Paulo a Lei e a Nova Aliança

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PAULO, A LEI E A NOVA ALIANÇA* Hans K. LaRondelle O tema clássico de toda a teologia cristã é a relação de lei e graça. Já o Evangelho de João distinguiu ambos: “Porque a lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo.” (João 1:17). Quis João colocar estas duas expressões do mesmo Deus como contrastes fundamentais da vontade de Deus? Ensina o Novo Testamento uma substituição de Moisés por Cristo, de forma que a lei de Deus não é mais obrigatória, tendo servido seu propósito agora que Cristo veio? Temos nós que assumir que o antigo Israel foi salvo pela guarda da lei, mas que Deus mudou o modo de salvação para os cristãos como salvação pela fé em Cristo? Será que a graça de Deus em Cristo anulou Sua lei moral que foi acrescentada ao coração humano, mas foi apagada em grande parte da consciência humana? A terminologia "Velho testamento" e "Novo Testamento" não é usada com referência às Escrituras pelos autores bíblicos e não tem nenhuma autoridade apostólica. Foi inventada por Orígenes no terceiro século para indicar convenientemente os períodos principais da antiga e nova aliança. Mas esta divisão em compartimentos das alianças de Deus conduziu a um engano difundido sobre a natureza dos dois Testamentos, como se os livros do Antigo Testamento não são nada além de livros da Lei ou um "tutor" para levar a Cristo, e portanto irrelevante para os cristãos. David H. Roper expressou o problema eloqüentemente: "O ponto crucial deste assunto inteiro é uma falsa equação do Velho Testamento e a lei", de forma que os dois testamentos "são postos em descontinuidade quase total entre si. Lei e graça são vistas como princípios antitéticos, adversários. O Velho Testamento é lei; o Novo Testamento é graça. 1 Esta má concepção do "Velho" Testamento conduziu muitos cristãos a construir lei e a graça em dois distintos e sucessivos períodos de dispensação: para Israel só lei, para a igreja só graça. LEI GRAÇA _______________________ ________________________ Porém, a teologia protestante clássica defendeu que a lei e a graça são temas que correm juntos do Gênesis até o Apocalipse. LEI ___________________________________________________ GRAÇA _______________________________________________ Os dois diagramas visualizam o assunto fundamental. A Teologia de Paulo sobre a Lei e a Graça A relação da lei de Deus para com a justificação pela fé era uma preocupação principal de Paulo. O seu tratamento polêmico da lei desenvolveu-se do seu antecedente como fariseu e o seu zelo anterior pela lei. Ele testemunhou aos Filipenses que ele era "hebreu de hebreus; quanto à lei, fariseu, quanto ao zelo, perseguidor da igreja; quanto à

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Page 1: Paulo a Lei e a Nova Aliança

PAULO, A LEI E A NOVA ALIANÇA*

Hans K. LaRondelle

O tema clássico de toda a teologia cristã é a relação de lei e graça. Já o Evangelho

de João distinguiu ambos: “Porque a lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça e a

verdade vieram por meio de Jesus Cristo.” (João 1:17).

Quis João colocar estas duas expressões do mesmo Deus como contrastes

fundamentais da vontade de Deus?

Ensina o Novo Testamento uma substituição de Moisés por Cristo, de forma que a

lei de Deus não é mais obrigatória, tendo servido seu propósito agora que Cristo veio?

Temos nós que assumir que o antigo Israel foi salvo pela guarda da lei, mas que Deus

mudou o modo de salvação para os cristãos como salvação pela fé em Cristo? Será que

a graça de Deus em Cristo anulou Sua lei moral que foi acrescentada ao coração

humano, mas foi apagada em grande parte da consciência humana?

A terminologia "Velho testamento" e "Novo Testamento" não é usada com

referência às Escrituras pelos autores bíblicos e não tem nenhuma autoridade apostólica.

Foi inventada por Orígenes no terceiro século para indicar convenientemente os

períodos principais da antiga e nova aliança. Mas esta divisão em compartimentos das

alianças de Deus conduziu a um engano difundido sobre a natureza dos dois

Testamentos, como se os livros do Antigo Testamento não são nada além de livros da

Lei ou um "tutor" para levar a Cristo, e portanto irrelevante para os cristãos.

David H. Roper expressou o problema eloqüentemente: "O ponto crucial deste

assunto inteiro é uma falsa equação do Velho Testamento e a lei", de forma que os dois

testamentos "são postos em descontinuidade quase total entre si. Lei e graça são vistas

como princípios antitéticos, adversários. O Velho Testamento é lei; o Novo Testamento

é graça. 1

Esta má concepção do "Velho" Testamento conduziu muitos cristãos a

construir lei e a graça em dois distintos e sucessivos períodos de dispensação: para

Israel só lei, para a igreja só graça.

LEI GRAÇA _______________________ ________________________

Porém, a teologia protestante clássica defendeu que a lei e a graça são temas que

correm juntos do Gênesis até o Apocalipse.

LEI ___________________________________________________

GRAÇA _______________________________________________

Os dois diagramas visualizam o assunto fundamental.

A Teologia de Paulo sobre a Lei e a Graça

A relação da lei de Deus para com a justificação pela fé era uma preocupação

principal de Paulo. O seu tratamento polêmico da lei desenvolveu-se do seu antecedente

como fariseu e o seu zelo anterior pela lei. Ele testemunhou aos Filipenses que ele era

"hebreu de hebreus; quanto à lei, fariseu, quanto ao zelo, perseguidor da igreja; quanto à

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justiça que há na lei, irrepreensível." (Filip. 3:5, 6; grego: en nomôi, "justiça na lei"

como na NKJV).

C.E.B. Cranfield enfatiza que "a língua grega dos dias de Paulo não possuía

nenhuma palavra que correspondesse ao nosso 'legalismo' ”, e assim “foi seriamente

dificultado no trabalho de esclarecer a posição cristã com respeito à lei.” 2

Paulo

explicou que, como fariseu, ele estava buscando uma “justiça própria, que procede de

lei” (v. 9). Ele assim contrastou nitidamente o seu zelo farisaico pela lei com sua fé

cristã, tendo “a justiça que procede de Deus, baseada na fé”.

P: Será que Paulo culpou a lei de Deus por seus esforços em alcançar uma justiça

legalística, ou sua própria tradição farisaica era culpada de um mau uso fundamental da

lei? Este é o ponto crítico!

Paulo escreveu declarações aparentemente contraditórias sobre a lei. No mesmo

capítulo declara ele que nós fomos “lançou da lei” por “morrendo ao que uma vez nos

saltou” (Rom. 7:6), e também que a lei é “santa; e o mandamento, santo, e justo, e bom

... a lei é espiritual” (7:12, 14). Aparentemente, Paulo não culpa a lei de Deus por sua

anterior escravidão à lei. Ele confessa que ele próprio teve que morrer à lei, não que a

lei teve que morrer à ele (v. 6)!

Ele força este ponto novamente em Romanos 7, “Acaso o bom [a lei de Deus] se

me tornou em morte? De modo nenhum! Pelo contrário, o pecado, para revelar-se como

pecado, por meio de uma coisa boa, causou-me a morte, a fim de que, pelo

mandamento, se mostrasse sobremaneira maligno” (7:13).

Aqui nós temos a declaração explícita de Paulo de que o problema não está com a

lei, mas com a sua natureza humana pecadora que não se conhece a si mesma à luz de

Deus, e portanto precisa ser despertada à sua pecaminosidade através da confrontação

com a lei de Deus e assim ser feita responsável diante de Deus (veja Rom. 3:20). É

como se Paulo estivesse olhando num espelho espiritual para reconhecer a sua

verdadeira condição diante de Deus (veja Tia. 1:23-24).

Ele define o propósito espiritual da lei claramente: “Visto que ninguém será

justificado diante dele por obras da lei, em razão de que pela lei vem o pleno

conhecimento do pecado” (Rom. 3:20). A lei de Deus assim pretende revelar que nossa

transgressão de seus mandamentos é culpa diante de Deus. Isso é para Paulo uma

função da lei ordenada por Deus, para que o homem possa entender mais plenamente

sua necessidade da graça de Deus no dom de Cristo. Paulo explica a relação entre a lei e

a graça em Rom. 5.

“A lei foi acrescentada [à promessa, Gál. 3:19] para que a transgressão

aumentasse. Mas onde aumentou o pecado, mais aumentou a graça, a fim de que, da

mesma maneira que pecado reinou na morte, também a graça reine pela justiça para

trazer vida eterna por meio de Jesus Cristo nosso Senhor” (Rom. 5:20-21, New

International Version).

Usar a lei moral, porém, como um termômetro de nosso própria guarda da lei

diante de Deus é um sério mau uso da lei, até mesmo outro pecado, porque rejeita a

necessidade da graça soberana de Deus para nossa justificação. A rejeição da graça de

Deus é igualmente tanto pecado quanto a rejeição da lei de Deus!

Paulo também usou o termo “lei” no sentido mais amplo do Torah de Moisés,

como em Romanos 3:21, onde ele fala da "Lei e os Profetas". Paulo considera a lei de

Moisés em sua totalidade como uma preparação para o evangelho da graça redentora de

Deus, quando ele declara: “O fim [alvo] da lei é Cristo, para justiça de todo aquele que

crê” 10:4).

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O erudito adventista do Novo Testamento Robert Badenas conclui que Paulo usa

nomos [“lei”] em Romanos 10:4 “no sentido do Torah como representando a Escritura:

o AT, não como algo ‘velho’ que foi ab-rogado por Cristo mas antes como a viva

palavra de Deus [..], sempre verdadeiro em si (9,6) e, portanto, sempre válido e novo”

(148).

Paulo viu o Antigo Testamento como testemunhando de Cristo, para que “Cristo

seja o cumprimento e o clímax da revelação de Deus à humanidade” (149). Para Paulo

Cristo Se tornou a chave para uma nova hermenêutica. Ele leu o Torah à luz de Cristo.

Ele já não pôde ver a lei como um fim em si mesma mas como um meio para conduzir a

Cristo.

Romanos 10:4 é amplamente reconhecido como uma das teses fundamentais da

teologia de Paulo relativo à relação de Cristo e a lei.3 Paulo foi convencido pela própria

experiência que o seu contemporâneo Israel tinha entendido mal a lei de Moisés, porque

“não se sujeitaram à justiça de Deus” (Rom. 10:3). Ele portanto apela ao livro de

Deuteronômio de Moisés para provar que o propósito ordenado por Deus do Torah

estava desde o começo a “justiça que é pela fé”: “ ‘a palavra está perto de ti, na tua

boca e no teu coração’; isto é, a palavra da fé que pregamos” (Rom. 10:8, citando Deut.

30:14). Paulo dá às palavras de Moisés em Deuteronômio 30 um conteúdo

cristocêntrico, por encher a “boca” com a confissão de que Jesus é o Senhor [Kyrios]”, e

o “coração” com a convicção que “Deus o ressuscitou dentre os mortos”. Paulo assim

aplicou as palavras de Moisés à sua verdade evangélica de que o crente em Cristo está

agora sendo “salvo” através da justificação pela fé em Cristo (Rom. 10:9-10).

Esta função preparatória do Torah demonstra que a salvação não pode vir da

observância da lei. Paulo declara isto categoricamente: “Por obras da lei, ninguém será

justificado” (Gál. 2:16); e até mais forte: “Todos os que confiam nas obras da lei estão

debaixo de maldição” (Gál. 3:10, New International Version). Ele argumenta: “Se

tivesse sido dada uma lei que pudesse conceder vida, certamente a justiça teria vindo da

lei” (Gál. 3:21, New International Version). Paulo expressou sua teologia da lei e graça

mais vigorosamente para os gálatas, declarando,:

“Não anulo a graça de Deus; pois, se a justiça é mediante a lei, segue-se que

morreu Cristo em vã” (Gál. 2:21).

Q: Qual foi o contraste absoluto que Paulo fez aqui? Foi realmente o contraste

entre lei e graça? Ou foi a antítese irreconciliável da justiça pela lei e a justiça pela

graça de Deus em Cristo? Paulo definitivamente não declara que a graça de Deus pôs de

lado a lei de Deus, mas antes pôs de lado a prevalecente tradição de “prevalecente pela

lei”. A teologia de Paulo colocou dois diferentes meios de salvação em oposição um ao

outro: salvação ou pela lei ou pela graça de Deus! Paulo explicou aos Gálatas: “Vocês,

que procuram ser justificados pela Lei, separaram-se de Cristo; caíram da graça” (Gál.

5:4, NVI). Tal era a polêmica da teologia de Paulo de justificação pela graça mediante a

fé em Cristo. Aos Romanos ele declarou isto positivamente: “Pois sustentamos que o

homem é justificado pela fé, à parte da obediência da Lei” (Rom. 3:28, New

International Version). O assunto é claramente sobre o mau uso da lei no judaísmo

como o meio de obter salvação, como Paulo o havia experimentado pessoalmente

dentro do judaísmo farisaico (veja Filip. 3:6-9).

Sobre a base de justificação pela graça, Paulo continua a mencionar os frutos da

justificação: paz com Deus, alegria no novo acesso a Deus, esperança em compartilhar a

glória de Deus, e a experiência do Espírito do Deus de amor:

Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor

Jesus Cristo; por intermédio de quem obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça

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na qual estamos firmes; e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus. . . . Ora, a

esperança não confunde, porque o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo

Espírito Santo, que nos foi outorgado. (Rom. 5:1, 2, 5).

Aos crentes justificados Paulo apresenta agora uma função positiva da lei: a

sabedoria da direção da lei de Deus para os que são conduzidos pelo Espírito de Deus.

Aos crentes justificados escreveu Paulo que o seu amor a Deus e ao próximo “cumpre”

a lei, porque “o amor é o cumprimento da lei” (Rom. 13:10). E novamente: “Mas, se

sois guiados pelo Espírito, não estais sob a lei.” (Gál. 5:18).

Alguns concluíram que amor substituiu a lei, mas Paulo não disse isso. Ele disse

explicitamente que o amor cumpre a lei, e: “Porque toda a lei se cumpre em um só

preceito, a saber: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” (Gál. 5:14). Ele não disse

que “Amor” é uma lei em si mesmo, fazendo a lei de Deus supérflua! Esse é o engano

fundamental que alguns estão cometendo em sua própria mente. Paulo requer amor,

porque nisto repousa o cumprimento da lei de Deus! Amor foi a divina intenção da lei,

da mesma maneira que Jesus tinha explicado em Sua interpretação Messiânica da lei em

Seu sermão no Monte.

Cranfield afirma que:

“para Paulo, a lei não é ab-rogada por Cristo. . . Para Paulo, a concessão do

Espírito é o estabelecimento da lei... na vida do crente... O Espírito Santo torna-o livre

para a obediência, capacitando-o a começar a chamar Deus de ‘Pai’ sinceramente,

sobriamente, inteligentemente, e ir fazendo cada vez mais consistentemente.” 4

A declaração problemática de Paulo em Romanos 6:14

Romanos 6:14 merece atenção especial, porque este verso é freqüentemente mal

interpretado na literatura evangélica popular: “Porque o pecado não terá domínio sobre

vós, pois não estais debaixo da lei, mas debaixo da graça” A palavra introdutória

“porque” indica que Paulo tira uma conclusão de sua declaração prévia: “Portanto, não

permitam que o pecado continue dominando os seus corpos mortais, fazendo que vocês

obedeçam aos seus desejos” (Rom. 6:12, NVI). Esta exortação está baseada na

experiência transformadora do “batismo em Cristo Jesus”, do crente como explicado em

Romanos 6:1-7.

Todo este capítulo 6 é a resposta de Paulo à pergunta desafiadora:

“Continuaremos pecando para que a graça aumente?” (Rom. 6:1, NVI).

Para Paulo o assunto aqui é: Que papel desempenha a lei de Deus em relação à

graça de Deus na vida cristã? O assunto aqui assim não é o papel da lei para nossa

justificação; esse assunto já foi estabelecido em Romanos 3-5.

A questão em Romanos 6 é o papel da lei em nossa vida santificada! Há realmente

algum uso da lei de Deus após a justificação, depois de a lei nos ter condenado diante

de Deus e nós termos sido unidos a Cristo pelo batismo? Estamos nós em Cristo ainda

“debaixo da lei” em seu domínio como senhor que condena, por causa de nossa

escravidão ao pecado e seu aviltante poder? Paulo diz: Não “porque o pecado não terá

domínio sobre vós [kyrieusei, “ser senhor sobre vós”], pois não estais debaixo da lei” ou

condenação (Rom. 6:14). Em seu batismo você aceitou a Cristo como seu novo Mestre.

Cranfield esclarece bem o assunto:

O pecado não será mais o seu senhor, porque outro senhor tomou posse deles, isto

é, Cristo. Isso não significa que o pecado não terá nenhum poder sobre eles [veja

7:14];... eles nunca ficarão novamente desamparados ao poder do pecado. 5

Paulo continua a contrastar agora o reino da lei contra o reino da graça. Ele

declara, “não estais debaixo da lei, mas debaixo da graça”. Muitos têm tomado esta

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frase para significar uma abolição da autoridade da lei sobre o crente cristão. Se

divorciado de seu contexto, pode ser interpretado dessa maneira. Mas em seu contexto

literário, a antítese de Paulo de estar “debaixo da lei” ou de estar “debaixo da graça”

indica antes estar debaixo do poder da condenação pelos que estão fora de Cristo, ou

estar debaixo do reino da justificação para os que estão em Cristo Jesus. Esta

compreensão está em perfeita harmonia com Romanos 8:1, onde Paulo conclui:

“Portanto, agora já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus.”

Estar “debaixo da graça” significa para Paulo estar debaixo do reino de Cristo

para viver uma vida em “justiça”, como declarou antes em 5:21 (“assim também

reinasse a graça pela justiça para a vida eterna, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor”).

Estar “debaixo da lei” significa para Paulo o oposto de estar “debaixo da

graça”, isto é, estar debaixo do domínio do pecado em nossa vida.

É instrutivo comparar as declarações paralelas de Paulo em Romanos e Gálatas:

Porque o pecado não será seu mestre, Mas se sois guiados pelo Espírito

porque não estais debaixo da lei, não estais debaixo da lei (Gál. 5:18)

mas debaixo da graça (Rom. 6:14).

Comparando ambas as declarações, nós vemos que para Paulo estar “debaixo da

graça” é sinônimo de ser “conduzido pelo Espírito”. O conceito de Paulo de ser

“conduzido pelo Espírito” implica, uma obediência guiada pelo Espírito ao Redentor.

Ele insiste com os crentes que percebam que eles tiveram mudança de “senhores” em

sua conversão e batismo em Cristo. Eles agora já não são os “escravos do pecado” mas

feitos “escravos da obediência que leva à justiça” (Rom. 6:6, 15-19).

Estar “em Cristo” significa para Paulo estar “debaixo da lei de Cristo” (1 Cor.

9:21) que é equivalente a “guardar os mandamentos de Deus” (1 Cor. 7:19), para que

“as justas exigências da Lei fossem plenamente satisfeitas em nós, que não vivemos

segundo a carne, mas segundo o Espírito” (Rom. 8:4, NVI). Esta é a experiência de

nova aliança através do ministério do Espírito Santo de Cristo.

O Derramamento pessoal do Espírito de Deus

O derramamento do Espírito Santo no Pentecoste em Atos 2 não pretendia

substituir a lei de Deus pelo dom do Espírito. Antes, o Espírito Santo cumpriu a

promessa da nova aliança dos profetas de Israel, de modo que agora a lei moral de Deus

seria escrita de novo efetivamente nos corações e mentes do povo de Cristo (veja Sal.

40:6-8; 51:10-12; 143:10; Ezeq. 36:26; 39:29). Como resultado, os apóstolos cheios do

Espírito receberam coragem para testemunhar diante do Sinédrio: “É preciso obedecer

antes a Deus do que aos homens!” (Atos 5:29, NVI).

Paulo informa a igreja que agora cada crente tem o privilégio de experimentar um

Pentecoste “individual” depois de estar primeiramente justificado pela fé em Cristo

(veja Rom. 5:1, 5). Todo crente tem que receber o Espírito de Cristo para pertencer a

Cristo, como Paulo escreve: “E, se alguém não tem o Espírito de Cristo, não pertence a

Cristo” (Rom. 8:9, NVI).

O Espírito de Cristo, porém, não substitui a lei de Deus mas antes torna a lei

espiritualmente ativa para descobrir o pecado mais plenamente em nossa “mente

pecadora”, porque “a mente pecadora é hostil a Deus. Não se submete à Lei de Deus,

nem pode fazê-lo” (Rom. 8:7, New International Version). Assim o Espírito motiva o

pecador perdoado a ordenar a sua vida em harmonia com a santa lei de Deus. O Espírito

e a lei de Deus então ficam tão unidos que a lei de Deus se torna o “espada do Espírito”

Page 6: Paulo a Lei e a Nova Aliança

(cf. Efés. 6:17). Tal é o ensino de Paulo de seu ministério evangélico. Amor nunca é

uma lei em si mesmo, porém o cumprimento da lei de Deus. Falar de “a lei do amor”

pode ser aceito como um princípio geral de abençoar a outros, mas é mau uso quando é

dissecado da real “lei da liberdade” de Deus e da justiça (veja Tia. 2:12). Então tal

slogan representa mal o pleno evangelho apostólico.

Dietrich Bonhoeffer insistiu corretamente: “Só é quando alguém se submete à lei

que pode falar da graça.”6 O Espírito Santo não é um novo Legislador e não substitui a

Palavra escrita de Deus. O Espírito é enviado para acompanhar, iluminar e autorizar a

Palavra de Deus. Deus sempre envia Seu Espírito para unir-se à Sua Palavra como uma

parte integrante de Sua aliança da graça, como Isaías ensinou com clareza

surpreendente: “Quanto a mim, esta é a minha aliança com eles, diz o SENHOR: o meu

Espírito, que está sobre ti, e as minhas palavras, que pus na tua boca, não se apartarão

dela . . . desde agora e para todo o sempre, diz o SENHOR.” (Isa. 59:21).

Paulo rejeita o “modo velho” de administrar o “código escrito”, quer dizer, a lei

sem o Espírito. O apóstolo sustenta que ele agora “serve a Deus conforme o novo modo

do Espírito” (Rom. 7:6, NVI). Esse novo ministério do Espírito significa para Paulo

“confirmar a lei” de Deus (veja Rom. 3:31), para que “as justas exigências da Lei

fossem plenamente satisfeitas em nós, que não vivemos segundo a carne, mas segundo o

Espírito” (Rom. 8:4, NVI). Tais cristãos espirituais não estão “debaixo da lei” (Gál.

5:18). Paulo declara que ele não está “sem a lei [anomos] de Deus”, porque ele está

agora no esquadro da lei de Cristo [ennomos Christou ou, “debaixo da lei de Cristo”], e

em harmonia com a lei de Deus por causa de Cristo (1 Cor. 9:21; 7:19).

Bonhoeffer expressou isto em condições pastorais:

“O cristão não vive simplesmente pela lei moral. Os cristãos também vivem pela

graça de Deus e pela influência do Espírito Santo. . . isso torna nossa ação uma justiça

mais alta que simplesmente o literal cumprimento da lei. Porque o amor não conhece

nenhum limite, ele sempre cumpre a lei.”7

Referências:

1. New Covenant in the Old Testament. Waco, TX: Word Books, 1976, 11, 12.

2. Cranfield, The Epistle to the Romans. ICC. Edinburgh: Clark, vol. 2 [1979],

853.

3. Cranfield,16, 2:515-520, 848.

4. Cranfield, Ib., 2.852, 861.

5. Cranfield, 16 , 1:319.

6. In Letters and Papers from Prison.

7. Quoted in Seize the Day, by, C.R. Ringma. Piñon Press, 2000, April 10.

___________________________

*Este artigo está baseado no em um dos capítulo do livro “Aliança de Deus na Bíblia”,

escrito pelo Dr. Hans K. LaRondelle (1929 – 2011). LaRondelle foi professor da

disciplina de Teologia Sistemática na Andrews University entre os anos de 1967 a 1991

e posteriormente continuou como professor emérito na mesma universidade. Ele é autor

de diversos artigos e livros como: Perfection and Perfectionism, Christ Our Salvation,

Deliverance in the Psalms, The Israel of God in Prophecy, and The Good News About

Armageddon, Assurance of Salvation, How to Understand the End-time Prophecies of

the Bible, and Our Creator Redeemer, entre outros.