Sobre Manuel Bandeira e o último poema

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Analise do poema "o último poema"

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Anlise do poema O ltimo poema de Manuel Bandeira

O ltimo poema

Assim eu quereria meu ltimo poemaQue fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionaisQue fosse ardente como um soluo sem lgrimasQue tivesse a beleza das flores quase sem perfumeA pureza da chama em que se consomem os diamantes mais lmpidosA paixo dos suicidas que se matam sem explicao

Esse poema expressa o desejo intimo de Manuel sobre como ele quer ser lembrado a partir de um resumo da sua obra potica.

A preparao para a morte essa constatne na vida de Bandeira, muito recorrente em sua poesia, que traz sempre novos folegos e como a mais pessoal das prontides intimas1 (villaa), sua raiz vem da juventude do poeta que por conta da tuberculose esperou a chegada da morte desde os 17 anos. Nesse poema ele a trata a amiga intma que , mas com quem ele vai se encontrar inevitavelmente depois de longos anos de espera e de relances breves ao longe, mas ainda com a incerteza de quando, o que aparece logo no primeiro verso Assim eu quereria meu ltimo poema e traz um paralelo possvel com o poema Consoada:

Quando a Indesejada das gentes chegar(No sei se dura ou carovel)talvez eu tenha medoTalvez sorria, ou diga:- Al, iniludvel!O meu dia foi bom, pode a noite descer.(A noite com seus sortilgios.)Encontrar lavrado o campo, a casa limpa, A mesa posta,Com cada coisa em seu lugar. 2

Onde a morte de novo se faz presente e intima, e volta no poema a aceitao da morte e a preparao para a sua chegada. Um sentimento de completude da vida que s possvel com o acolhimento do fato de que ela termina, mas que pode terminar calma e sutil tendo um certo esforo para tal. Bandeira ainda reafirma esse sentimento nas linhas finais de seu livro Itinerrio de Pasargada utilizando, tambm, Consoada.

Os versos 2 e 3 Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais/ Que fosse ardente como um soluo sem lgrimas so a representao de todo sentimentalismo em sua obra, apesar de mais forte e cru nos primeiros livros por conta da pouco idade e do inconformismo com a falta de horizonte de vida - os anos de vida e os novos estilos de escrita o maturaram a ponto de ficar nesse misto equilibrado de realidade, solido e melancolia.

O soluo sem lgrimas evoca uma imagem de grande sofrimento, mas tambm de grande resignao. Um querer de chorar, mas sem essa possibilidade, como algum que j passou por muitas coisas mas cada novo obstaculo traz sua dor e seu sofrimento. J o dizer das coisas mais simples e menos intecionais traz a imagem da simplicidade falada, experimentada, vivida por muitos anos em especial os de pobreza no apartamento da Rua Curvelo e desejada na poesia. Desejo de simplicidade desenvolivido a partir da observao das formas pequenas da vida e da viso de vidas tantas simples do rural e do urbano atravs das janelas das casas. Citando Srgio Buarque: Manuel Bndeira jamais se deixou seduzir mutio pelos hermetismos e pelos estetismos, que constituem formas aristocrticas de recluso, intolerveis para quem aspira a vencer, atravs da poesia, sua prpriaa recluso e seu confinamento. 3

Recluso e confinamento do doente que tinha o simlpes desejo de viver.

A simplicidade na fala de Manuel se confirma na ideia de que possvel copia-lo e fazer poemas como os seus. Ideia essa superficial e absurda, pois ao mesmo tempo em que usa palavras simples usa tambm de pensamentos complexos e emoes raras que requerem toda a empatia humana para serem sentidas.

Outro ponto de reforo a simplicidade do poeta seu fascnio pelas coisas pequenas e vulgares da vida cotidiana, fruto dos ensinamentos do seu pai a quem tanto admirava sobre como a poesia pode estar em qualquer lugar. possvel ver isso nos versos 4 e 5 Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume . Uma flor quase sem perfume pode ser muito bem dita como uma flor ordinria e sem valor , mas ao ser comparada com a poesia seu valor aumenta e ela passa a ter um status elevado de beleza para quem consegue visualizar alm da sua ordinariedade. J que para o poeta a poesia no est mais no mundo da lua, mas na terra dos homens, no cho do cotidianao. 4( o humilde cotidianao)A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais lmpidos provoca uma imagem paradoxal: diamantes so, na cultural ocidental, representaes do amor e da eternidade por serem resistentes e formados a partir de altissima presso, mas eles tambm no podem ser consumidos pelo fogo as chamas teriam que ser de uma temperatura maior de 4000C, o que refora a ideia de chama pura.

Libertinagem, livro que encerrado pel'O ltimo poema, foi o primeiro livro modernista de Bandeira, nele possvel ver a quebra com as escolas literarias anteriores (simbolismo principalmente) atrves do uso simples da lngua e da tematica nova cotidiano, recordaes da infncia e o lirismo da cidade. Esses elementos tambm esto presentes em larga escala n'O timo poema com toda sua experimentao, simplicidade e lirismo melanclico.

Por fim, no ltimo verso A paixo dos suicidas que se matam sem explicao Bandeira aproxima dois polos da sua criao potica: o amor paixo e a morte suicidas que se matam.O amor e a morte so trazidos ao nvel da experincia diria, colorindo-se de uma ternura clida, dando fora comunicativa a um verso que nem sempre fcil, mas que tranquiliza o leitor pela humanidade fraterna com que organiza a desordem e o tumulto das paixes, conferindo-lhes uma gengeralidade que transcende a condio biogrfica. (introduo)

Como dois conceitos necessarios e arraigados na vida do poeta, como o ar que respira, o amor e a morte esto como em paralelos mas que se misturam e trazem imagens sublimes das emoes humanas ao poema, sem nunca cair em clichs . So fortes, porm no exagerados. Como uma pequena chama que traz calor e esperana na vida.

A morte ameaa de cada dia, se faz companheira cotidiana (o humilde cotidiano) do poeta, por isso sempre to presente na sua poesia de circuntncia, poesia de poeta menor, de quem aprendeu a se resignar da demora, de quem ao esperar sua hora viu a de tantos outros, queridos e amados, chegar.