = φ(t), y = ψ(t),
onde a ≤ t ≤ b e um parametro, do qual φ, ψ sao funcoes contınuas. Logo
dz = dx+ idy = φ′(t)dt+ ψ′(t)dt,
donde|dz|2 = (dx)
2+ (dy)
2=
[
(φ′)2+ (ψ′)
2]
(dt)2.
Portanto, o comprimento do segmento da curva C entre os pontos z0 e z1 e dadopor
L =
∫ z1
z0
|dz| =∫ b
a
√
(φ′)2 + (ψ′)2dt.
Seja, entao, a integral
I =
∫
C
f(z)dz =
∫ b
a
f(φ+ iψ)(φ′ + iψ′)dt.
Usando a propriedade geral∣∣∣∣∣
∫ b
a
f(t)dt
∣∣∣∣∣≤
∫ b
a
|f(t)|dt,
temos que
|I| ≤∫
C
|f(z)||dz|.
7
y
x
Cz
R
θ
R R
z
Figura 7: Contorno semi-circular.
Chamando de M o valor maximo do modulo da funcao ao longo da curva C,entao |f(z)| ≤M , donde
|I| ≤M
∫
C
|dz| =ML,
como querıamos demonstrar.Ex.: seja C o semi-cırculo de raio R com centro na origem [Fig. 7]. Entao
∣∣∣∣
∫
C
dz
z2 + 4
∣∣∣∣≤ πR
R2 + 4
2.1.2 Teorema de Cauchy-Goursat
Se f(z) e analıtica e as suas derivadas parciais sao contınuas numa regiao sim-plesmente conexa R 1 entao, para todo o caminho fechado C contido em Rtemos que
∮
C
f(z)dz = 0. (26)
Prova: Para demonstrar este teorema, escrevemos z = x+iy e f(z) = u+iv,de modo que
∮
C
f(z)dz =
∮
C
(udx− vdy) + i
∮
C
(vdx+ udy).
Usando o teorema de Green no plano (visto no curso de calculo vetorial)
∮
C
(udx− vdy) = −∫
dx
∫
dy
(∂v
∂x+∂u
∂y
)
,
∮
C
(vdx + udy) = −∫
dx
∫
dy
(∂u
∂x− ∂v
∂y
)
,
teremos
∮
C
f(z)dz = −∫
dx
∫
dy
(∂v
∂x+∂u
∂y
)
︸ ︷︷ ︸=0
+i
(∂u
∂x− ∂v
∂y
)
︸ ︷︷ ︸=0
= 0,
1ou seja, nao existem “buracos” na regiao R
8
Figura 8: Contorno semi-circular.
onde usamos as condicoes de Cauchy-Riemann (8), ja que f(z) e analıtica porhipotese do teorema, como querıamos demonstrar.
Ex.: Se o ponto z = a for exterior a curva C, entao∮
Cdzz−a = 0, pois a
funcao f(z) = 1z−a e analıtica para todos os pontos de C e no interior de C.
Caso z = a esteja sobre a curva C ou em seu interior o teorema nao se aplica.
2.1.3 Formula Integral de Cauchy
Se f(z) e analıtica em todos os pontos de um caminho fechado C bem como daregiao interior a C, e se z0 e um ponto dessa regiao, entao
1
2πi
∮
C
f(z)
z − z0dz = f(z0). (27)
Obs.: se z = z0 estiver fora da regiao limitada por C, entao o teorema deCauchy-Goursat se aplica e
∮
C
f(z)
z − adz = 0
Para demonstrar esta expressao, vamos considerar o caminho fechado C =C0∪Cǫ, onde C0 e um caminho que circunda o ponto z0 e Cǫ e um cırculo de raio ǫcentrado em z0 [Fig. 8]. O canal com os segmentos retos e infinitamente estreito,de tal modo que as contribuicoes nos dois sentidos de percurso cancelam-semutuamente. Temos, assim,
∮
C
f(z)
z − z0dz =
∮
C0
f(z)
z − z0dz
︸ ︷︷ ︸=0
+
∮
Cǫ
f(z)
z − z0dz, (28)
onde a integral em C0 anula-se devido ao teorema de Cauchy-Goursat, ja que asingularidade em z0 esta fora de C0.
Sobre o cırculo Cǫ escrevemos z = z0 + ǫeiθ, donde dz = ǫieiθdθ e, portanto,
∮
Cǫ
f(z)
z − z0dz =
∫ 2π
0
f(z0 + ǫeiθ)ǫieiθ
ǫeiθdθ = i
∫ 2π
0
f(z0 + ǫeiθ)dθ.
Substituindo em (28) e tomando o limite ǫ→ 0 e
∮
C
f(z)
z − z0dz = i
∫ 2π
0
f(z0)dθ = if(z0)2π,
como querıamos demonstrar.
9
x
y z
a
C
Figura 9: Contorno arbitrario.
Ex.: Calcular∮
Cdzz−a , onde C e um caminho fechado qualquer que envolve
o ponto z = a [Fig. 9]Comparando com (27) temos que f(z) = 1, donde f(a) = 1 e
∮
Cdzz−a = 2πi.
Esse resultado esta de acordo com o calculo explıcito feito anteriormente paraum caminho circular com centro em z = a.
2.1.4 Derivadas de funcoes analıticas
Fazendo as mudancas de variaveis z → ζ e a→ z reescrevemos a formula integralde Cauchy como
1
2πi
∮
C
f(ζ)
ζ − zdζ = f(z). (29)
Se C e fixo
d
dz
∮
C
f(ζ)
ζ − zdζ =
∮
C
d
dz
[f(ζ)
ζ − z
]
dζ =
∮
C
f(ζ)
(ζ − z)2 dζ,
entao, derivando (29), temos
df
dz=
1
2πi
∮
C
f(ζ)dζ
(ζ − z)2 , (30)
que pode ser generalizada para a derivada n-esima:
dnf
dzn=
n!
2πi
∮
C
f(ζ)dζ
(ζ − z)n+1 . (31)
10
2.2 Series de Taylor e de Laurent
2.2.1 Series infinitas
Algumas series de potencias bem conhecidas do calculo (McLaurin) sao muitouteis:
ez =
∞∑
n=0
zn
n!= 1 + z +
1
2!z2 +
1
3!z3 + . . . , (32)
sin z =
∞∑
n=1
(−1)n−1 z2n−1
(2n− 1)!= z − 1
3!z3 +
1
5!z5 + . . . , (33)
cos z =
∞∑
n=1
(−1)n−1 z2n−2
(2n− 2)!= 1− 1
2!z2 +
1
4!z4 + . . . , (34)
log(1 + z) =
∞∑
n=1
(−1)n−1 z
n
n= z − 1
2z2 +
1
3z3 + . . . , (35)
No ultimo caso, como a funcao logarıtmo e plurıvoca, subentende-se que aexpansao refere-se ao seu ramo principal. Finalmente, temos a expansao dobinomio de Newton
(1 + z)p=
∑
n=1
p(p− 1) . . . (p− n+ 1)
n!zn = 1+pz+
p(p− 1)
2!z2+
p(p− 1)(p− 2)
3!z3+. . . .
(36)Seja 0 < |z| < 1, entao a serie geometrica complexa
1
1− z= 1 + z + z2 + z3 + . . . =
∞∑
n=0
zn (37)
e uniformemente convergente, ou seja, pode ser diferenciada e integrada termo-a-termo.
2.2.2 Serie de Taylor
Se f(z) e analıtica no ponto z = a, entao existe uma regiao (vizinhanca) Rcentrada em z = a, tal que podemos encontrar um caminho circular C, intei-ramente contido em R, para o qual aplica-se a formula integral de Cauchy naforma (29) [Fig. 10]
f(z) =1
2πi
∮
C
f(ζ)
ζ − zdζ. (38)
Escrevemos
1
ζ − z=
1
z − a
1(ζ−a+a−zζ−a
) =1
z − a
1
1−(z−aζ−a
)
Da figura 10, |z − a| < |ζ − a|, de modo que a razao |(z − a)/(ζ − a)| < 1 epodemos usar a serie geometrica complexa (37):
1
1−(z−aζ−a
) =
∞∑
n=0
(z − a
ζ − a
)n
,
11
x
a
z
y
C
Rζ
Figura 10: Vizinhanca de um ponto z = a.
x
a
y
C
R
R
1
2
R
Figura 11: Vizinhanca de um ponto z = a.
que, substituida em (38),
f(z) =1
2πi
∞∑
n=0
(z − a)n∮
C
f(ζ)dζ
(ζ − a)n+1 .
Usando (31), a integral acima reduz-se a n-esima derivada da funcao f , o queleva a serie de Taylor de f(z) em torno do ponto z = a:
f(z) =∞∑
n=0
1
n!
dnf
dzn
∣∣∣∣z=a
(z − a)n. (39)
2.2.3 Serie de Laurent
Ela aparece quando a funcao f(z) nao e analıtica em z = a, mas o seja numanel de raio interno R1 e raio externo R2 [Fig. 11]. Nesse caso e possıvel aindadesenvolver f(z) em serie de potencias de (z − a), dita “serie de Laurent”, mas
12
agora poderemos ter tanto potencias positivas como negativas:
f(z) =
∞∑
n=−∞cn(z − a)
n, (40)
onde os coeficientes sao dados por
cn =1
2πi
∮
C
f(ζ)dζ
(ζ − a)n+1 , (41)
e C e um caminho fechado pertencente a regiao anular R.Podemos dividir a serie de Laurent em duas partes:
• Parte regular: compreende os termos de (40) com expoentes positivos.No entanto cn nao e igual a (1/n!)(df/dzn)z=0 como na serie de Taylorporque f(z) nao e diferenciavel em z = a;
• Parte principal: formada pelos termos com expoentes negativos.
Ex.: f(z) = e2z
(z−1)3e singular em z = 1. Fazendo a transformacao u = z − 1
jogamos a singularidade para a origem u = 0, e podemos usar a serie (32) paraescrever
f(u) =e2(1+u)
u3=e2
u3
∞∑
n=0
(2u)n
n!=
=e2
u3+
2e2
u2+
4e2
2u+
8e2
6+
16e2u
24+
32e2u2
120+ . . . ,
Voltando a variavel original:
f(z) =e2
(z − 1)3 +
2e2
(z − 1)2 +
2e2
z − 1︸ ︷︷ ︸
parte principal
+4e2
3+
2e2(z − 1)
3+
4e2(z − 1)2
15+ . . .
︸ ︷︷ ︸
parte regular
.
(42)
2.3 Polos e Resıduos
2.3.1 Classificacao das singularidades
Se f(z) for analıtica na vizinhanca do ponto z = a, com excecao do proprioponto, entao z = a e uma singularidade isolada de f(z).
Ex.: A funcao f(z) = sin(1z
)tem uma singularidade nao-isolada em z = 0
pois nao existe uma vizinhanca de z = 0 onde f(z) seja analıtica, o que podeser visualizado no grafico da funcao real sin(1/x) [Fig. 12]. As singularidadesisoladas sao classificadas como
• Singularidades Removıveis: elas desaparecem quando se toma o limiteapropriado. Por exemplo, a funcao f(z) = sin z
z tem uma singularidaderemovıvel em z = 0 pois
limz→0
sin z
z= 1
13
Figura 12: Grafico da funcao f(x) = sin(1/x).
• Polos: sao tais que podemos desenvolver f(z) na vizinhanca de z = a emserie de Laurent com parte principal finita. A ordem m do polo e o maiorexpoente negativo da serie. Um polo de ordem m = 1 e chamado polo
simples, se m = 2 de polo duplo, etc. Ex.: f(z) = e2z
(z−1)3tem um polo de
ordem m = 3 no ponto z = 1, pois este e o maior expoente negativo daparte principal da respectiva serie de Laurent, como vimos em (42).
• Singularidades Essenciais: quando a parte principal da serie de Laurentfor infinita. Ex.: f(z) = e1/z tem uma singularidade essencial em z = 0.Usando (32) expandimos em torno de z = 0:
e1/z = 1︸︷︷︸
parte regular
+1
z+
1
2!
1
z2+
1
3!
1
z3+ . . .
︸ ︷︷ ︸
parte principal
Uma forma pratica de determinar a ordem m de um polo e determinando omenor valor do expoente n tal que exista 2 o seguinte limite
limz→a
(z − a)nf(z), (n = 1, 2, . . .). (43)
Ex.: Na funcao f(z) = e2z
(z−1)3o ponto z = 1 e um polo de ordem m = 3 porque
limz→1
(z − 1)1f(z) = lim
z→1
e2z
(z − 1)2 = ∞,
limz→1
(z − 1)2f(z) = lim
z→1
e2z
(z − 1)= ∞,
limz→1
(z − 1)3f(z) = lim
z→1e2z = e2 <∞.
2.3.2 Resıduos
Seja f(z) analıtica numa vizinhanca de z = a. O resıduo de f(z) no ponto z = ae definido como
Res{f(z = a)} =1
2πi
∮
C
f(z)dz, (44)
onde C e um caminho fechado envolvendo z = a. Observe que, se f(z) fosseanalıtica tambem no ponto z = a entao o resıduo seria nulo, pois
∮
Cf(z)dz = 0
pelo teorema de Cauchy-Goursat.
2ou seja, que o limite nao seja infinito
14
Desenvolvendo f(z) em serie de Laurent (40) em torno de z = a entao oresıduo no ponto z = a e igual ao coeficiente do termo da serie com expoenten = −1 ja que, de (41), temos que
Res{f(z = a)} =1
2πi
∮
C
f(z)dz
(z − a)0 = c−1. (45)
Ha alguns metodos praticos para o calculo de resıduos, a saber:
• Se z = a e um polo simples (de ordem m = 1) o resıduo de f(z) nesseponto e
Res{f(a)} = limz→a
(z − a)f(z). (46)
Ex.: f(z) = zz−1 tem um polo simples em z = 1.
Res{f(z = 1)} = limz→1
(z − 1)z
z − 1= 1.
• Se z = a for um polo de ordem m
Res{f(a)} =1
(m− 1)!limz→a
dm−1
dzm−1[(z − a)
mf(z)] . (47)
Ex.: f(z) = ez
z4 tem um polo de ordem m = 4 em z = 0.
Res{f(z = 0)} =1
3!limz→0
{d3
dz3
(
z4ez
z4
)}
=1
6limz→0
ez =1
6.
• Se z = a e uma singularidade de f(z) = ϕ(z)ψ(z) , com ϕ(a) 6= 0, ψ(a) = 0 e
ψ′(a) 6= 0 (ou seja, ψ(z) tem um zero simples em z = a), entao:
Res{f(a)} =ϕ(a)
ψ′(a). (48)
Ex.: f(z) = ez
sin z tem uma singularidade em z = 0. Como ϕ(z) = ez eψ(z) = sin z tem um zero simples em z = 0, ja que ψ′(0) = cos 0 = 1 6= 0,
entao Res{f(z = 0)} = ϕ(0)ψ′(0) = 1.
2.3.3 Teorema dos resıduos
Se f(z) for analıtica na regiao envolvida por C e sobre C, exceto por um numerofinito de singularidades isoladas nos pontos z = z1, z2, . . . zn no interior de C[Fig. 13], entao
∮
C
f(z)dz = 2πi
n∑
k+1
Res{f(zk)}. (49)
Prova: Consideremos inicialmente uma unica singularidade isolada z0. Po-demos expandir f(z) em torno de z0 em serie de Laurent:
f(z) =
∞∑
n=−∞cn(z − z0)
n.
15
Figura 13: Singularidades isoladas dentro de um caminho fechado.
Integrando termo-a-termo esta expansao ao longo de um contorno fechado Cque envolve z0:
∮
C
f(z)dz =
∞∑
n=−∞cn
∮
(z − z0)ndz =
=
−2∑
n=−∞cn
∮
(z − z0)ndz
︸ ︷︷ ︸=0
+c−1
∮
C
dz
z − z0+
∞∑
n=0
cn
∮
(z − z0)ndz
︸ ︷︷ ︸=0
onde nos usamos o teorema de Cauchy-Goursat para anular as integrais dafuncao analıtica (z − z0)
n. Como c−1 e o resıduo de f(z) no ponto z0 temos que
∮
C
f(z)dz = Res{f(z0)}∮
C
dz
z − z0= Res{f(z0)}2πi, (50)
onde usamos a formula integral de Cauchy (27).Vamos, agora, considerar o caso de haver varias singularidades isoladas
z1, z2, . . . dentro de C. Podemos deformar C de modo a envolver cada umadelas, usando canais infinitamente estreitos [Fig. 13]. Como o caminho defor-mado nao envolve mais nenhuma singularidade o teorema de Cauchy-Goursatnos diz que
∮
C
f(x)dz +
∮
C1
f(z)dz
︸ ︷︷ ︸
=−2πiRes{f(z1)}
+
∮
C2
f(z)dz
︸ ︷︷ ︸
=−2πiRes{f(z2)}
+
∮
C3
f(z)dz
︸ ︷︷ ︸
=−2πiRes{f(z3)}
+ . . . = 0,
onde usamos (50), os sinais negativos aparecendo pois os percursos sao feitos nosentido horario. Teremos, portanto, que
∮
C
f(x)dz = 2πi (Res{f(z1)} +Res{f(z2)}+Res{f(z3)}+ . . .) ,
como querıamos demonstrar.Exemplo: Seja a integral
∮
C
ezdz
(z − 1)(z + 3)2 ,
16
onde C e o cırculo de raio 10 e centro na origem, cuja equacao e |z| = 10. Assingularidades do integrando
f(z) =ez
(z − 1)(z + 3)2
sao z1 = 0, que e um polo simples (e esta dentro de C), e z2 = −3, que e um poloduplo (e tambem no interior de C). Calculando os resıduos correspondentes:
Res{f(z1)} = limz→1
(z − 1)f(z)
= limz→1
(z − 1)ez
(z − 1)(z + 3)2 =
e
16,
Res{f(z2)} = limz→−3
1
1!
d
dz
{
(z + 3)2f(z)}
= limz→−3
d
dz
{ez
z − 1,
}
= limz→−3
{
ez
z − 1− ez
(z − 1)2
}
= − 5
16e−3.
Logo, pelo teorema dos resıduos,∮
C
f(z)dz = 2πi [Res{f(z1)}+Res{f(z2)}] =πi
8
(e− 5e−3
)≈ −10, 16i.
3 Integracao por resıduos
3.1 Integrais de funcoes trigonometricas
Vamos considerar integrais da forma∫ 2π
0F (cos θ, sin θ)dθ, onde F e uma funcao
racional. Fazendo z = eiθ onde C e o cırculo unitario (de raio R = 1 e centrona origem), com 0 ≤ θ < 2π. Como dz = ieiθdθ = izdθ entao dθ = dz/iz. Alemdisso
cos θ =eiθ + e−iθ
2=
1
2
(
z +1
z
)
, sin θ =eiθ − e−iθ
2i=
1
2i
(
z − 1
z
)
, (51)
Ex.: I =∫ 2π
0dθ
3+cos θ
I =
∮
C
dz/iz
3 + 12
(z + 1
z
) =2
i
∮
C
dz
z2 + 6z + 1
Singularidades do integrando: z2+6z+1 = 0, ou seja, z1 = −3+2√2 ≈ −0, 17
(dentro de C) e z2 = −3 − 2√2 ≈ −5, 83 (fora de C) [veja a Fig. 14]. Ambos
sao polos simples:
f(z) =1
z2 + 6z + 1=
1
(z − z1)(z − z2)
Pelo teorema dos resıduos so entra o polo dentro de C:
I =2
i(2πi)Resf(z1) = 4π lim
z→z1
{
(z − z1)1
(z − z1)(z − z2)
}
=4π
z1 − z2=
π√2.
17
−1 1
i
−i
z1z
2
C
y
x
Figura 14: Singularidades do integrando.
R x
y
CR
−R
z
z
z
z
1
2
3
4
Figura 15: Caminho fechado e singularidades no eixo imaginario.
3.2 Integrais da forma∫ +∞
−∞
P (x)Q(x)
dx
Neste caso P (x) e Q(x) sao polinomios tais que Q(x) nao tem zeros reais e ograu de Q(x) e o grau de P (x) mais duas unidades (no mınimo). Escrevemos
∫ +∞
−∞
P (x)
Q(x)dx = lim
R→∞
∫ R
−R
P (x)
Q(x)dx
e consideramos a integral da funcao complexa f(z) = P (z)Q(z) ao longo do caminho
fechado C = [−R,R] ∪ CR onde CR e um semi-cırculo de raio R no semi-planosuperior (Imz > 0) [Fig. 15]. Por hipotese, as singularidades de f(z) saoimaginarios puros {z1, z2, . . .}, de modo que C so envolve aqueles polos comparte imaginaria positiva. Temos
∮
C
f(z)dz =
∫ R
−Rf(x)dx +
∫
CR
f(z)dz (52)
cujo lado esquerdo pode ser obtido pelo teorema dos resıduos. Ja a integral nosemicırculo nao precisa ser calculada, mas podemos estimar seu valor maximoatraves do teorema ML pois fazemos o limite quando R tende a infinito, demodo que a integral deve anular-se. A integral em dx, no limite R → ∞, e oresultado desejado.
Ex.: Calcular
I =
∫ +∞
−∞
dx
x2 + a2= limR→∞
∫ R
−R
dx
x2 + a2.
18
Consideramos a integral∫
Cdz
z2+a2 . As singularidades do integrando, z2+a2 = 0,sao polos simples em z1 = ia e z2 = −ia
f(z) =1
z2 + a2=
1
(z + ia)(z − ia).
Usando o teorema ML a integral no semi-cırculo e∣∣∣∣
∫
CR
f(z)dz
∣∣∣∣≤ πR
R2 + a2→ ∞
∞ , quando R → ∞
Usando a regra de L’Hospital para levantar a indeterminacao
limR→∞
∣∣∣∣
∫
CR
f(z)dz
∣∣∣∣≤ limR→∞
π
2R= 0.
Logo, usando o teorema dos resıduos (49) em (52)
I = 0 + 2πiRes{f(z = ia)} = 2πi limz→ia
{
(z − ia)1
(z + ia)(z − ia)
}
=π
a.
3.3 Integrais da forma∫ +∞
−∞
{cosmx
sinmx
}P (x)Q(x)
dx
Neste caso consideramos a funcao complexa
f(z) = eimzP (z)
Q(z)
e empregamos o mesmo contorno fechado do caso anterior. Para avaliar a inte-gral no semi-cırculo usamos o
Lema de Jordan: seja m > 0 e F (z) uma funcao analıtica no semi-planosuperior (Imz > 0), exceto por um numero finito de singularidades isoladas, etal que lim|z|→∞ F (z) = 0. Entao, sendo CR o semi-cırculo de raio R e centrona origem, fechando “por cima” (semi-plano superior):
limR→∞
∫
CR,⇑eimzF (z)dz = 0. (53)
Se o expoente for negativo, porem, o mesmo resultado vale, desde que o semi-cırculo feche “por baixo” (semi-plano inferior), ou seja
limR→∞
∫
CR,⇓e−imzF (z)dz = 0. (54)
Prova: Considerando a integral
I =
∫
CR
f(z)eiazdz,
onde a > 0 e lim|z|→∞ f(z) = 0. Ao longo do semi-cırculo CR temos z = Reiθ
e dz = Rieiθdθ, tal que
I =
∫ π
0
f(Reiθ)eiaReiθ
Rieiθdθ = iR
∫ π
0
f(Reiθ)eiaR(cos θ+i sin θ)eiθdθ.
19
Figura 16: Singularidades do integrando.
Pelo teorema ML |I| ≤ ML = πRM , onde |f(z)eiaz| ≤ M , desde que z ∈ CR.Agora seja R tao grande que exista um ε tal que |f(z)| < ε. Nesse caso
|f(z)eiaz| ≤ |f(z)|︸ ︷︷ ︸<ε
∣∣eiaR cos θ
∣∣
︸ ︷︷ ︸=1
∣∣ieiθ
∣∣
︸ ︷︷ ︸=1
∫ π
0
e−aR sin θdθ
|I| ≤ Rε
∫ π
0
e−aR sin θdθ = 2Rε
∫ π/2
0
eaR sin θdθ
≤ 2Rε
∫ π/2
0
eaR2θ/πdθ =επ
a
(1− e−aR
),
onde usamos o fato de que, se 0 ≤ θ ≤ π/2, temos que [vide Fig. 16]:
2θ
π≤ sin θ ⇒ e−aR sin θ ≤ e−aR2θ/π.
Como, por hipotese, limR→∞ f(z) = 0 e |f(z)| < ε, entao tomar o limiteR → ∞ implica em ε→ 0. Como a > 0, teremos entao que
limR→∞
|I| = 0,
como querıamos demonstrar. Se a < 0 o lema de Jordan continua valido, desdeque o semicırculo CR esteja no semi-plano inferior.
Ex.: Calcular I =∫∞0
cos xdxx2+a2 . Como o integrando e uma funcao par de x
I =1
2
∫ +∞
−∞
cosxdx
x2 + a2=
1
2limR→∞
∫ R
−R
cosxdx
x2 + a2
Consideramos a seguinte integral complexa
∮
C
eizdz
z2 + a2.
As singularidades do integrando sao: z1 = ia e z2 = −ia
f(z) =eiz
z2 + a2=
eiz
(z + ia)(z − ia)
20
Figura 17: Caminho fechado e singularidades no eixo real.
Como m = 1 > 0 e
limR→∞
1
z2 + a2= limR→∞
1
R2 + a2= 0,
o lema de Jordan (53) se aplica, e a integral no semi-cırculo anula-se quandoR → ∞. Usando o teorema dos resıduos (49) em (52)
2I = 0 + 2πiRes{f(z = ia)} = 2πi limz→ia
(z − ia)eiz
(z + ia)(z − ia)=πe−a
a,
ou seja, I = πe−a/2a. Observe que, se o resultado fosse complexo, seria ne-cessario tirar a parte real (pois cosx = Re{z}).
3.4 O integrando tem polos sobre o eixo real
Para aplicar o teorema dos resıduos, temos que contornar os polos sobre o eixoreal (ja que, sem isso, o integrando nao e uma funcao analıtica sobre o contornoC). Fazemos isso usando semi-cırculos de raio ε. Tomamos os limites R→ ∞ eε→ 0, de modo a obter o chamado valor principal de Cauchy da integral:
P∫ +∞
−∞f(x)dx = lim
R→∞limε→0
{∫ a−ε
−Rf(x)dx +
∫ R
a+ε
f(x)dx
}
, (55)
onde f(x) tem um polo em x = a. O restante do calculo repete os procedimentosanteriores.
Exemplo: a integral abaixo e divergente:
∫ 2
−1
dx
x=
∫ 0
−1
dx
x+
∫ 2
0
dx
x= ln |x||0−1 − ln |x||20 = ∞,
mas o seu valor principal de Cauchy e finito:
P∫ 2
−1
dx
x= lim
ε→0
{∫ −ε
−1
dx
x+
∫ 2
ε
dx
x
}
= limε→0
(ln ε− ln 1 + ln 2− ln ε) = ln 2.
As integrais sobre estes semi-cırculos podem ser calculadas usando o
21
Lema dos contornos denteados: se f(z) tem polos simples nos pontosx1, . . . xn sobre o eixo real, e Cεi e um semi-cırculo de raio ε com centro em xie que o contorna por cima, entao [Fig. 17]
limε→0
∫
Cεi⇑f(z)dz = −iπRes{f(xi)}. (56)
Caso seja contornado por baixo, entao
limε→0
∫
Cεi⇓f(z)dz = +iπRes{f(xi)}. (57)
“Mostracao”: Vamos supor, por simplicidade, que haja dois polos sobre oeixo real: x1 e x2, e que o caminho contorne o primeiro por cima e o segundopor baixo. Podemos encarar a integral pelo caminho semi-circular Cε1 como ametade da integral correspondente sobre todo o cırculo C1 que envolve o poloem x1. Como este ultimo caminho e percorrido no sentido horario, a integral enegativa e vale, pelo teorema dos resıduos
∫
C1
f(z)dz = −2πiRes{f(x1)}.
No limite ε→ 0 teremos, portanto
limε→0
∫
Cε1⇑
f(z)dz =1
2
∫
C1
f(z)dz = −πiRes{f(x1)}.
Analogamente, a integral em Cε2 e a metade da integral sobre o cırculo C2
que envolve o polo em x2. Como o sentido de percurso agora e anti-horario, aintegral e positiva: ∫
C2
f(z)dz = 2πiRes{f(x2)}.
tal que
limε→0
∫
Cε2⇓
f(z)dz =1
2
∫
C2
f(z)dz = πiRes{f(x2)}.
Ex: Calcular I =∫ +∞−∞
sin xx dx
O ponto z = 0 e a unica singularidade do integrando f(z) = eiz
z , que con-tornamos por cima usando um semi-cırculo de raio ε. O contorno fechado seraC = [−R, ε] ∪ Cε ∪ [ε,R] ∪ CR, (vide figura 18).
∮
C
f(z)dz =
∫ −ε
−Rf(x)dx +
∫
Cε
f(z)dz +
∫ R
ε
f(x)dx+
∫
CR
f(z)dz. (58)
Usando o lema dos contornos denteados (56)
limε→0
∫
Cεi⇑f(z)dz = −iπRes{f(0)} = −iπ lim
z→0zf(z) = −iπ.
Como limR → ∞ 1|z| = limR → ∞ 1
R = 0 podemos usar o lema de Jordan para
obter
limR→∞
∫
CR
f(z)dz = 0.
22
Figura 18: Contorno que evita a origem.
Finalmente, pelo teorema dos resıduos∮f(z)dz = 0 pois nao ha singularidades
dentro de C. Entao (58) fornece
0 = −iπ + P∫ +∞
−∞f(x)dx,
ou seja
P∫ +∞
−∞
eix
xdx = P
∫ +∞
−∞
cosx
xdx+ iP
∫ +∞
−∞
sinx
xdx = iπ.
Igualando as partes real e imaginaria temos
I = π,
∫ +∞
−∞
cosx
xdx = 0,
onde o sımbolo P foi omitido, como e de costume.
3.5 O integrando tem cortes de ramo
Se o integrando tem cortes de ramo (como logaritmos e potencias genericas),estes devem ser adequadamente contornados. Convencionaremos que o cortede ramo e o semi-eixo real positivo, de modo que usamos o chamado contorno“buraco de fechadura”:
C = [ε,R] ∪ CR ∪ [R, ε] ∪ Cε,
onde CR e um cırculo de raio R com centro na origem (que e o ponto de rami-ficacao) e Cε e um cırculo de raio ε (vide figura 19). O integrando e diferenteem cima e em baixo do corte de ramo: para a parte superior (Imz > 0) usamoso ramo principal e para a parte inferior o primeiro ramo (Imz < 0) . No finaltomamos os limites R→ ∞ e ε→ 0.
Ex.: Calcular∫∞0
xαdxx2+
√2x+1
, onde 0 < α < 1.
I = limR→∞
limε→0
∫ R
ε
xαdx
x2 +√2x+ 1
O integrando e
f(z) =zα
z2 +√2z + 1
=eα log z
z2 +√2z + 1
=eα(Logz+i2nπ)
z2 +√2z + 1
=zαe2πni
z2 +√2z + 1
23
������
������
���������
���������
z
z
1
2
Figura 19: Contorno do tipo buraco de fechadura.
Usando o contorno “buraco de fechadura” temos que
∮
C
f(z)dz =
∫
CR
f(z)dz+
∫
Cε
f(z)dz+
∫ R
ε
dxxα
x2 +√2x+ 1
︸ ︷︷ ︸
ramo principal (n=0)
+
∫ ε
R
dxxαe2απi
x2 +√2x+ 1
︸ ︷︷ ︸
ramo com n=1
.
As singularidades do integrando sao dadas por z2 +√2z + 1 = 0, ou seja
z1 =
√2
2(−1 + i) = e3πi/4, z2 =
√2
2(−1− i) = e5πi/4,
e que estao dentro de C, logo pelo teorema dos resıduos,
∮
C
f(z)dz = 2πi [Res{f(z1)}+Res{f(z2)}] =2πi(zα1 − zα2 )
z1 − z2=
2π√2
(
e3πi/4 − e5πi/4)
.
Pelo teorema ML a integral no semi-cırculo CR se anula quando R tende aoinfinito pois, como α < 1, temos que
∣∣∣∣
∫
CR
f(z)dz
∣∣∣∣≤ Rα
R2 +√2R+ 1
(2πR) → 0 se R → ∞
onde, para levantar as indeterminacoes, tivemos de usar a regra de L’Hospitalduas vezes. Ja no semi-cırculo Cε temos que z = εeiθ, ou dz = εieiθdθ, donde
∫
Cε
f(z)dz = εi
∫ 2π
0
ei(1+α)θ
ε2 +√2εeiθ + 1
dθ → 0 se ε→ 0.
Combinando estes resultados e
2π√2
(
e3πi/4 − e5πi/4)
= I − e2απiI + 0 + 0,
donde um pouco de algebra nos leva ao resultado final
I = π√2sin(απ/4)
sin(απ).
24
4 Relacoes de Kramers-Kronig
4.1 Formulacao geral
Seja f(z) uma funcao analıtica no semi-plano superior e no eixo real, e tal quelim|z|→∞ |f(z)| = 0. Seja um ponto z0 pertencente ao eixo real, e a seguinteintegral
∮
C
f(z)
z − z0dz
onde C e um contorno denteado que desvia do polo em z0 por baixo num semi-circulo de raio ε e e fechado por cima num semi-cırculo de raio R, de modoque
∮
C
f(z)
z − z0dz =
∫ x0−ε
−R
f(x)
x− x0dx+
∫
Cε⇓
f(z)
z − z0dz+
∫ R
x0+ε
f(x)
x− x0dx+
∫
CR⇑
f(z)
z − z0dz.
(59)
Usando o teorema dos resıduos para o integrando F (z) = f(z)z−z0 temos que
∮
C
f(z)
z − z0dz = 2πiRes{F (z0)}
= 2πi limz→z0
(z − z0)F (z) = 2πi limz→z0
(z − z0)f(z)
z − z0= 2πif(z0) = 2πif(x0). (60)
enquanto que, pelo lema dos contornos denteados, e
limε→0
∫
Cε⇓
f(z)
z − z0dz = πiRes{F (x0)} = πif(x0). (61)
No limite R → 0, usando o teorema ML∣∣∣∣
∫
CR
f(z)
z − z0dz
∣∣∣∣≤ML ∼ |f(z)|
R(πR) → 0,
de forma que, substituindo (60) e (61) em (59) temos, nos limites R → ∞ eε→ 0, que
2πif(x0) = P∫ +∞
−∞
f(x)dx
x− x0+ πif(x0) + 0
onde usamos a definicao do valor principal de Cauchy da integral:
P∫ +∞
−∞
f(x)dx
x− x0= limR→∞
limε→0
{∫ x0−ε
−R
f(x)dx
x − x0+
∫ R
x0+ε
f(x)dx
x − x0
}
(62)
de forma que
P∫ +∞
−∞
f(x)dx
x− x0= πif(x0) (63)
Escrevendo, agora, f(x) = u(x) + iv(x), a expressao anterior le-se como
u(x0) + iv(x0) =1
πiP∫ +∞
−∞
[u(x) + iv(x)]
x− x0dx.
25
Igualando as partes real e imaginaria obtemos, entao, as relacoes de Kramers-Kronig:
u(x0) =1
πP∫ +∞
−∞
v(x)dx
x− x0, (64)
v(x0) = − 1
πP∫ +∞
−∞
u(x)dx
x− x0, (65)
Supondo que f ∗ (x) = f(−x), temos que
u(x)− iv(x) = u(−x) + v(−x),
tal que, igualando as partes real e imaginaria,
u(−x) = u(x), v(−x) = −v(x),
ou seja, u deve ser uma funcao par e v ımpar de x.Desdobramos a relacao (64) como
u(x0) =1
πP∫ 0
−∞
v(x)dx
x− x0+
1
πP∫ ∞
0
v(x)dx
x− x0.
Fazendo, na primeira integral, a substituicao de variavel ξ = −x, obtemos
u(x0) =1
πP∫ ∞
0
v(ξ)dξ
ξ + x0+
1
πP∫ ∞
0
v(x)dx
x− x0.
Trocando ξ → x (por serem variaveis mudas), obtemos uma versao alternativade (64):
u(x0) =2
πP∫ ∞
0
v(x)xdx
x2 − x20. (66)
Analogamente, a relacao (65) pode ser expressa como
v(x0) = − 2
πP∫ ∞
0
u(x)x0dx
x2 − x20. (67)
4.2 Aplicacoes fısicas
As relacoes de dispersao de Kramers-Kronig sao muito utilizadas em eletromag-netismo e otica. Para dieletricos isotropicos e lineares, a relacao entre os vetoresdeslocamento eletrico D e campo eletrico E e
D = ǫE,
onde ǫ e a permissividade do meio. Quando os campos eletricos sao estaticos, epossıvel trabalhar com uma permissividade constante. Ja quando temos camposeletricos oscilando no tempo, como em ondas eletromagneticas, a permissividadedepende da frequencia, um fenomeno que recebe o nome de dispersao (voce veraeste assunto com mais detalhes em Eletro II).
Assim, nos encaramos a variavel x como a frequencia angular ω das ondaseletromagneticas, e a funcao f(x) e a permissividade dieletrica ǫ(ω) que depende
26
da frequencia. Por motivos que ficarao mais claros em Eletro II, e convenientetrabalhar com uma permissividade complexa, na forma:
ǫ(ω) = ǫr(ω)︸ ︷︷ ︸
=u(x)−1
+i ǫi(ω)︸ ︷︷ ︸
=v(x)
,
onde ǫr e a parte real e ǫi e a parte imaginaria da permissividade. A parte realesta ligada ao ındice de refracao do meio (e a dispersao otica e justamente avariacao do ındice de refracao com a frequencia da luz). Ja a parte imaginariaesta relacionada a absorcao da onda eletromagnetica no meio, que e maxima nafrequencia de ressonancia do meio ω = ω0.
Neste caso, as relacoes (64)-(65) sao escritas na forma
ǫr(ω0)− 1 =1
πP∫ +∞
−∞
ǫi(ω)dω
ω − ω0, (68)
ǫi(ω0) = − 1
πP∫ +∞
−∞
[ǫr(ω)− 1]dω
ω − ω0, (69)
de modo que, conhecendo a parte real da permissividade (dispersao) conhecemosautomaticamente a sua parte imaginaria (absorcao ressonante) e vice-versa.
Usualmente as frequencias sao sempre positivas, de modo que podemostambem escrever as relacoes de Kramers-Kronig na forma (66)-(67):
ǫr(ω0)− 1 =2
πP∫ ∞
0
ǫi(ω)ωdω
ω2 − ω20
, (70)
ǫi(ω0) = −2ω0
πP∫ ∞
0
[ǫr(ω)− 1]dω
ω2 − ω20
, (71)
ja que, sob a hipotese de causalidade, ou resposta linear, podemos expressar apermissividade complexa na seguinte forma
ǫ(ω) = 1 +
∫ ∞
0
f(t)eiωtdt. (72)
para a qual ǫ(−ω) = ǫ∗(ω).
5 Exercıcios e Problemas
1. Seja C e um cırculo de raio R com centro no ponto z = a. Mostre, por calculodireto, que
∮
C
dz
(z − a)n= 2πiδn1
onde o delta de Kronecker e definido como
δmn =
{
1, se m = n,
0, se m 6= n,
2. Calcule a integral∫
Cz∗dz entre os pontos z = 0 e z = 4 + 2i ao longo dos
caminhos:
(a) z(t) = t2 + it. Resposta: 10− (8i/3).
(b) Pelo eixo y ate (x, y) = (0, 2), paralelamente ao eixo x ate (x, y) = (4, 2).Resposta: 10− 8i.
27
3. Usando a formula integral de Cauchy, mostre que (C e um cırculo no planocomplexo cuja equacao e dada):
(a)∮
C
cos zdz
z − π= −2πi, C : |z − 1| = 3.
(b)∮
C
ezdz
z(z + 1)= 2πi(1− e−1), C : |z − 1| = 3.
(c)∮
C
5z2 − 3z + 2
(z − 1)3= 10πi, C : |z − 1| = 3.
(d)∮
C
sin(πz2) + cos(πz2)
(z − 1)(z − 2)dz = 4πi, C : |z| = 3.
(e)∮
C
e2zdz
(z + 1)4=
8
3πie−2, C : |z| = 3.
4. Obtenha o desenvolvimento das seguintes funcoes em series de Laurent em tornoda singularidade indicada. Classifique as singularidades em cada caso.
(a) Singularidade: z0 = 1
f(z) =ez
(z − 1)2,
(b) Singularidade: z0 = 0
f(z) = z cos
(
1
z
)
,
(c) Singularidade: z0 = π
f(z) =sin z
z − π
(d) Singularidade: z0 = −1
f(z) =z
(z + 1)(z + 2)
(e) Singularidades: z0 = 0 e −2
f(z) =1
z(z + 2)2
5. Ache o resıduo de
(a)
f(z) =z2 − 2z
(z + 1)2(z2 + 4)
em todos os seus polos. Resposta: (7± i)/25 e −14/25.
(b)f(z) = ez csc2 z
em todos os seus polos. Resposta: emπ em z = mπ, com m inteiro.
28
6. Usando o teorema dos resıduos, mostre que (C e um cırculo no plano complexocuja equacao e dada):
(a)∮
C
eztdz
z2(z2 + 2z + 2)= πi(t− 1 + e−t cos t), C : |z| = 3.
(b)∮
C
ezdz
(z2 + π2)2=
i
π, C : |z| = 4.
7. Usando tecnicas de integracao complexa, mostre que
(a)∫
2π
0
dθ
3− 2 cos θ + sin θ= π,
(b) Se a > |b|,∫
2π
0
dθ
a+ b sin θ=
2π√a2 − b2
,
(c)∫
2π
0
cos 3θdθ
5− 4 cos θ=
π
12,
(d)∫
2π
0
dθ
(5− 3 sin θ)2=
5π
32,
(e)∫
+∞
−∞
dx
x6 + 1=
π
3,
(f)∫ +∞
−∞
x2dx
(x2 + 1)2(x2 + 2x+ 2)=
7π
50,
(g)∫
∞
0
cosmxdx
x2 + 1=
π
2e−m,
(h)∫
+∞
−∞
x sin πxdx
x2 + 2x+ 5= −πe−2π,
(i)∫
+∞
−∞
x sin xdx
x2 − a2= π cos a,
(j) Se 0 < a < 1,∫ +∞
−∞
eaxdx
1 + ex=
π
sin aπ,
Dica: C e um retangulo de vertices em (R, 0), (R, 2πi), (−R, 2πi) e (−R, 0).
(k) Se |a| < 1
∫
+∞
0
cosh axdx
cosh x=
π
2 cos(πa/2), (0 < α < 1)
Dica: C e um retangulo de vertices em (R, 0), (R, πi), (−R, πi) e (−R, 0).
29
(l) Se 0 < p < 1∫
∞
0
xp−1dx
1 + x=
π
sin pπ,
(m)∫
∞
0
ln(x2 + 1)dx
x2 + 1= π ln 2,
(n)∫ +∞
0
x2dx
(x2 + 9)(x2 + 4)2=
π
200,
(o)∫ +∞
−∞
dx
(x2 + 1)(x+ 1)=
π
2.
Referencias
[1] E. Butkov, Fısica Matematica (Guanabara Dois, Rio de Janeiro, 1978).
[2] G. B. Arfken e H. J. Weber, Mathematical Methods for Physicists, 5a. Ed.(Harcourt, San Diego, 2001).
30
Top Related