Texto sobre o caso da Balandra francesa

45
Revista Estudos Amazônicos • vol. X, nº 2 (2013), pp. 01-45 Tecnobrega, territorialidades sonoras e a cultura popular da hipermargem Tony Leão da Costa Resumo: Neste artigo discuto o processo de aparecimento e difusão massiva do tecnobrega. Analiso sua expansão cultural e territorial, sua interferência na “tradição” musical local e os debates nos meios jornalísticos e artísticos ocasionados por seu aparecimento. Por fim caracterizo o tecnobrega como parte de uma cultura popular massiva mais antiga, originária da hipermargem sociocultural de Belém do Pará. Palavras-Chave: Tecnobrega; Cultura; Território; Hipermargem. Abstract: In this article, I discuss the process of emergence and the huge spreading of Tecnobrega. I also analyze its cultural and territorial expansion, its interference in “traditional” local music and the debates in news and artistic media caused by this coming out. Finally, I characterize Tecnobrega as part of a large popular old mass culture, originating in the socio-cultural hyper-margin of Belém do Pará. Keywords: Tecnobrega; Culture; Territory; Hyper-margin.

Transcript of Texto sobre o caso da Balandra francesa

Page 1: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • vol. X, nº 2 (2013), pp. 01-45

Tecnobrega, territorialidades sonoras e a cultura popular da hipermargem

Tony Leão da Costa

Resumo: Neste artigo discuto o processo de aparecimento e difusão massiva

do tecnobrega. Analiso sua expansão cultural e territorial, sua

interferência na “tradição” musical local e os debates nos meios

jornalísticos e artísticos ocasionados por seu aparecimento. Por

fim caracterizo o tecnobrega como parte de uma cultura popular

massiva mais antiga, originária da hipermargem sociocultural de

Belém do Pará.

Palavras-Chave: Tecnobrega; Cultura; Território; Hipermargem.

Abstract: In this article, I discuss the process of emergence and the huge

spreading of Tecnobrega. I also analyze its cultural and territorial

expansion, its interference in “traditional” local music and the

debates in news and artistic media caused by this coming out.

Finally, I characterize Tecnobrega as part of a large popular old mass

culture, originating in the socio-cultural hyper-margin of Belém do

Pará.

Keywords: Tecnobrega; Culture; Territory; Hyper-margin.

Page 2: Texto sobre o caso da Balandra francesa

2 • Revista Estudos Amazônicos

O brega venceu?

Começo esse artigo com uma pergunta: “o brega venceu?”. Trata-se de

uma provocação, obviamente, já que em termos práticos “vitória” ou

“derrota” seriam categorias excessivamente reducionistas para pensar a

cultura musical brasileira contemporânea, a partir do Norte do país. Seja

como for, a pergunta não deixa de apresentar coerência se considerarmos

que o tema da “música brega”, por vezes, tomou a forma de um acirrado

debate entre vários grupos que pensam e/ou fazem a música popular

brasileira contemporânea. Esse tema está, na verdade, na “crista da onda”

das atuais discussões sobre novas identidades culturais e sonoras.

Não foi a primeira vez que a difusão massiva de um “gênero” ou

“subgênero” musical levou a um debate que ampliou o tema do

“meramente” musical e chegou ao campo de noções mais amplas, tal

como na tematização do confronto entre “arte” versus “lixo cultural” ou

“alienação” versus “música autêntica”. O estado do Pará, inclusive, tempos

atrás já vivera uma disputa entre os defensores do carimbó intitulado “pau-

e-corda”, visto como autenticamente caboclo e amazônico, e o carimbó

“moderno”, “comercial” ou “estilizado”, visto por alguns grupos como

uma forma “deturpada” daquele primeiro tipo1.

Voltando à provocação inicial, eu poderia afirmar que se de fato

houve um novo confronto musical e ideológico, esse embate apresentou

contemporaneamente uma forte feição territorial. Tratou-se, inicialmente,

de uma disputa a partir do surgimento de novas territorialidades musicais

e sonoras que partiram de alguns espaços localizáveis na cidade de Belém

do Pará. Essa cidade, desde pelo menos os últimos dez anos, foi aos

poucos sendo tomada pelo som que vinha de bairros periféricos como o

Jurunas, a Condor, o Guamá, a Terra Firme, o Tapanã, o distrito de

Icoaraci e demais periféricas da região metropolitana. Tratava-se do

Page 3: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 3

tecnobrega, a versão musical mais nova da cultura brega, que começou a

se difundir por volta do ano 2000.

A história do “brega” no Pará é muito longa. Não há espaço neste texto

para que ela seja recapitulada em detalhes. Todavia, para efeito de

informação geral, basta citar que a categoria brega na região Norte, e no

Pará em particular, apresentou conotações diferentes das quais ocorreram

no restante do Brasil. Pelo menos desde os anos de 1980 há uma linhagem

de artistas do mundo brega claramente identificável e que veio

aumentando seu sentimento de autorreconhecimento. Essa cultura

musical, por sua vez, está enraizada em uma cultura popular e massiva que

remonta aos anos de 1940 em Belém. Naquela década apareceram os

protótipos do que hoje é conhecido como “aparelhagens sonoras”. Eram

as “rádios de subúrbios”, das quais se têm notícias desde 1941, e que mais

tarde seriam conhecidos como “sonoros” ou “bocas de ferro” e

atualmente como “aparelhagens”.2

Todas essas formas de veiculação sonoras e musicais são fruto da

apropriação, pelas populações periferias, das inovações tecnológicas que

chegavam à cidade. Desde muito cedo na periferia de Belém os donos de

pequenos mercadinhos, de vendinhas e baiucas usavam gramofones para

atrair clientes. Contratavam “cantores de subúrbio” e “radialistas de

subúrbio” os quais, a partir da improvisação, transformavam os primitivos

aparelhos de som em equipamentos mais potentes que chamavam a

atenção das pessoas nas ruas, nas feiras ou nas casas. A presença desses

equipamentos improvisados foi tão marcante que mesmo os empresários

das rádios oficiais de Belém, como no caso de Roberto Camelier da Rádio

Clube do Pará, sentiram sua concorrência e chegaram a reclamar às

autoridades competentes no sentido de “pôr fim a um abuso diariamente

praticado pelos exploradores de amplificadores e alto-falantes instalados

em diversos pontos da cidade”.3

Page 4: Texto sobre o caso da Balandra francesa

4 • Revista Estudos Amazônicos

Esse fetiche do morador das periferias sobre o tecnológico vai se

desdobrar em uma cultura da hipermargem da cidade. Uma cultura que

absorveu tanto elementos do folclore e da cultura popular afro-ameríndia

e cabocla - em estreita comunicação com as culturas populares das regiões

interioranas do estado - como influências externas, pelo uso das

tecnologias disponíveis e também pela absorção de elementos da música

nordestina, sudestina e da música “internacional” veiculada pelos

modernos meios de comunicação durante todo o século XX.4 O

tecnobrega é, como já dito, a versão musical mais nova deste conjunto

cultural complexo e dinâmico. A amplificação de sua territorialidade é mais

um capítulo da história da cultura não canônica local. História essa

marcada por muitos encontros e, consequentemente, conflitos.

O tecnobrega pode ser entendido, hoje, como o principal signo

identitário musical das populações suburbanas e periféricas de Belém e da

região metropolitana e é especialmente popular entre os setores juvenis

desse grupo. Essa música tomou a cidade em seus múltiplos espaços,

ampliando uma territorialidade que inicialmente era “marginal”, ao mesmo

tempo em que ela mesma se modificou, ao ser amplificada para outros

ambientes que antes lhe eram estranhos. Representaria isso a sua vitória?

Teria ela adentrado ao cânone musical local e, até certo ponto, nacional?

Repito: o brega venceu? Caso tenha vencido, quais foram os termos do

embate?

Para sabermos isso é necessário entendermos como os discursos sobre

a música popular em Belém, e em sua região de influência, se constituíram

ao ponto de caracterizarem um embate de gostos musicais. Não pretendo

retomar aqui os inúmeros textos escritos nos últimos anos sobre o

fenômeno, mas sim mostrar as linhas gerais de alguns temas recorrentes

que surgiram a partir do momento em que a música brega, e o tecnobrega

em particular, foi amplificada no cenário da música paraense e

Page 5: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 5

posteriormente nacional. Por uma questão de espaço, limitar-me-ei a

traçar o debate realizado ainda em Belém, por alguns críticos musicais ou

pessoas do meio jornalístico. Esse debate, grosso modo, pode nos dar uma

tipologia das ideias veiculadas no conjunto da sociedade para esse

assunto.5

Tecnobrega: crítica e preconceito6

Um dos temas recorrentes na crítica ao tecnobrega, na medida em que

ele se expandia em Belém, foi a ideia de que esse tipo de som não mereceria

ser qualificado como música ou arte. Tanto do ponto de vista da música

propriamente dita como do ponto de vista das letras, inúmeros críticos

entendiam que o tecnobrega apresentaria qualidade estética baixa ou seria

desprovido de qualquer qualidade estética. Tomo como exemplo duas

falas que vão neste sentido. O jornalista Lúcio Flavio Pinto, em artigo

intitulado “A poluição tecnobrega”, de 2009, definiu o tecnobrega como

uma “monstruosidade antimusical” e assim o caracterizou: “A rigor, esse

gênero nem pode ser enquadrado na condição de música. Não tem

harmonia nem melodia. O ritmo é tão pobre quanto o de um bate-estaca.

Uma voz esganiçada geme como se tivesse dado uma topada”.7 No mesmo

sentido vão as observações do crítico Helder Bentes em texto de 04 março

de 2011. Para ele, essa música seria mais próxima a um “barulho que se

pretende artístico” ou uma “zoada”.8 Mais tarde em artigo de 19 de abril

de 2011, referindo-se à recusa do governador do Estado do Pará, Simão

Jatene, em transformar o tecnobrega em patrimônio cultural do estado,

disse: “Em minha opinião, o governador ainda foi generoso ao se referir

ao tecnobrega como ‘ritmo musical’ que repercute ‘artisticamente’”. E

finalizou afirmando que a música brega seria “desprovida de critérios

artísticos”.9

Page 6: Texto sobre o caso da Balandra francesa

6 • Revista Estudos Amazônicos

Convém explicar que neste último artigo Helder Bentes fazia referência

à movimentação que começara a ocorrer em grupos ligados às grandes

aparelhagens sonoras de Belém, fãs do tecnobrega, jornalistas e políticos

que se posicionavam de maneira mais aberta em relação àquela música.

No final dos anos 2000, esses grupos se mobilizaram para criar uma lei

que pudesse incorporar o tecnobrega à tradição “oficial” da música e

cultura locais. A primeira movimentação para transformá-lo em

patrimônio cultural e artístico do estado do Pará ocorreu em 2008, com a

apresentação de um projeto de lei pelo deputado Carlos Bordalo, do

Partido dos Trabalhadores. Em março de 2011, o projeto foi aprovado

pela Assembleia Legislativa. Porém, em 15 de abril daquele ano, o

governador Simão Jatene o vetou. Concomitante a isso, o tema tecnobrega

permanecia criando polêmica nos meios artísticos locais. O aparecimento

de bandas baianas que tocavam tecnobrega a partir de músicas conhecidas

no mundo das aparelhagens de Belém reforçou o debate púbico sobre a

questão. Para os defensores do gênero o não reconhecimento do valor

cultural daquela música e das festas de aparelhagens a elas associadas,

facilitaria o oportunismo de grupos de fora do estado do Pará que se

apropriavam das músicas paraenses sem indicar a autoria dos artistas

locais. Essa polêmica fora particularmente viva a partir ano de 2009

quando do aparecimento nacional da banda baiana Djavú, que se

apresentou em vários programas de TV com versões de tecnobregas já

bastante conhecidas nas festas de aparelhagens de Belém. Por alguns

meses, a banda fez bastante sucesso nacional, o que alimentou o debate

no Pará.10

Obviamente, a pressão das aparelhagens foi bastante significativa nesse

processo. Nesse momento, a campanha para a criação da lei foi

amplamente veiculada e discutida nas redes sociais da internet, em blogs,

sites, rádios e programas de TVs realizados por pessoas da cena tecnobrega.

Page 7: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 7

Finalmente, em maio de 2013, a Lei n° 7.708 foi aprovada, reconhecendo

como patrimônio cultural e artístico para o estado do Pará o “ritmo

tecnomelody”.11 Apesar das reclamações de críticos e jornalistas

conhecidos na cidade, esse reconhecimento acabava contradizendo a tese

do tecnobrega como algo “não artístico” ou de baixo valor cultural.

Pelo menos neste aspecto os apreciadores do tecnobrega haviam

conseguido uma vitória. Mas o debate continuou, antes e depois da lei.

Associada a ideia de brega como uma música que estava abaixo do estatuto

da “arte”, foi comum aparecerem afirmações que o colocavam como

representante de um gosto baixo em oposição a um gosto elevado. Lúcio

Flávio Pinto dizia: “brega é passaporte para o rebaixamento do gosto”.12

A boa música, no seu entender, poderia ser encontrada na vertente da

música popular feita no Pará por artistas identificados em grande parte

com a tradição da MPB (Música Popular Brasileira), em seu sotaque

regional. A MPB aparecia como um padrão de bom gosto e os artistas

locais que produziam a partir desse padrão formariam uma linhagem de

“bons” artistas, produtores de uma música de qualidade estética

apreciável, um gosto médio aceito como “boa música”. Repetia-se, então,

em Belém o modelo nacional de associação do bom gosto musical à

estética MPB.

Sem pretender repetir o longo debate sobre a construção da ideia de

“moderna música popular brasileira”, quero lembrar que a partir de fins

dos anos 1950 se construiu/inventou uma tradição musical que se pautava

nos padrões estéticos bossanovistas, entendidos como modernos, e que

mais tarde viria a se vincular ao conjunto musical heterogêneo que ficaria

conhecido nos anos 1960/70 como MPB. Como mostrou Marcos

Napolitano, a partir desse momento se construiu uma memória social que

associava a MPB ao consumo de uma minoria “culta” e “crítica”, oposta

ao mundo musical de caráter mercadológico e supostamente alienado.

Essa visão foi criticada por esse historiador, que mostrou que a MPB

Page 8: Texto sobre o caso da Balandra francesa

8 • Revista Estudos Amazônicos

também fazia parte de um sistema de mercado muito importante em

termos comerciais no Brasil dos anos 1970. Independentemente disso, a

partir desse momento a MPB passou a funcionar como uma espécie de

“complexo cultural plural” que estabelecia o que poderia ser entendido

como “popular” e “brasileiro” e definia os critérios estéticos de “bom

gosto”.13

Do outro lado do bom gosto, no seu lado oposto, melhor dizendo,

estaria a música cafona e brega, respectivamente assim chamadas pela

crítica musical nos anos 1970 e 1980. Segundo Paulo César Araújo, o

termo “brega” começou a ser utilizado nos anos 1980 para definir uma

vertente específica da canção popular caracterizada pela crítica

especializada como “popularesca”, de baixa qualidade, sentimental,

malfeita e esteticamente inferior à Música Popular Brasileira, a MPB.14

Assim, na perspectiva dos críticos e jornalistas paraenses, o Pará já

havia apresentado bons artistas que estariam associados a uma tradição do

bom gosto, a MPB de características locais. Nesse sentido, Lúcio Flávio

Pinto argumentava que:

A vertente verdadeiramente musical dessa tradição

fecundou compositores, músicos e cantores em

atividade, como Nilson Chaves, Vital Lima, Alcyr

Guimarães, Sebastião Tapajós, Nego Nelson, Fafá

de Belém, Leila Pinheiro, Jane Duboc, Andréa

Pinheiro e muitos outros.15

Esse panteão musical, que também tem uma história muito complexa

e remonta a debates anteriores sobre música popular no Pará, poderia ser

variável, dependendo da perspectiva do crítico que o descrevia.16 Dentro

desse conjunto, algumas vezes, mesmo a música vista como “brega”

Page 9: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 9

poderia ainda ser elevada à condição de bom gosto, mas não o tecnobrega,

e sim apenas algumas produções mais antigas, parte daquilo que

localmente era conhecido como o “brega dos anos 80”.17

Vê-se que a ideia de rebaixamento em alguns discursos aparecia como

resultado da falta de educação do povo. Seria como se o povo fosse pouco

instruído, desprovido da educação que deveria ser oferecida pelo Estado

e pelos órgãos competentes, segundo o que se dizia. O povo, assim,

aparece como vítima passiva da indústria cultural, o que ocasionaria o seu

rebaixamento de gosto. Um exemplo desta visão pode ser visto no

argumento do crítico Helder Bentes, no primeiro texto já citado. Assim

ele dizia:

Batidas repetidas e letras fáceis de serem alcançadas

pela população desprovida de senso estético são

introjetadas de tal forma, que se torna quase

inevitável o seu consumo, principalmente se as

pessoas não forem iniciadas em arte, se não forem

educadas, para fazerem uma apreciação crítica das

propriedades rítmicas da linguagem verbal,

presentes na música desde meados do século XV.18

Destarte, argumentava-se que o povo não precisaria do tecnobrega.

Necessitaria de outras coisas que o Estado não havia oferecido, como

educação, saúde, moradia etc. Afirmava-se que a população só consumia

o tecnobrega por ausência de tais benefícios formadores de uma cultura

mais elaborada e consistente. Helder Bentes, mais uma vez, dizia que o

tecnobrega é “um fenômeno previsível e diametralmente oposto às reais

necessidades da população paraense”. Era um substitutivo ao que o povo

de fato teria direito, já que:

Page 10: Texto sobre o caso da Balandra francesa

10 • Revista Estudos Amazônicos

(...) as escolas públicas estaduais estão caindo aos

pedaços, entregues a péssimos gestores, o

apadrinhamento político impera neste Estado

relacional, a burocracia estatal mais atrapalha que

ajuda o cidadão, a população atingida por este

“fenômeno de cultura de massa” não tem acesso à

saúde, educação, moradia digna, remédios e a uma

pá de outras coisas fundamentais para o aumento de

sua autoestima, para o despertar de seu juízo de

gosto e de sua consciência crítica.19

Outra ideia corrente é a que relaciona a música brega com a violência

dos bairros da periferia de Belém do Pará. A visão é variável. Para uns, no

mínimo o tecnobrega contribuiria com a violência; para outros, pelo

menos na forma que argumentam em seus textos, o brega seria quase que

a causa da violência das festas populares de periferia. Lúcio Flávio Pinto

dizia que o tecnobrega “também dá sua contribuição à violência geral.

Contando, para a consumação do crime, com o disfarce da cultura

popular”.20 Para o jornalista Anderson Araújo, a violência associada ao

brega faria com que parte da população periférica não apreciasse o gênero:

(...) outra grande parcela da mesma população

pobre rejeita o ritmo, sobretudo por associá-lo à

desordem pública e a práticas que colocam em risco

a segurança da comunidade. Práticas

comprovadamente observadas como o intenso

consumo de drogas nas festas promovidas pelas

aparelhagens e todas as consequências que o tráfico

traz para esses bairros.21

Page 11: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 11

O tecnobrega, assim, estaria associado aos excessos do consumo de

drogas e da violência urbana. E esses excessos se faziam ouvir também no

alto volume das festas de aparelhagem e dos locais onde se costumava

consumir aquela música, nos sons nas casas, nos bares etc. Isso fez com

que Lúcio Flavio Pinto se perguntasse se seria o Pará “a terra do barulho

e Belém como a sua lídima capital”.22

Em alguns casos, questionava-se a aproximação de setores de classe

média da população paraense com o tecnobrega, algo que começava a

ocorrer em fins da década de 2000. Questionava-se, principalmente, a

atuação de intelectuais que partiam em defesa daquela música, em caminho

contrário à posição da maioria dos críticos. Esses intelectuais foram

chamados por um jornalista de “sociólogos de aparelhagens”. A

“sociologização” em questão era descrita como algo negativo já que viria

acompanhada de uma patrulha ideológica que perseguiria quem exercia o

direito de se colocar contra o tecnobrega. No dizer de Anderson Araújo

em abril de 2011, tínhamos: “O que tem me assustado é a sociologização

do debate e, principalmente, a patrulha feita por certos setores em cima de

quem expressa o simples, antigo e sagrado direito de achar este ou aquele

tipo de música uma porcaria”. E completava:

De uma hora para outra, a festa do tecnobrega na

periferia começou a ser remastigada em um

palavrório e em uma atitude típica do pseudo-

intelectual brasileiro: a exaltação da pobreza para

respaldar sua legitimidade como cultura.23

Em resumo, pode-se tomar estas opiniões como um “tipo ideal” das

visões sobre o tecnobrega durante a década de 2000. Obviamente que tais

ideias não representam em totalidade a visão individual de cada um dos

Page 12: Texto sobre o caso da Balandra francesa

12 • Revista Estudos Amazônicos

autores citados, mas nos possibilita ver uma visão média do conjunto da

sociedade. Importa ainda observar que alguns poucos críticos tiveram uma

postura divergente em relação ao tema do tecnobrega, reconhecendo nele

um fenômeno social importante e evitando análise estigmatizadoras. Esse

foi o caso, por exemplo, da posição do cineasta e jornalista Vladimir

Cunha, ainda em abril de 2011, quando do debate sobre a lei do tecnobrega

com patrimônio cultural do Pará. Ele argumentou, dentre outras coisas,

que essa música representava também um conflito social e cultural, fruto

de uma sociedade marcada pela exclusão de grandes contingentes da

população de periferia, particularmente os jovens. Nesse sentido, dizia: “O

tecnobrega é a trilha sonora de um conflito. Da classe média com a

periferia e da música matemática e acadêmica com a criação espontânea e

intuitiva. É também o choque da ordem com a informalidade e o caos

urbano”. Em seu ponto de vista, um dos erros dos críticos do tecnobrega

era “não saber separar o transtorno causado pela falta de ordem pública

de um fenômeno cultural socialmente relevante”. Daí que se perguntava,

de maneira retórica: “as mazelas sociais e a negação de nossas raízes

culturais invalidam o tecnobrega como música a ponto de sermos contra

ele se tornar patrimônio cultural do Estado?”.24

Esse cenário de polêmicas acabava confirmando o fato de que não só

havia uma disputa significativa dentro do campo da vida cultural de Belém

do Pará, como também que o tecnobrega foi um dos principais agentes

desse debate. E, por vezes, poderia dizer, que ele se apresentou como um

agente rebelde, na medida em que, independentemente dos discursos

travados, permaneceu ampliando sua influência no gosto popular e

expandindo-se para os quatro cantos da cidade de Belém e para além dela.

Essa expansão do gosto popular se deu, como dito antes, como uma

conquista de territórios dentro do “ambiente acústico”.25 Nos dias de hoje,

qualquer pessoa que circule pelas ruas da cidade de Belém perceberá a

Page 13: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 13

presença sonora dessa música. Isso pode ser visto em várias situações e

em formas variadas. Na verdade, a presença da música brega, e do

tecnobrega em particular, é demonstração de um acontecimento mais

amplo, que escapa à fenomenologia meramente musical, pois expressa

também a presença de uma cultura subterrânea da cidade, uma cultura que,

em certos momentos da história de Belém e de sua região, se impusera ao

gosto médio, sem pedir licença. Neste sentido, a territorialização do

tecnobrega é também a territorialização de um modo de vida cultural das

margens, que se manifesta de múltiplas formas, não só pela forma musical,

apesar de ter na música um dos seus signos mais evidentes. Vejamos,

então, a seguir alguns aspectos dessa presença cultural.

Territorialidades do tecnobrega

É importante considerar que análises unilaterais sobre o tecnobrega ou

sobre qualquer outra forma musical popular e massiva quase sempre

escondem a complexidade do fenômeno. Vimos que uma das acusações a

esse gênero musical era a de que ele não seria nada mais nada menos do

que um produto da indústria cultural. Seria, nessa perspectiva, uma forma

musical alienante, fruto de uma fruição desavisada da música massiva, de

uma escuta desprovida de critérios estéticos.

De certo que essa afirmação não é de todo errada. Inegavelmente o

tecnobrega é em parte fruto de uma indústria cultural nacional e

internacional que influenciou a forma de fazer música em Belém do Pará.26

É fruto da assimilação pelos artistas locais da música internacional,

particularmente da música eletrônica das últimas décadas. Também não

posso deixar de reconhecer que, a partir de certo momento, a música

tecnobrega se associou, ou se reassociou, à indústria cultural na medida

em que foi incorporada por grandes gravadoras e aos meios de

comunicação massivos, chegando a lugares para além de seu espaço

Page 14: Texto sobre o caso da Balandra francesa

14 • Revista Estudos Amazônicos

imediato inicial, que eram as festas de aparelhagens da periferia de Belém.

Há, assim, tanto a incorporação de elementos externos aos produtores

locais do tecnobrega, como há, em um segundo momento, uma difusão

massiva dessa música mediada pela indústria do entretenimento nacional.

Alguns exemplos podem deixar claros esses dois aspectos a que me refiro

agora.

Para o primeiro caso é bom lembrar que é muito comum que os

produtores de tecnobrega façam versões de músicas populares difundidas

nos veículos tradicionais da indústria musical mundial. A música pop

internacional é ouvida e apreciada pelas populações de Belém e, muitas

vezes, se torna matéria prima a partir da qual versões são lançadas para o

consumo local. Muda-se a letra da canção, mesmo que essa não tenha

nenhuma relação com a versão original, modifica-se o andamento e o

ritmo e tem-se um tecnobrega de sucesso nas aparelhagens. Essa tendência

mostra claramente que os produtores de tecnobrega estão atentos à

indústria internacional, ouvem as músicas populares que são veiculadas

nas rádios, televisão, internet e festas populares. Da periferia do sistema,

das periferias da cidade de Belém, recebem informações da música

produzida, por exemplo, para os grandes clubes mundiais, nos quais se

veiculam principalmente a música eletrônica para dançar. Isso, sem dúvida

nenhuma, é um aspecto do que poderia se chamar de influência da

indústria cultural sobre as populações locais.

No que diz respeito à mediação da indústria cultural nacional à música

produzida em Belém, e consequentemente sua amplificação, há que se

lembrar da “elevação” de algumas bandas ao catálogo das grandes

gravadoras do país. Isso não ocorreu em grande escala, mas bandas como

a Calypso ou a cantora Gaby Amarantos, por exemplo, se tornaram

referências nacionais da música brega em geral e da música tecnobrega em

particular, respectivamente. Esses artistas representam o pico de uma

Page 15: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 15

cultura brega muito mais profunda, que conseguiram ser aceitos pelo gosto

nacional popular médio, passaram a frequentar programas de TV de

grande audiência e a participar de propagandas e campanhas publicitárias

de grandes marcas. Esses grupos e artistas inegavelmente foram, em parte,

assimilados por uma indústria de CDs e DVDs que pode ser claramente

entendida como comercial, a indústria cultural em seu sentido tradicional.

Há que se considerar ainda o papel das aparelhagens como a forma

local da indústria cultural, como uma forma própria de veiculação de

elementos musicais (relativamente independente da grande indústria

nacional), que também determina certa dependência dos artistas do

tecnobrega à sua estrutura de produção e circulação. No Pará, existem

centenas de aparelhagens e, dentro desse conjunto, existem algumas

grandes aparelhagens que centralizam boa parte do circuito de festas de

tecnobrega na cidade e na região. Creio que esse sistema, dominado pelas

grandes aparelhagens, poderia ser considerado como uma das formas

atuais da indústria cultural local se estruturar. Hoje, essas aparelhagens,

além de desenvolverem suas atividades nas festas de aparelhagens

propriamente ditas, fazem parte de um circuito ampliado que envolve

programas de rádio, programas de TV, blogs e sites. Assim, não é à toa que

muitas músicas de tecnobrega foram feitas em “homenagem” às grandes

aparelhagens, citando-as nominalmente em suas letras, como se fossem

músicas de campanhas publicitárias, para que pudessem ser veiculadas em

festas nas quais essas aparelhagens se apresentavam. Logo, não deixa de

ser verdadeira a afirmação de que o gosto popular é em boa parte

“influenciado” pelo que é veiculado nas aparelhagens, rádios, TVs e sites

do “circuito bregueiro”, 27 agora cada vez mais ampliado.

Todos esses elementos descritos acima confirmam a tese de que o

tecnobrega, em parte, pertence ao mundo da indústria cultural, seja ela

local ou nacional, em menor ou em maior medida. Porém, se é verdade

que o tecnobrega é em parte produto desse meio teoricamente alienante,

Page 16: Texto sobre o caso da Balandra francesa

16 • Revista Estudos Amazônicos

não é menos verdade que ele também é produto de uma cultura popular

periférica, surgida em boa parte nos subúrbios de Belém, na qual a

produção, a circulação e o consumo de informações sonoras e musicais

foram mediados por tecnologias disponíveis aos moradores dessas

periferias.

Do ponto de vista da indústria cultural em termos adornianos,

podemos dizer que o tecnobrega inicialmente viveu em relativa

independência. Vários estudos já mostraram que o consumo do

tecnobrega estava associado a espaços específicos dentro da cidade de

Belém, as festas de aparelhagem da periferia.28 Essa característica pode ser

verificada na forma como o sistema de produção e circulação do

tecnobrega viveu e até certo ponto vive ainda hoje. Ronaldo Lemos e

outros autores podem nos dar uma clara visão disso:

Simplificadamente, podemos dizer que o mercado

do tecnobrega funciona de acordo com o seguinte

ciclo: 1) os artistas gravam em estúdios – próprios

ou de terceiros; 2) as melhores produções são

levadas a reprodutores de larga escala e camelôs; 3)

ambulantes vendem os CDs a preços compatíveis

com a realidade local e os divulgam; 4) DJs tocam

nas festas; 5) artistas são contratados para shows; 6)

nos shows, CDs e DVDs são gravados e vendidos;

7) bandas, músicas e aparelhagens fazem sucesso e

realimentam o ciclo.29

Esse modelo sem dúvida faz do tecnobrega, pelo menos na maior parte

da sua produção, uma música “marginal” dentro do cenário musical local

e brasileiro. Ora, se há o domínio de uma indústria cultural local,

Page 17: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 17

configurada no poderio das grandes aparelhagens, há de se convir que

existem centenas de pequenas aparelhagens nas periferias de Belém, nas

cidades do interior do estado e até em comunidades ribeirinhas distantes

do grande centro, que não podem ser consideradas simplesmente como

apêndices do sistema de grande mercado.

De fato, para quem conhece as pequenas cidades da região amazônica,

não será novidade nenhuma afirmar que o caboclo local cultiva de longa

data fetiche pelo tecnológico sonoro. Isso faz parte de seu cotidiano.

Quem caminha pelas ruas dos bairros de periferia de Belém, ou pelas

cidades pequenas do Pará, ou mesmo em barcos e comunidades

ribeirinhas certamente encontrará pequenas e micro-aparelhagens

animando a festa de um bar, expostas na frente de uma casa, sonorizando

uma festa de santo e em tantas outras situações. Seriam essas pequenas e

micro-aparelhagens apenas o resultado do consumo alienado e desavisado

da população à música pop internacional? Ou seriam elas o mercado em

sentido tradicional, industrial, monopolizador? Com certeza, são fruto da

ingestão de elementos externos, mas também são fruto de uma

criatividade local na formulação tanto de gêneros musicais como de

estratégias de circulação e de consumo próprio. A ideia de alienação

simplifica por demais um fenômeno muito mais complexo.

É verdade que os artistas do tecnobrega pertencem agora a um circuito

nacional (e talvez internacional) de música ligado às grandes empresas de

disco? Absolutamente não! Apenas um pequeno número de artistas

ingressou no mercado nacional enquanto que, na periferia de Belém,

adolescentes e jovens permanecem criando a música tecnobrega a partir

de recursos precários e com equipamento improvisados fruto de uma

habilidade e criatividade bastante independente do grande mercado. Há,

portanto, uma cultura popular do tecnobrega, que é a versão musical mais

nova de uma cultura popular brega mais antiga. A dinâmica da criação e

Page 18: Texto sobre o caso da Balandra francesa

18 • Revista Estudos Amazônicos

veiculação dessa música deve ser entendida em perspectiva histórica, o que

significa entender a dinâmica de suas transformações.

Na medida em que esse tipo de música se expandiu territorialmente,

incorporando partes do ambiente acústico que antes não lhe pertencia,

causou um impacto na percepção sonora da cidade pelos indivíduos e

coletividades que desconheciam essa música ou que a conheciam, mas

estavam acostumados a definir o padrão do belo e audível a partir de seus

próprios critérios estéticos. O tecnobrega só passou a incomodar os

críticos na medida em que se impôs no espaço da cidade. Ele mostrou uma

nova corporeidade, uma nova dicção, uma nova forma de controle do

território acústico, impôs-se pela territorialização de uma sonoridade que

não pediu licença para se estabelecer. Ele é fruto de uma territorialização

de uma cultura enraizada nas periferias de Belém, uma cultura marcada

tanto pela assimilação de elementos da indústria cultural como pela criação

cultural local mediada pelas tecnologias internacionais que chegaram ao

solo citadino.

Desde o início do século XX, Belém, e mesmo seus arrabaldes, já sente

o impacto progressivo da cultura trazida pelos modernos meios de

comunicação de massa: rádio, cinema, discos, revistas, etc.30 Como já

visto, data de 1941 a primeira referência à existência de “rádios

suburbanas” em Belém. Desde lá, no mínimo, a cultura popular suburbana

e periférica estabeleceu formas de assimilação e produção de elementos

musicais e sonoros, a partir de equipamentos da modernidade. Essas

rádios de subúrbio, sonoros e aparelhagens, respectivamente, conviviam

com a cultura popular mais antiga, a cultura popular enraizada em centenas

de anos de chegadas de populações subalternizadas no processo de

colonização e ocupação da Amazônia.

Sabe-se que a história de Belém é uma história de expansão de

fronteiras, de alargamento de margens, de fluxos e refluxos de gentes.

Page 19: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 19

Como a maioria das cidades da região amazônica, Belém teve pelo menos

dois grandes momentos de desenvolvimento urbano. No primeiro, os rios

eram basicamente o veículo de circulação de pessoas e mercadorias, de

ações colonialistas de ocupação e conquista do território e também veículo

de trocas culturais. No segundo, a partir da década de 1960, as rodovias se

somaram às rotas anteriores, ampliando e complexificando o cenário de

ocupação da região e da cidade.31

Nos dois momentos Belém permaneceu como uma cidade de chegadas

de muitos povos, de outras regiões ou de outras partes do mundo. Exibiu

desde cedo uma paisagem de conexões da cidade com o campo e da cidade

com regiões mais distantes.32 Desde o período colonial a cidade se alargou

em direção ao campo, às regiões rurais e extrativistas que a rodeavam.

Superou barreiras naturais que separavam centro e subúrbio, como no

caso dos igarapés que recortavam a malha urbana. Até a década de 1960 a

expansão se deu rumo ao Sul, com a incorporação de bairros como

Jurunas, Condor, Guamá e Terra Firme; e também rumo ao Norte,

incorporando bairros como o Umarizal, a Pedreira e o distrito distante

Icoaraci.33 A margem de Belém foi ocupada por moradores que estavam

na interface entre o “centro” que se urbanizava cada vez mais e os

subúrbios que ainda mantinham ares interioranos. Isso é possível perceber

pelas descrições memorialísticas e da literatura como nas obras de Dalcídio

Jurandir,34 De Campos Ribeiro35 e Nélio Reis.36

Mesmo hoje, grandes bairros de periferia, como o Jurunas, ainda

mantém uma relação de diferenciação em relação ao centro da cidade, na

medida em que conserva hábitos suburbanos muito influenciados pelas

constantes relações que essa população estabelece com suas regiões de

origem no interior do estado.37 Os portos da grande área fluvial, que cerca

a cidade, apenas reforçam essa relação de traços rurais no urbano. Esses

espaços não são apenas uma porta de entrada para produtos comerciais,

como também possibilitam o estabelecimento de trocas culturais entre

Page 20: Texto sobre o caso da Balandra francesa

20 • Revista Estudos Amazônicos

esses dois mundos,38 assim como a construção de produtos culturais

locais, resultado de assimilação de múltiplos elementos culturais, locais e

externos.

Essa hipermargem da cidade de Belém pode também ser vista como o

lugar da população da “margem”, tanto no sentido espacial como no

sentido social e étnico-racial. O entorno de Belém foi território dos grupos

indígenas que lá habitavam desde antes da fundação da cidade. Mais tarde,

essa mesma região se tornou lugar do “caboclo” amazônico39, que

continua figurando como personagem subalterno no contexto social

paraense. Mesmo depois da independência e depois do crescimento da

cidade com a riqueza da Economia da Borracha no final do século XIX,

os bairros de subúrbio continuaram habitados por populações negras e

caboclas. Isso é o que podemos perceber pela grande presença de

quilombos às proximidades de Belém desde o século XVIII até os dias de

hoje.40 Ou ainda é o que nos mostra a trajetória do bairro do Umarizal,

onde historicamente se encontravam grandes contingentes de populações

negras até meados do século XX. Isso mostra que as margens de Belém

também receberam contingentes populacionais negros oriundos da

escravidão e da dinamização da estrutura do “Atlântico Negro”.41

Todos esses fatores levaram esses ambientes fronteiriços a se tornarem

espaços de múltiplos processos culturais e de uma rica cultura popular

suburbana. Isso se configurou na presença de festas populares peculiares

e manifestações que sempre tomavam conta do calendário de eventos da

cidade. Por exemplo, foi a partir dessa hipermargem que se apresentaram

a toda Belém as festas de bois-bumbás e as atividades de capoeiras desde

meados do século XIX.42 Foi ainda a partir desses ambientes fronteiriços

que o carimbó ocupou o cenário da música popular no Pará. Foi nos

bairros populares que o merengue e a guitarrada, “abrasileiramento” de

gêneros musicais do Caribe,43 tiveram morada.44 E mais recentemente, foi

Page 21: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 21

desses espaços que uma cultura popular brega, associada a maneiras

específicas de veiculação musical, as aparelhagens passaram a ser

conhecidas em toda a cidade e fora dela.

Logo, diferente do que poderíamos imaginar inicialmente, o

tecnobrega faz parte de um mesmo meio social e cultural. É a versão mais

nova de uma cultura popular mais antiga. É a manifestação de uma cultura

popular periférica enraizada na história da cidade de Belém, em suas

margens, ou melhor dizendo, em sua hipermargem. A hipermargem que

liga as micro-aparelhagens que animam festas de santo em uma

comunidade ribeirinha a quilômetros de distância de Belém a uma festa

gigantesca de uma grande aparelhagem numa sede de um bairro periférico

da capital.

O enraizamento do brega a uma cultura popular pré-existente faz com

que sua expansão não se manifeste apenas pelo elemento musical, apesar

de que este elemento talvez seja o mais visível e audível na percepção dos

críticos. Na verdade, qualquer territorialidade musical e sonora está

associada ao um modo de vida e a uma cultura específica, que incorpora

vários elementos exteriores da vida “meramente” musical. Em Belém,

percebe-se a expansão na malha urbana, a expansão territorial sonora e

corpórea dessa cultura, por exemplo, pela ação das pessoas no interior do

transporte coletivo urbano: adolescentes e jovens de bairros periféricos

que têm o costume de ligar seus aparelhos de telefonia móvel, os celulares,

ou pequenas caixas de som portáteis a todo volume. Esses indivíduos

criam uma cultura de escuta constante da música. Estejam em seus bairros

de origem ou estejam passando por bairros do centro da cidade. Em

qualquer bairro de periferia de Belém é possível vermos pessoas escutando

música a todo volume nos fins de semana ou em dias comuns, em

aparelhos de sons residenciais, em carros com aparelhos automotivos

amplificados em oficinas especializadas ou nos celulares. O “excesso” do

som é uma forma de ser das populações da periferia de Belém.

Page 22: Texto sobre o caso da Balandra francesa

22 • Revista Estudos Amazônicos

Mesmo que consideremos que nem todos os moradores da periferia

compartilhem este modo de ser, o cotidiano da maior parte desses bairros

mostra que tal comportamento é socialmente aceito e entendido como

normal. Esse “excesso” impacta no ambiente acústico na medida em que

os moradores se transportam para fora de seus bairros de origem. Ele é

uma forma da ampliação do circuito bregueiro identificado, em grande

parte, como o momento específico das festas de aparelhagem. Ele é um

aspecto a mais desse circuito bregueiro ampliado, que nada mais é do que

a própria forma da cultura popular contemporânea da maior parte das

populações da periferia da cidade de Belém, particularmente entre os

jovens.

Aos poucos, criou-se uma fala comum de queixa à “falta de educação”

dessas pessoas que ouviam música em ônibus e espaços públicos do centro

e, na maior parte das vezes, recusavam-se a usar fones de ouvido.

Recentemente, essas queixas chegaram às chamadas “redes sociais” da

internet, em sites de relacionamento, em blogs e outros meios eletrônicos e

virtuais de comunicação. Na maior parte das vezes, a crítica a esse hábito

ocorre com frases do tipo: “dê de presente um fone de ouvido a um

bregueiro”. O “bregueiro”, por onde passa, tornou-se o representante real

e imaginário do “barulho”, interferindo em ambientes que normalmente

não fazem parte do seu dia-a-dia. Quando um bregueiro liga seu celular ou

uma pequena caixa de som dentro de um ônibus, de algum modo,

territorializa aquele espaço como pertencente ao seu mundo, mesmo que

o veículo circule pelos bairros nobres da cidade; mesmo que eles estejam

fora de seu espaço inicialmente familiar. A luta de classes se dá, muitas

vezes, pela imposição do gosto popular e pela batalha no domínio do

ambiente acústico.

Isso ocorre também com adolescentes que andam de bicicleta nas ruas

da cidade com seus celulares ligados a todo volume. Em alguns casos são

Page 23: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 23

adaptadas pequenas caixas de som nas bicicletas. Os garotos que

“sonificam” sua presença com celulares e caixas de som nos ônibus, nas

ruas ou por onde passam com suas bicicletas, sem o saberem, estão

territorializando o seu modo de ser na cidade, estão dizendo que existem,

estão desafiando e “desafinando” a falsa harmonia e melodia da urbe, que,

de fato, sempre foi uma cidade dividida, fragmentada e desigual.

As bicicletas, em particular, são outra face do “excesso” da cultura

popular periférica contemporânea. Nos bairros de periferia de Belém é

comum que as oficinas especializadas de conserto de bicicletas também

realizem intervenções e modifiquem a estrutura física dos veículos. Alarga-

se a estrutura tubular, colocam-se chapas que permitem que o que era uma

tubulação comum fique mais larga e possam ser pintadas com cores vivas

e, muitas vezes, com dizeres e nomes. Associado a isso, improvisam-se

buzinas com o uso de bombas de ar comprimido que ao serem acionadas

ampliam enormemente a densidade do som de alerta. Tornam-se buzinas

muito parecidas com equipamentos usados em caminhões e carretas. Tais

bicicletas são facilmente encontradas no cotidiano das feiras e ruas de

periferia de Belém e não raramente são um aspecto do “excesso” sonoro,

associado ao próprio consumo da música brega, em grupos de

adolescentes que frequentam as ruas da cidade.

Sonificar sua presença significa, neste sentido, territorializar-se por

onde se anda, a partir de uma tendência constante à dominação do

ambiente acústico. Quando um jornalista com Lúcio Flávio Pinto observa

que a cidade de Belém é uma cidade caracterizada pelo barulho, sem o

perceber, deixa escapar que os agentes por excelência desse “barulho” são

as pessoas de outros lugares da cidade, das periferias, dos bairros de

baixada, enfim, pessoas que pertencem a uma cultura popular do

“excesso”, do “bate-estaca”.45 O bate-estaca é a presentificação do

“outro” urbano, é a territorialização da outra Belém que existe à margem

da Belém que apresenta uma harmonia supostamente equilibrada.

Page 24: Texto sobre o caso da Balandra francesa

24 • Revista Estudos Amazônicos

Outro aspecto da territorialização do tecnobrega e da cultura popular

brega é a presença dessa música em eventos “tradicionais” do calendário

festivo da cidade. Nas festas populares do calendário anual, o tecnobrega

passou a concorrer e quase sempre a ganhar de gêneros mais antigos e

“tradicionais”. Exemplos disso ocorrem no carnaval, quando muitas

pessoas passaram a colocar carros-som com o tecnobrega, mesmo em

meio a blocos de marchinhas e samba. O mesmo se passa em festas como

a quadra junina, festas religiosas em homenagem a algum santo popular

etc. No carnaval dos últimos dez anos, a esse efeito, o tecnobrega vem

quebrando a hegemonia do “carnaval nacional” pautado no modelo de

samba sudestino. Na maior parte das vezes, o brega cerca os blocos e, pela

força dos equipamentos de som automotivos, quase sempre os supera.

Tem sido recorrente a reclamação das pessoas quanto à presença de carros

som, bicicletas sonoras ou carros comuns que tiveram seus equipamentos

sonoros amplificados e potencializados. Isso se configura também como

uma tomada da cidade nas festas mais antigas, nas quais os gêneros que se

tornaram “tradicionais” ocorrem.

Todos esses elementos configuram a expansão que,

consequentemente, acabou alargando o gosto popular ou, em outros

termos, levou à aceitação progressiva do tecnobrega para outras áreas,

onde originalmente ele não ocorria. Isso impactou também nos meios de

comunicação tradicionais. Nas rádios e TVs comerciais, depois de certo

tempo e mais recentemente nas rádios e TVs ditas de “bom gosto”, o

tecnobrega passou a hegemonizar. Mesmo em rádios consideradas de

gosto refinado, como a Rádio Cultura do Pará, ligada à FUNTELPA

(Fundação de Telecomunicação do Pará)46, o tecnobrega tem ganhado

cada vez mais espaço, ao mesmo tempo em que começa a ser revisto pela

opinião dos ouvintes dessas rádios.

Page 25: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 25

Isso ocorreu também com a política pública de cultura do Governo do

Estado do Pará que, mesmo não atendendo de fato às demandas e

necessidades da juventude no seu mundo da hipermargem, viu-se

obrigado a assimilar parte dessa música suburbana e a usá-la agora em sua

política oficial, como ocorre no evento Terruá Pará. Ele é uma espécie de

mostra da música paraense, que começou no ano de 2006. É patrocinado

pelo governo do estado do Pará através da Secretaria de Cultura

(SECULT). Nele, busca-se reunir uma grande diversidade de artistas e

gêneros musicais, nos quais o carimbó, a lambada ou guitarrada e o brega,

incluindo o tecnobrega, são o carro-chefe.

Na verdade, a atuação do Terruá tornou-se mais forte a partir do

momento em que o tecnobrega e gêneros associados começaram a chamar

a atenção da imprensa nacional para a música das “festas de aparelhagens”.

Aos poucos, os gêneros que eram anteriormente definidos como música

“povão” foram assimilados pela política pública estadual de cultura, tanto

nas suas rádios e TVs, como na realização da mostra Terruá Pará. Pelo

menos parte da cultura das margens tornou-se objeto de divulgação

nacional da identidade cultural do Pará e da “brasilidade” a partir de

Belém.47

Apesar de apresentar discurso que valoriza a cultura popular das

aparelhagens e do mundo suburbano e brega, o Terruá acabou

selecionando um número pequeno de artistas que representam essa

cultura, tornando-se, assim, literalmente, uma “mostra”, ou uma

amostragem, de um mundo cultural muito mais amplo e dinâmico, que

continua vivo nas margens da cidade de Belém, onde, contudo, não há

tantos holofotes e atenção da política cultural para a cidade.

As mudanças têm ocorrido também no gosto popular médio, incluindo

setores do “centro” de Belém que inicialmente não se identificavam nem

consumiam o tecnobrega. A tendência dos últimos anos é que as críticas a

essa música comecem a ficar restritas a setores cada vez menores da

Page 26: Texto sobre o caso da Balandra francesa

26 • Revista Estudos Amazônicos

sociedade, àqueles conscientemente associados à ideia de música de “bom

gosto” versus “lixo cultural”.

Minha observação de campo tem mostrado que mesmo artistas do

mundo musical de Belém, que antes tinham uma visão tecnicista do que

entendiam como “música complexa” versus “musica simplória” (estando o

tecnobrega incluído nessa segunda categoria), têm relativizado bastante

suas opiniões. Não necessariamente por terem mudado de ideia em relação

ao tecnobrega enquanto música, tecnicamente falando, mas por

conviverem com artistas que tocam ou incorporaram parcialmente o

tecnobrega. O convívio de artistas da MPB ou do mundo do chorinho

com artistas do tecnobrega, em pé de igualdade em festivais e mostras

musicais, possivelmente tem levado a uma pacificação e a uma redução

das críticas abertas, em particular entre pessoas do mundo da música. Na

medida em que os mais famosos artistas do tecnobrega, aqueles que

conseguiram superar as barreiras da hipermargem, passam a conviver com

os artistas mais antigos da MPB, as relações de trabalho compartilhado e

amizade ou camaradagem diminuem as distâncias e fronteiras.

Com o tecnobrega, houve também a imposição de uma dicção

particular que, para os intelectuais de classe média, inicialmente era vista

como “voz de pato”, um termo recorrente nos meios intelectuais ou nas

mesas de bares onde se discutiam a cultura musical paraense dos últimos

anos. É maneira de falar e cantar nasalada, possivelmente muito

característica do sotaque das populações caboclas urbanas do Pará. Esse

efeito é também realizado de forma proposital pela agudização e distorção

da voz dos cantores na mixagem das músicas de tecnobrega. É um recurso

intencional, portanto, além de ser também representativo de uma maneira

de falar cabocla. Essa forma de falar levou a uma forma de cantar, a um

timbre que é prontamente reconhecido pelas pessoas do mundo brega e

normalmente gera estranhamento para as pessoas de fora desse mundo. É

Page 27: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 27

uma dicção particular, fruto de um modo de falar e um timbre

normalmente diferentes da fala e do timbre dos grupos sociais entendidos

como “cultos” na cidade de Belém.48

Essa dicção é fruto de uma corporeidade mais profunda, que se

manifesta também em uma série de elementos que, por uma questão de

espaço, poderei apenas citar neste texto. Trata-se, por exemplo, de uma

estética do corpo brega. Modos de vestir, de combinar roupas e cores, de

pintar o cabelo (com cores especificamente reconhecidas como de

populações periféricas), de caminhar, de dançar, de falar, de olhar, de se

presentificar no tempo e no espaço. Formas que são claramente

reconhecidas pelos moradores de Belém, mesmo que, na maior parte das

vezes, não sejam pronunciadas. São formar de sentir e de se colocar no

mundo que fazem parte do cotidiano de uma população de Belém, não de

toda, a população da hipermargem.

O tecnobrega se impôs também pela construção de uma escrita própria

e alternativa da história da música local, feita por seus próprios agentes. Já

citei aqui o texto “Glossário Bregueiro” feito por artistas e pesquisadores

associados a esse cenário, que tentou dar conta da diversidade dos

“subgêneros” que fariam parte dessa música. Mas há uma série de artigos

em sites, blogs, revistas e jornais, feitos por pesquisadores, DJs, cantores e

fãs do mundo brega. Pessoas que fazem parte desse ambiente cultural e

tentam escrever uma história daquilo que identificam como uma linhagem

de artistas claramente identificáveis.

Há assim uma autoidentificação de uma música brega feita por artistas

bregas desde pelo menos os anos 1980. Exemplo disso é o texto do cantor

Júnior Neves intitulado “Brega: de 1980 a 2005: do Brega Pop ao Calypso

do Pará”. Esse pode ser considerado um dos primeiros e um dos mais

importantes textos a tentar elaborar uma genealogia e uma periodização

da cultura musical brega no estado do Pará.49 Assim, os historiadores do

brega lutam também no campo das narrativas históricas e da memória para

Page 28: Texto sobre o caso da Balandra francesa

28 • Revista Estudos Amazônicos

estabelecer uma identidade alternativa ao cânone musical da região e do

Brasil.

O brega e o tecnobrega impõem-se também pela construção de uma

escrita própria e alternativa da história da música local feita pelos agentes

do mundo acadêmico, ou seja, pela escrita de dissertações, teses, livros,

artigos em revistas científicas, em veículos eletrônicos ou na mídia

tradicional. Parte dos intelectuais acadêmicos teve o mérito de ter

observado um mundo cultural complexo e dinâmico, que logo foi

identificado como merecedor de análises científicas, mesmo em uma fase

em que, para boa parte dos críticos musicais, o brega ainda era visto como

lixo cultural. Isso pode ser percebido em alguns trabalhos como os de José

Maria da Silva, Antonio Maurício Dias da Costa, Hermano Vianna, Paulo

Murilo Amaral, Adriana Facina e minhas próprias formulações neste e em

outros artigos. 50

Todos os aspectos descritos acima me levam a crer que o tecnobrega,

ao se territorializar, forçou a sua entrada, mesmo que de maneira parcial,

ao mundo da cultura do “centro”, a cultura “canônica” ou “oficial”. Ele

foi o agente maior de sua própria história recente. Porém, ao adentrar

neste mundo muito dele mesmo se metamorfoseou, num processo no qual

a tradição pré-existente, canônica, seleciona o que deve e o que não deve

ser aceito. Isso é percebido na atuação de artistas que não poderiam ser

definidos como “bregas” em sentido estrito, mas passaram a produzir

composições que se inspiram nele, para o consumo de um público

também externo ao ambiente brega.

Esse é o caso, por exemplo, do compositor, guitarrista e cantor Felipe

Cordeiro. Sua trajetória é bastante curiosa e nos ajuda entender a

complexidade dos encontros e desencontros culturais. Ele é filho de

Manoel Cordeiro, guitarrista e compositor de lambadas e guitarradas da

geração 1980. Apesar de fazer parte desse contexto musical originalmente

Page 29: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 29

associado ao brega, por conta da influência familiar, Felipe Cordeiro teve

uma formação que poderia ser caracterizada como acadêmica. Entrou na

Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA) aos onze

anos, em meados dos anos 1990, e lá estudou piano, teoria musical e

bandolim. Aos 16 anos, fez vestibular para Filosofia na Universidade

Federal do Pará, no mesmo período em que iniciou sua atividade de

compositor. Nesse momento, teria sofrido grande influência de artistas de

São Paulo, da chamada “vanguarda paulista”, tais como Luis Tatit, José

Miguel Wisnik, Arrigo Barnabé e também de artistas da MPB, que definiu

como “uma maneira específica de se fazer música popular do Brasil”.

Somado aos paulistas, nomes como os de Caetano Veloso, Gilberto Gil,

Chico Buarque, Capinam, Paulo Cesar Pinheiro, Aldir Blanc, Milton

Nascimento, entre outros, marcaram essa etapa de sua carreira. Seu

primeiro CD, Banquete, seguiu essa linguagem.

Ocorrida essa primeira fase, Felipe Cordeiro passou pelo que chamou

de “processo de revisão crítica” que o levou a repensar suas antigas

influências da MPB e recolocar a música massiva paraense, o tecnobrega,

assim com as guitarradas e os merengues, como matéria-prima para um

novo processo criativo. Assim ele descreveu essa mudança e a revisão da

tradição musical da MPB:

Essa estética de música brasileira [MPB] por alguns

motivos perdeu a capacidade de ser uma linguagem

contemporânea do ponto de vista estético, do ponto

de vista mercadológico, de ponto de vista social, de

todos os pontos de vista, segundo essa minha

revisão crítica. (...) Essa estética teria perdido essa

capacidade que era inerente a ela nas décadas de 60

e 70. Era uma música combativa esteticamente,

porque propunha o novo; era uma música

Page 30: Texto sobre o caso da Balandra francesa

30 • Revista Estudos Amazônicos

combativa socialmente; era uma música combativa

comportamentalmente. Nos anos 90, apesar de eu

ter me influenciado por aquela linguagem meio que

como um aprendizado..., cheguei à conclusão de

que a MPB não era mais combativa esteticamente,

porque se repetia; não era mais combativa

socialmente, porque tinha caído num nicho social

específico; não era mais combativa

comportamentalmente, porque tinha caído numa

zona de conforto absolutamente alienada e

descompromissada com qualquer questão

comportamental. Eu cheguei à conclusão de que

fazer MPB nos anos 90 era a coisa mais reacionária

possível, em todos os aspectos. Então eu passei por

uma revisão dura com relação ao que eu vinha

fazendo e procurei um caminho novo.51

O resultado dessa revisão foi o lançamento do CD Kitsch Pop Cult de

2012 que, como se pode ser percebido no título, tinha como proposta uma

revisão de conceitos e um embaralhamento dos lugares comuns musicais,

que iam das influências de vanguarda e da MPB até o mundo kitsch da

música brega. Felipe Cordeiro se colocou conscientemente em um lugar

ambivalente, que pudesse fazer uso dois mundos que marcaram a sua

trajetória musical. Assim ele definiu essa postura: “Ambos os mundos, e

são dois mundos diferentes, e eu de algum modo me sentia um híbrido

dos dois. Então na verdade tem um pouquinho de ironia nisso tudo (...)

tem um pouquinho de deboche e tem um pouquinho de seriedade

também”.52 A obra de Felipe Cordeiro é um exemplo que mostrava que o

tecnobrega e outros elementos da cultura musical brega passavam a ser

Page 31: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 31

acessados por artistas e por um público mais próximo de vanguardas

musicais, público jovem e urbano, de setores intelectualizados da

população de Belém e mesmo do Brasil, já que sua carreira passou a se

realizar em São Paulo a partir do lançamento de seu segundo CD.53

Outro exemplo de revisão de fronteiras é o caso da atuação da banda

Lauvaite Penoso, formado por músicos do circuito alternativo da música

paraense. É uma banda que se aproxima de um público jovem, apreciador

da música “não comercial”, “independente”, até certo ponto vista como

engajada a questões sociais. A banda tem entre suas composições

carimbós, reggaes e um tecnobrega intitulado Guamá Sound System, que

apresenta inovações tanto do ponto de vista da forma musical como do

ponto de vista da letra.

O tema da canção é o cotidiano de violência das periferias da cidade

de Belém, a partir do bairro que dá título à música, o Guamá. Em meio a

sirenes de carros da polícia e sons de tiros, interferências sonoras e ruídos

que iniciam a música, ouve-se inicialmente um salve geral aos bairros de

periferia da cidade: “Salve Guamá, Jurunas, Terra Firme, Icoaraci,

Barreiro, todas as baixadas de Belém do Pará”. O teor crítico da letra é

claramente percebido em partes que tematizam o contexto urbano e

particularmente a desagregação das relações sociais nos bairros de

periferia, sobretudo pela ação de jovens envolvidos com o mundo do

crime. Faz-se alusão aos jovens que da periferia da cidade se dirigem para

outros lugares com suas bicicletas com o intuito de cometer assaltos.

Guamá, periferia, não sei o porquê mas estão

roubando todo dia.

Como não sabe? Mas olha só!

Muita miséria e injustiça ao nosso redor.

Pega ladrão! De bicicleta!

Olha pra trás, aponta a arma, mas o tiro não acerta.

Page 32: Texto sobre o caso da Balandra francesa

32 • Revista Estudos Amazônicos

Irmão! Mas é certeira então, a nossa rima!

É sound system aparelhagem vai pra cima.

O mesmo som do tecnobrega que embala o cenário urbano violento

apresenta o chamado para uma nova agregação de identidades e, ao

mesmo tempo, uma nova identidade de resistência, configurada em

divindades guerreiras africanas que são citadas na letra: “É alma livre, do

mesmo lado/Ogum guerreiro, Oxalá tá declarado!”. E pelo acionamento

da uma memória mais longínqua, talvez a memória de revoltas populares

da história da Amazônia, como a Cabanagem, ou ainda a memória de

povos que primeiro habitaram a região, que passaram pelo processo de

colonização e massacre em outros tempos, como os grupos indígenas.

Cabanos, indígenas e, creio eu, os atuais jovens de periferia apreciadores

de tecnobrega são, portanto, irmãos, companheiros, de uma mesma

condição que os une e, ao mesmo tempo, os desagrega: “miséria e injustiça

ao nosso redor”. São, finalmente, “malungos”,54 que têm o potencial de

caminhar do mesmo lado uma vez que consigam ter consciência da

condição que os unifica. Esse é o chamado da canção:

Malungo, vamos caminhar do mesmo lado.

Malungo, não vamos esquecer nosso passado.

A poesia está na rua mesmo assim você não vê!

Mantenha a alma livre pra poder se defender.

(...)

Por fim, nomeiam-se alguns dos grupos indígenas brasileiros, os

primeiros malungos da terra, com a introdução de um fragmento da

música Chegança de Antônio Nóbrega e Wilson Freire.

Page 33: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 33

Sou Pataxó, sou Xavante, Cariri, Ianomâmi, sou

Tupy, Guarani, sou Carajá...

Sou Pancarurú, Carijó, Tupinajé, Potiguá, sou

Caeté, Fulniô, Tupinambá...55

O tecnobrega da banda Lauvaite Penoso é estruturado de forma

diferente. Mantém o mesmo ritmo, o mesmo andamento, as mesmas

interferências e ruídos eletrônicos do som das festas de aparelhagem, mas

incorpora instrumentos reais como guitarras, bateria e baixos. Não é um

tecnobrega inteiramente eletrônico, como o são a maior parte deles. Esse

arranjo dá uma tessitura diferente à música. Podemos ouvir momentos

com riffs de guitarra distorcida, dando maior densidade e agressividade

sonora para canção e, em outros momentos, o canto quase falado do rap

também complexifica a forma original, combinando com a tematização

crítica e urbana da letra.56 A composição apresenta, portanto, aspectos da

música massiva das periferias de Belém, mas com outra ambientação. Não

se trata mais da atmosfera festiva das festas de aparelhagem, nem de

anúncios da presença das “equipes” e fãs clubes que vão prestigiar a festa,

anunciados pelo DJs em meio à canção, e sim de um ambiente onde a

violência urbana atinge a todos, sobretudo a população da periferia. Trata-

se ainda de um ambiente que criminaliza as populações mais fragilizadas

pela pobreza e miséria e consequentemente coloca uns contra os outros,

fazendo com que a comunidade desses bairros se fragmente na violência

da juventude que assalta a população em suas bicicletas.

É curioso observar, ainda, que a primeira vez que ouvi a música Guamá

Sound System foi em uma apresentação da banda em um bar chamado Coisa

de Negro, no distrito de Icoaraci, periferia de Belém. Este espaço que já

existe há mais de uma década é caracterizado pela presença de um público

amante da música regional paraense. Alguns artistas e produtores culturais

ligados a este espaço participam de movimentos de valorização de gêneros

Page 34: Texto sobre o caso da Balandra francesa

34 • Revista Estudos Amazônicos

musicais como o carimbó. São, supostamente, grupos avessos à música

mercadológica. A apresentação de um tecnobrega, como a do grupo

Lauvaite Penoso, mostra como certas fronteiras de gosto começam a ser

relativizadas na medida mesma em que o tecnobrega, ao se amplificar para

além de seus espaços originários, também passou por modificações na

forma. Esse tecnobrega foi aceito sem dificuldade em um espaço

tradicionalmente associado à música regional e não comercial, um

ambiente onde um tecnobrega comum possivelmente não teria espaço.

Outros exemplos poderiam ser dados, mas esses dois casos

exemplificam suficientemente o fenômeno de alargamento e

transformação de uma forma musical originariamente marginal e periférica

rumo a outros espaços, do mundo das vanguardas ou da música entendida

como alternativa e crítica. Esse é um aspecto particularmente interessante

da territorialização do tecnobrega na história contemporânea de Belém.

Territorialidades sonoras e musicais

Até aqui falei em territórios e territorialidades sonoras e musicais. Para

finalizar este texto, caberia uma rápida definição do que penso sobre essas

categorias. Essas palavras derivam do latim, territorium, e de terra,

significando a ideia de “pedaço de terra apropriado”. O território é um

espaço incorporado por um ou mais atores sociais, demarcado e definido

por relações de poder, em suas várias dimensões. A territorialidade, como

fenômeno associado, entende as relações sociais estabelecidas no e a partir

do território. São relações que compreendem a noção de pertencimento,

de delimitação, de limites e fronteiras a partir das necessidades constituídas

pelos indivíduos e por coletividades em função de um determinado

espaço, de um território.57 Neste sentido, segundo o que nos falam alguns

Page 35: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 35

geógrafos como Marcelo Souza, o que define o território em primeiro

plano é exatamente seu caráter político, já que é fundamentalmente um

“campo de forças, as relações de poder espacialmente delimitadas e operando,

destarte, sobre um substrato referencial”.58

O controle ou a tentativa de controle territorial não se manifesta tão

somente pela presença física no espaço, mas também por relações de

pertencimento e por construções de simbologias associadas a um

determinado grupo. Assim, como bem observou Rogério Haesbaert:

(...) o território nasce com uma dupla conotação,

material e simbólica, pois etimologicamente aparece

tão próximo de terra-territorium quanto de terreo-

territor (terror, aterrorizar), ou seja, tem a ver com

dominação (jurídico-política) da terra e com a

inspiração do terror, do medo – especialmente para

aqueles que, com esta dominação, ficam alijados da

terra, ou no “territorium” são impedidos de entrar.

Ao mesmo tempo, por outro lado, podemos dizer

que, para aqueles que têm o privilégio de

plenamente usufruí-lo, o território pode inspirar a

identificação (positiva) e a efetiva “apropriação”.59

Esses autores não se referiam em suas formulações ao aspecto

propriamente sonoros e musicais das manifestações humanas no

território, mas a partir da observação do caso do tecnobrega em Belém, é

possível que se faça observações que caminham para essa perspectiva. No

caso de Belém e do tecnobrega em particular, tivemos a ampliação de um

território musical, a partir da expansão de um tipo particular de música.

Tivemos também a imposição de uma maneira específica de uso de

Page 36: Texto sobre o caso da Balandra francesa

36 • Revista Estudos Amazônicos

ambientes sonoros e musicais, na medida em que um tipo específico de

escuta se impôs para boa parte da cidade.

O tecnobrega como uma forma musical específica, ao se expandir

territorialmente, não expandiu apenas um tipo de música, mas sim um tipo

de audição, uma maneira de se fazer ouvir, uma cultura de consumo

musical, de ruídos e vozes. Expandiu, portanto, uma territorialidade

sonora, uma forma complexa de relação com a música e com o som em

sentido mais amplo. Não se escuta o tecnobrega com se escuta uma canção

clássica da MPB: quem o escuta normalmente o faz em alto volume, seja

numa aparelhagem do circuito bregueiro, seja na potência máxima de um

celular, seja em um carro com o som amplificado, seja em uma bicicleta

com caixas de som acopladas. Temos, assim, não só uma música em

expansão, mas uma forma ampla de se vivenciar a música e a cultura

festiva periférica.

Mais que isso, essa modalidade específica de tratamento e domínio do

ambiente acústico vem acompanhada de uma cultura territorial que

envolve a imposição de corpos dançantes das populações dos bairros

distantes, quase todos mestiços, negros, caboclos e indígenas, que

mostram uma habilidade excepcional na dança agitada e frenética do

tecnobrega. Há também a imposição de uma fala nasalada dos cantores e

cantoras de tecnobrega, que mostram uma dicção totalmente avessa ao

padrão de bom gosto nacional marcado pela ponderação, equilíbrio e

moderação bossanovista, que caracteriza em última instância a escuta da

MPB. Outros elementos poderiam ser ainda lembrados como formas de

vestir, de andar, o discurso sobre festa e o consumo de bebidas alcoólicas,

etc.

Sobre a densidade sonora pela qual se faz ouvir o brega, em geral, e o

tecnobrega, em particular, é bom lembrar as formulações feitas por

Schafer sobre aquilo que ele caracterizou como o “ruído sagrado”. Aquele

Page 37: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 37

autor argumentou que esse tipo de ruído é um som que se apresentava

como poder temeroso aos homens, aparecera inicialmente associado às

forças da natureza, tais como no caso do som do trovão, das ondas do

mar, do vento durante uma tempestade, de um vulcão em erupção etc.

Posteriormente, esses sons metamorfosearam-se em forças sociais,

tornaram-se ruídos criados por homens e por suas instituições. O que os

caracterizava era também a dominação do ambiente acústico. Isso

aconteceu com vários tipos de sons humanos, incluindo o caso das

máquinas, cada vez maiores e mais modernas, que surgiram no mundo

contemporâneo. Para Schafer, por exemplo, a revolução industrial se

impôs como força motriz da história contemporânea não só por sua

dinâmica econômica e tecnológica, mas também porque apresentava um

novo som, um novo ambiente acústico, tomado pelo tenebroso ruído que

impunha respeito aos homens: o ruído das máquinas. A dominação se

dava também pela conquista do ambiente acústico.60

Penso que o tecnobrega, como identidade estética, manifesta-se como

“ruído sagrado divergente” ou, quem sabe, seria um “ruído profano”,61

semelhante, mas proporcionalmente contrário ao que Schafer chama de

“ruído sagrado”. Ele também se impõe, amplificado, hipersonorizado, à

sociedade que o circunda, porém se impõe não apenas para gerar o

respeito e o temor dos homens, mas também para se fazer ouvir

dissonante, agressiva e invasivamente, a uma paisagem sonora estabelecida

pelas concepções de bom gosto.

Nesse sentido, ele disputa o campo acústico, se territorializa, estabelece

embate e relações tensão e poder. Em outros termos, se manifesta como

uma territorialidade sonora divergente, profana. “Com-sagrando-se” (ou

profanando-se) pelo “excesso”, pelo muito, pelo barulho, pelo uso do

tecnológico ao seu modo, pela absorção de elementos múltiplos, em

oposição ao moderado, à estética do “menos”, do “bom gosto”, à

percepção de harmonia sonora e social. O brega e o tecnobrega não foram

Page 38: Texto sobre o caso da Balandra francesa

38 • Revista Estudos Amazônicos

inventores disso. Sabe-se que outras formas musicais, como o reggae, o funk

etc., colocaram-se no ambiente sonoro da cidade, entre outras coisas,

também pelo volume de som, pela imposição sonora do “barulho”. Isso

parece ser, portanto, uma forma recorrente de luta pelo direito do controle

do ruído, como uma forma simbólica de luta pelo direito à cidade e à

cidadania. Na verdade, uma luta pelo direito ao ruído que se impõe ao

harmônico, cindindo-o, deixando as fissuras transparecerem a verdade

profunda do tecido social, a fragmentação que existe subjacente à aparente

ordem. Esse conjunto de fenômenos não deixa de exibir que a

“desordem”, o “ruído”, o “barulho” expressam uma dada historicidade

das divisões socioculturais em Belém do Pará. Todo esse estado de coisas

não deixa de ser uma luta que, no campo da cultura e das formas de uso

do som e da música, mostra que a cidade exibe, na verdade, uma falsa

calmaria, uma falsa harmonia, sendo, de fato, uma cidade cindida de sons

e de gentes.

Portanto, sem querer responder definitivamente a pergunta

provocativa que deu início a esse texto, eu diria que se o brega não venceu,

pelo menos ele desvendou e desnudou o campo, ou o território, das lutas

socioculturais.

Artigo recebido em março de 2014

Aprovado em maio de 2014

NOTAS

Page 39: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 39

Professor da UEPA e Doutor em História pela UFF. 1 Conferir: COSTA, Tony Leão da. “Música, literatura e identidade amazônica no

século XX: o caso do carimbó no Pará”. ArtCultura, Uberlândia, v. 12, n. 20, jan./jun.,

2010, p. 61-81 2 As aparelhagens são grandes equipamentos de som, compostas por uma base de

controle (uma “nave”, como comumente se fala), um ou mais DJs, caixas amplificadas

muito potentes e de altíssimo volume, recursos variados de iluminação, adereços

tecnológicos e telões. São normalmente usadas para sonorizar as festas da periferia de

Belém, sobretudo as festas de tecnobrega ou simplesmente “festas de aparelhagens”.

Gozam de grande popularidade e os nomes das principais aparelhagens são bastante

conhecidos e cultuados pelos frequentadores dessas festas, ocorrendo inclusive o

aparecimento de fãs clubes. Nas últimas décadas a popularidade dos DJs de

aparelhagens os levou a apresentarem programas de TVs e rádios, assim como a se

tornarem celebridades conhecidas em toda a região. Para um detalhamento do

aparecimento das primeiras “rádios de subúrbio”, ainda em 1941, e suas

transformações históricas que derivaram no aparecimento das atuais aparelhagens,

verificar: COSTA, Tony Leão da. Música de subúrbio: cultura popular e música popular

na hipermargem de Belém do Pará. Tese (Doutorado em História Social) – Instituto

de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de

Janeiro, 2013. Para uma excelente análise do “circuito bregueiro” paraense e da cada

vez mais estreita associação entre “festas de aparelhagens” e o gênero musical

tecnobrega, conferir: COSTA, Antonio Maurício Dias da. A festa na cidade: o circuito

bregueiro de Belém do Pará. 2 ed. Belém: EDUEPA, 2009. 3 Ofício de Roberto Camelier, Diretor-gerente da Rádio Clube do Pará, dirigido ao

diretor geral do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda (DEIP). Caixa:

Comunicação, Série: Ofícios, Pasta: julho, 31 de julho de 1941, Acervo: Arquivo

Público do Estado do Pará. Este documento me foi gentilmente cedido pelo

historiador Érito Vânio Oliveira, pesquisador da história do rádio na Amazônia. Para

mais informações sobre a história do rádio na região amazônica e sobre a atuação de

Roberto Camelier e os demais fundadores da Rádio Clube do Pará, conferir:

OLIVEIRA, Érito V. B. Modernidade e integração na Amazônia: intelligentsia e broadcasting

no entre guerras, 1923-1937. 2011. Dissertação (Mestrado em História Social da

Amazônia) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2011.

4 COSTA. Música de subúrbio. 5 Tipologia ideal inspirada na forma weberiana de análise sociológica. Conferir:

WEBER, Max. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. São Paulo: Cia. das Letras,

2004. 6 Essa descrição do debate em torno do tecnobrega reproduz em boa parte artigo

anterior publicado no site Ponto Zero, em 2011. Conferir: COSTA, Tony Leão da.

“Tecnobrega: crítica e preconceito”. Disponível em:

<http://www.pontozero.net.br/>. Acesso em: 17 mai. 2011.

Page 40: Texto sobre o caso da Balandra francesa

40 • Revista Estudos Amazônicos

7 PINTO, Lúcio Flávio. “A poluição tecnobrega”. Disponível em: <http://www.lucioflaviopinto.com.br/?p=622>. Acesso em: 10 jan. 2011. 8 BENTES, Helder. “Tá beba??? Tá doida??? Patrimônio cultural e artístico???

Só se for da...”. Disponível em: <

http://www.orm.com.br/helderbentes/capa/?codigo=519678>. Acesso em: 10

mai. 2011. 9 BENTES, Helder. “O paraensismo desinformado que vetou o tecnomelody”.

Disponível em: <http://www.orm.com.br/helderbentes/capa/?codigo=528026>.

Acesso em: 10 mai. 2011. 10 Sobre a polêmica em torno da Banda Djavú e a música paraense, verificar: “Banda

Djavú comenta polêmica do tecnobrega”. Disponível em:

<http://mais.uol.com.br/view/92db81ral8qx/banda-djavu-comenta-polemica-do-

tecnobrega-04023270C8991386?types=A>. Acesso em: 10 dez. 2013. Também:

“Toda verdade sobre o plágio chamado BANDA DJAVÚ”. Disponível em:

<http://www.bregapop.com/felipe-languer-bomba-do-felipe/6047> Acesso em: 10

dez. 2013. 11 Os leitores perceberão que a palavra tecnobrega não foi citada na lei. Em torno

disso, houve e há ainda um amplo debate que envolve muitos artistas dessa vertente

e o público em geral. Para certos grupos a palavra “brega” representaria um entrave,

uma dificuldade, para que se chegasse ao sucesso desse gênero musical em termos

nacionais. A forma que a lei foi redigida em certa maneira expressa esse debate:

preferiu-se o termo tecnomelody ao tecnobrega. Meus objetivos neste artigo não me

permitem adentrar nesse assunto, mas é necessário que se diga que há uma série de

termos utilizados pelos próprios “bregueiros” para se autodefinirem. Isso é verificável

inclusive pela criação de um “glossário bregueiro” escrito pelo guitarrista lambadeiro

e produtor cultural Manoel Cordeiro, pelo cantor e compositor Tonny Brasil e pelo

autodenominado pesquisador de música brega Carlos Alberto Aguiar. Tal glossário

apresenta os vários nomes possíveis de serem encontrados no mundo tecnobrega e

naquilo que é visto como subgêneros do mesmo como, por exemplo, “Eletro

Melody”, “Brega Melody”, “Brega Dance”, “Brega Calipso”, “Brega Pop” e assim por

diante. Sobre essa questão, conferir: AGUIAR, Carlos Alberto; CORDEIRO, Manoel;

BRASIL, Tonny. “Glossário bregueiro - 1990-2013”. Disponível em:

<http://www.bregapop.com/servicos/historia/314-glossario/34-glossario-

bregueiro-carlos-alberto-aguiar-manoel-cordeiro-e-tonny-brasil>. Acesso em: 15 abr.

2013. Tendo em vista que a palavra tecnobrega me parece a mais popular aos

apreciadores e detratores do gênero em Belém, e é, portanto, o termo nativo mais

recorrente, faço uso dela para me referir a esse conjunto mais complexo e amplo da

música popular. 12 PINTO, Lúcio Flávio. “A poluição tecnobrega”. Disponível em:

<http://www.lucioflaviopinto.com.br/?p=622>. Acesso em 10 jan. 2011.

Page 41: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 41

13 NAPOLITANO, Marcos. Música e História. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. p. 71. Sobre o papel da MPB com padrão estético e seu alargamento nos anos 1980, conferir: SANDRONI, Carlos. “Adeus à MPB”. In: CAVALCANTE & STARLING & EISENBERG (Orgs). Decantando a República: Inventário Histórico e Político da Canção Popular Moderna Brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: Fund. Perseu Abramo, 2004. 14 ARAÚJO, Paulo C. Eu não sou cachorro, não: música popular cafona e ditadura militar. São Paulo: Ed. Record, 2003. 15 PINTO, Lúcio Flávio. “A poluição tecnobrega”. Disponível em:

<http://www.lucioflaviopinto.com.br/?p=622>. Acesso em: 10 jan. 2011. 16 Para um melhor entendimento sobre a tradição da “boa música” paraense e sua

relação com a música bossanovista e a MPB, conferir: COSTA, Tony Leão da. Música

do Norte: intelectuais, artistas populares, tradição e modernidade na formação da

“MPB” no Pará (anos 1960 e 1970). Dissertação (Mestrado em História Social da

Amazônia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do

Pará, Belém, 2008. 17 Essa observação tem por base não exclusivamente os artigos citados aqui, mas

também a observação in loco, ou “observação participante”, do debate no meio cultural

de Belém da última década. Sobre o brega dos anos 1980 no Pará, verificar: COSTA,

Tony Leão da. “Notas sobre o ‘brega’ no Pará”. In: FACINA, Adriana (Org.). Vou

fazer você gostar de mim. Rio de Janeiro: Editora Multifoco/Iluminaria Acadêmica, 2011.

p. 127-164. 18 BENTES, Helder. “Tá beba??? Tá doida??? Patrimônio cultural e artístico???

Só se for da...”. Disponível em: <

http://www.orm.com.br/helderbentes/capa/?codigo=519678>. Acesso em: 10

mai. 2011. 19 Idem. 20 PINTO, Lúcio Flávio. “A poluição tecnobrega”. Disponível em:

<http://www.lucioflaviopinto.com.br/?p=622>. Acesso em: 10 jan. 2011. 21 Disponível em:

<http://www.belemdopara.com.br/detalhe.bdop?conteudo=1414>. Acesso em: 10

jan. 2011. 22 PINTO, Lúcio Flávio. “A poluição tecnobrega”. Disponível em:

<http://www.lucioflaviopinto.com.br/?p=622>. Acesso em: 10 jan. 2011. 23 ARAÚJO, Anderson. “Os sociólogos de aparelhagem”. Disponível em:

<http://www.belemdopara.com.br/detalhe.bdop?conteudo=1414>. Acesso em: 10

mai. 2011. Para um balanço da polêmica em torno do tecnobrega e, particularmente,

os bastidores do embate entre os críticos em torno da deia de “sociólogos de

aparelhagem”, conferir: AMADOR, Elielton. “A polêmica do tecnobrega”.

Disponível em: <http://qualquerbossa.blogspot.com.br/2011/07/artigo-sobre-

tecnobrega.html>. Acesso em: 25 jan. 2014.

Page 42: Texto sobre o caso da Balandra francesa

42 • Revista Estudos Amazônicos

24 Conferir: CUNHA, Vladimir. “A encruzilhada do tecnobrega”. Disponível em: <http://diariodopara.diarioonline.com.br/N-131523-OPINIAO++A+ENCRUZILHADA+DO+TECNOBREGA.html>. Acesso em: 25 jan. 2014. Vladimir Cunha também foi diretor de um filme sobre esse tema, o documentário “Brega S/A”. 25 Para noção de “ambiente acústico”, conferir: SCHAFER, R. Murray. A afinação do

mundo. São Paulo: UNESP, 2001. 26 Para a concepção tradicional de “indústria cultural”, conferir: ADORNO, Theodor;

HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de

Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985.

27 COSTA. A festa na cidade. 28 Conferir, dentre outros: SILVA, José M. “Música brega, sociabilidade e identidade na Região Norte”. ECO-PÓS, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, jan.-jul. 2003, p. 123-135; VIANNA, Hermano. “A música paralela”. Folha de São Paulo, São Paulo, 12 out. 2003. Caderno Mais! p. 10-11; LEMOS, Ronaldo (et al). Tecnobrega: o Pará reinventando o negócio da música. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2008. (Tramas urbanas; 9); COSTA. A festa na cidade; e, COSTA, Antonio M. D. “Festa e espaço urbano: meios de sonorização e bailes dançantes na Belém dos anos 1950”. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 32, n. 63, 2012, p. 381-402. 29 LEMOS. Tecnobrega. p. 22. 30 Isso é amplamente mostrado em trabalhos como: SALLES, Vicente. A modinha no

Grão-Pará: estudos sobre ambientação e (re)criação da modinha no Grão-Pará. Belém:

Secult/IAP/AATP, 2005. (Transcrições musicais por Marena Isdebsky Salles).

31 Conferir: CARDOSO, A. C. D. (Org.). O Rural e o Urbano na Amazônia: diferentes olhares em perspectiva. Belém: EDUFPA, 2006; e CASTRO, E. “Urbanização, pluralidade e singularidades das cidades amazônicas”. CASTRO, Edna. (Org.). Cidades na floresta. São Paulo: Annablume, 2008. 32 CANCELA, Cristina. D.; CHAMBOULEYRON, Rafael. (Orgs). Migrações na

Amazônia. Belém: Ed. Açaí/Centro de Memória da Amazônia/PPGA, 2010. 33 PENTEADO, Antonio R. Belém – Estudo de geografia urbana. Belém: UFPA, 1968. v.

1. 34 JURANDIR, Dalcídio. Belém do Grão-Pará. Belém: EDUFPA; Rio de Janeiro:

Fundação Casa de Ruy Barbosa, 2004. 35 DE CAMPOS RIBEIRO, José G. Gostosa Belém de outrora... Belém: SECULT, 2005.

36 REIS, Nélio. Subúrbio. Rio de Janeiro: José Olympio, 1937.

37 RODRIGUES, Carmem I. Vem do bairro do Jurunas. Belém: NAEA, 2008. 38 SILVA, Marcos A.P. A cidade vista através do porto: múltiplas identidades urbanas e

imagem da cidade na orla fluvial de Belém (PA). 2006. Dissertação (Mestrado em

Ciências Sociais) - Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-

Graduação em Ciências Sociais, Universidade Federal do Pará. Belém, 2006; e,

MARIN, R. A. “Portos e trapiches de Belém”. SIMPÓSIO AMAZÔNIA, CIDADES

Page 43: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 43

E GEOPOLÍTICA DAS ÁGUAS, 2003, Belém. Anais... Belém: NAEA/ UFPA,

2003, p. 78-79. 39 É importante considerar que o termo “caboclo” na maior parte das vezes representa

muito mais uma categoria atribuída por agentes externos às populações rurais e

periféricas urbanas da Amazônia. Não se trata propriamente de um termo de

autorreconhecimento por partes das populações locais. Apesar disso, o usarei aqui de

maneira genérica para me referir aos moradores mestiços do campo, das cidades

interioranas e das periferias urbanas de Belém. Para detalhes sobre os usos dessa

categoria, conferir: LIMA, Deborah M. “A construção histórica do termo caboclo:

sobre estruturas e representações sociais no meio rural amazônico”. Novos Cadernos

NAEA, Belém, v. 2, n. 2, p. 5-32, dez. 1999. RODRIGUES, Carmem I. “Caboclos

na Amazônia: identidade na diferença”. Novos Cadernos NAEA, Belém, v. 9, n. 1, p.

119-130, jun. 2006. 40 SALLES, Vicente. O negro na formação da sociedade paraense. Belém: Paka-Tatu, 2004;

e, MARIN, Rosa. A.; CASTRO, Edna. No caminho de pedras de Abacatal: experiência

social de grupos negros no Pará. Belém: NAEA-UFPA, 2004.

41 GILROY, Paul. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Candido Mendes, Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2012. 42 LEAL, Luiz A. P. A política da capoeiragem: história social da capoeira e do boi-bumbá no Pará republicano (1888-1906). Salvador: EDUFBA, 2008. 43 A ideia de “abrasileiramento” de gêneros caribenhos devo a: OLIVEIRA, Alfredo. Ritmos e cantares. Belém: SECULT, 2000. 44 A ideia de subúrbio, ou hipermargem, como mediador da música paraense no século

XX até os dias de hoje, verificar: COSTA. Música de subúrbio. 45 “Bate estaca” é um termo comumente utilizado para se fazer referência ao

tecnobrega, por indivíduos que não apreciam esse tipo de música. É um termo correto,

que faz parte do cotidiano da cidade. 46 A FUNTELPA (Fundação de Telecomunicação do Pará) é a rede de TV e rádio

públicas do estado. É responsável pela retransmissão da programação da TV Cultura

e da Rede Brasil, assim como é produtora de uma ampla programação local,

normalmente de conteúdo educativo e informativo. No caso da Rádio Cultura do

Pará, ocorre uma programação voltada para a música considerada de “bom gosto”,

seja ela associada à MPB ou a gêneros musicais “não comerciais” e “alternativos”, ou

ainda a música clássica e o chorinho.

47 Conferir: “O QUE é Terruá Pará”. Disponível em: < http://terruapara.com.br/o-que-e/>. Acesso em: 5 maio 2013. 48 Seria interessante que outros trabalhos de pesquisa pudessem ser realizados sobre

essa questão da fala e da dicção dos cantores e cantoras de tecnobrega em Belém.

Creio que esse aspecto é muito relevante, pois demonstra elementos da cultura

interferindo diretamente no sotaque e na tessitura sonora tanto da fala como das

músicas daí derivadas. Só um cantor ou cantora de tecnobrega cantam de determinada

Page 44: Texto sobre o caso da Balandra francesa

44 • Revista Estudos Amazônicos

maneira e esse elemento revela aspectos significativos de uma territorialização que é,

ao mesmo tempo, cultural (e necessariamente corpórea), sonora e musical. 49 Esse texto já foi analisado por Antonio Maurício Costa e por mim, respectivamente

em: COSTA. A festa na cidade; COSTA. “Notas sobre o ‘brega’ no Pará”; e, COSTA.

Música de subúrbio. Para mais detalhes sobre o documento conferir: NEVES, Júnior.

Brega: de 1980 a 2005: do Brega Pop ao Calypso do Pará. Disponível em:

<http://www.bregapop.com/servicos/historia/327-jr-neves/58-do-brega-pop-ao-

calypso-do-para-jr-neves>. Acesso em: 3 abr. 2010.

50 Já citei acima alguns desses autores e seus respectivos trabalhos sobre a música brega. Outras produções ainda não citados aqui são: AMARAL, Paulo Murilo Guerreiro de. Estigma e Cosmopolitismo no Tecnobrega de Belém. Disponível em: <http://www.overmundo.com.br/overblog/estigma-e-cosmopolitismo-no-tecnobrega-de-belem-2>. Acesso em: 15 abr. 2013; e, COSTA, Tony L. “Carimbó e brega: indústria cultural e tradição na música popular do norte do Brasil”. Revista Estudos Amazônicos, Belém, v. VI, n. 1, p. 149-177, 2011. 51 Depoimento de Felipe Cordeiro, Belém, 6 nov. 2012.

52 Idem. 53 É importante considerar que essas mediações entre os mundos da cultura massiva

paraense e a música jovem e de vanguarda, do rock e de outros gêneros associados a

um mundo moderno e urbano, já haviam ocorrido em outros momentos da história

da música no Pará. Contemporaneamente é bom lembrar a atuação de bandas como

Cravo Carbono e da atuação do guitarrista Pio Lobato em uma aproximação criativa

influente entre a cena rock e o universo das guitarradas e do tecnobrega no início dos

anos 2000.

54 No Dicionário Aurélio lemos sobre o verbete “Malumgo”: “Companheiro, camarada.

/ Nome que se davam mutuamente os negros escravos vindos da África no mesmo

navio. / Bras. Irmão colaço, irmão de criação”. Disponível em:

<http://www.dicionariodoaurelio.com/Malungo.html>. Acesso em: 10 jan. 2014.

55 Segundo informações de um dos integrantes da banda, essa parte da música aparece

apenas nas apresentações ao vivo, pois o grupo ainda precisava da autorização dos

autores para que o fragmento fosse definitivamente incluído em uma gravação final.

56 Conheço duas versões da música: uma ao vivo gravada em uma apresentação no

bar Coisa de Negro em 2013 e uma gravação de estúdio, a mim cedida por Rodrigo

Ethnos, um dos vocalistas da banda. Obviamente que a versão ao vivo apresenta

algumas variações. Nela as guitarras são mais evidentes e no fim da música o

andamento do tecnobrega se transforma em um quase punk rock. Segundo Rodrigo

Ethnos a autoria da música é coletiva, sua com a participação dos demais integrantes

da banda. Para a versão ao vivo, conferir: Guamá sound system. Disponível em:

<https://soundcloud.com/lauvaitepenoso/guam-sound-system>. Acesso em: 10

jan. 2014.

Page 45: Texto sobre o caso da Balandra francesa

Revista Estudos Amazônicos • 45

57 ALBAGLI, Sarita. “Território e territorialidade”. In: LAGES, Vinícius; BRAGA,

Christiano; MORELLI, Gustavo (Orgs.). Territórios em movimento: cultura e identidade

como estratégia de inserção competitiva. Rio de Janeiro: Relume Dumará/Brasília:

SEBRAE, 2004. p. 23-69.

58 SOUZA, Marcelo Lopes de. “O território: sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento”. In: CASTRO, I. et al. (Org.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995. p. 97, grifos do autor. 59 HAESBAERT, Rogério. “Território e multiterritorialidade: um debate”. GEOgraphia, Niterói, ano IX, n. 17, p. 19-45, 2007. p. 20. 60 SCHAFER. A afinação do mundo. 61 Devo a ideia de “ruído profano” às observações de Adriana Facina.