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1 AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA “DO BERÇO AO BERÇO” DE COBERTURAS PLA- NAS R. GOMES J.D. SILVESTRE J. DE BRITO Prof. Engª Militar Prof. Auxiliar Prof. Catedrático Academia Militar IST IST Lisboa; Portugal Lisboa; Portugal Lisboa; Portugal [email protected] [email protected] [email protected] RESUMO Nesta comunicação, apresenta-se um trabalho de investigação que está a ser iniciado, onde se pretende aplicar a meto- dologia de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) a coberturas planas de edifícios. O estudo prevê o desenvolvimento de estudos nacionais de ACV da produção de materiais utilizados nas coberturas planas de edifícios correntes; a avaliação simultânea do desempenho ambiental, económico e energético deste tipo de coberturas e a criação de uma base de da- dos de ACV de uma solução construtiva corrente de edifícios em Portugal. Em síntese, os principais objectivos do estu- do aqui mencionado são apresentar uma possível classificação das soluções estudadas em classes de decrescente de- sempenho nas dimensões referidas contribuindo para a sua selecção na fase de projecto e, assim, ajudar a diminuir o consumo de alguns dos mais importantes recursos e contribuir para uma construção mais sustentável. 1. INTRODUÇÃO A melhoria dos métodos e técnicas de construção, assim como a utilização de materiais e ferramentas que provoquem menos impactes ambientais no sector da construção em Portugal, representam objectivos a alcançar pelos vários inter- venientes, em obras públicas e em empreendimentos privados, na busca de um futuro ambientalmente sustentável. Os projectistas devem procurar, de forma crescente, empregar soluções construtivas sustentáveis nos seus projectos, em particular nos edifícios. Por outro lado, as empresas de construção devem procurar maximizar a sustentabilidade desta área de actividade e os investidores privados incluir formas adicionais de promover os seus investimentos minimizando, simultaneamente, os impactes no ambiente [1]. Para se tornar sustentável, a construção necessita de possuir ferramentas, de base científica, que permitam aferir a real sustentabilidade de cada empreendimento e, nomeadamente, possibilitar a escolha de soluções construtivas que optimi- zem esse conceito, de entre as disponíveis no mercado. Os impactes ambientais das soluções construtivas são diferentes, bem como os impactes económicos e sociais, dependendo da origem dos materiais que as constituem, dos recursos que estão afectos à sua execução, das necessidades de manutenção, da vida útil potencial e do destino mais provável aquan- do da sua substituição ou da demolição da obra. Assim, as preocupações ambientais já não se centram, apenas, na fase de execução da obra e nos respectivos impactes ambientais, mas também na avaliação desses efeitos ao longo do ciclo de vida dos empreendimentos de construção. Decorre daqui a necessidade de se intensificar a procura de uma abordagem integrada que tenha em consideração os impactes ao longo do ciclo de vida de cada uma das soluções construtivas que constituem as estruturas com maior signi- ficado em todo o mundo - os edifícios [2].

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AVALIAÇÃO DO CICLO D E VIDA “DO BERÇO AO BERÇO” DE COBERTURAS PLA-NAS

R. GOMES J.D. SILVESTRE J. DE BRITO Prof. Engª Militar Prof. Auxiliar Prof. Catedrático Academia Militar IST IST Lisboa; Portugal Lisboa; Portugal Lisboa; Portugal [email protected] [email protected] [email protected]

RESUMO Nesta comunicação, apresenta-se um trabalho de investigação que está a ser iniciado, onde se pretende aplicar a meto-dologia de Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) a coberturas planas de edifícios. O estudo prevê o desenvolvimento de estudos nacionais de ACV da produção de materiais utilizados nas coberturas planas de edifícios correntes; a avaliação simultânea do desempenho ambiental, económico e energético deste tipo de coberturas e a criação de uma base de da-dos de ACV de uma solução construtiva corrente de edifícios em Portugal. Em síntese, os principais objectivos do estu-do aqui mencionado são apresentar uma possível classificação das soluções estudadas em classes de decrescente de-sempenho nas dimensões referidas contribuindo para a sua selecção na fase de projecto e, assim, ajudar a diminuir o consumo de alguns dos mais importantes recursos e contribuir para uma construção mais sustentável. 1. INTRODUÇÃO A melhoria dos métodos e técnicas de construção, assim como a utilização de materiais e ferramentas que provoquem menos impactes ambientais no sector da construção em Portugal, representam objectivos a alcançar pelos vários inter-venientes, em obras públicas e em empreendimentos privados, na busca de um futuro ambientalmente sustentável. Os projectistas devem procurar, de forma crescente, empregar soluções construtivas sustentáveis nos seus projectos, em particular nos edifícios. Por outro lado, as empresas de construção devem procurar maximizar a sustentabilidade desta área de actividade e os investidores privados incluir formas adicionais de promover os seus investimentos minimizando, simultaneamente, os impactes no ambiente [1]. Para se tornar sustentável, a construção necessita de possuir ferramentas, de base científica, que permitam aferir a real sustentabilidade de cada empreendimento e, nomeadamente, possibilitar a escolha de soluções construtivas que optimi-zem esse conceito, de entre as disponíveis no mercado. Os impactes ambientais das soluções construtivas são diferentes, bem como os impactes económicos e sociais, dependendo da origem dos materiais que as constituem, dos recursos que estão afectos à sua execução, das necessidades de manutenção, da vida útil potencial e do destino mais provável aquan-do da sua substituição ou da demolição da obra. Assim, as preocupações ambientais já não se centram, apenas, na fase de execução da obra e nos respectivos impactes ambientais, mas também na avaliação desses efeitos ao longo do ciclo de vida dos empreendimentos de construção. Decorre daqui a necessidade de se intensificar a procura de uma abordagem integrada que tenha em consideração os impactes ao longo do ciclo de vida de cada uma das soluções construtivas que constituem as estruturas com maior signi-ficado em todo o mundo - os edifícios [2].

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Nesse contexto, a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV; Life Cycle Assessment - LCA) surge como uma abordagem rele-vante, embora necessite de alguns ajustes, tanto em termos científicos como técnicos, para se poder aplicar de forma adequada a esta área do conhecimento. O estudo que se pretende divulgar nesta comunicação tem em vista a elaboração de uma tese de doutoramento relativa à aplicação da metodologia de ACV do berço ao berço de soluções construtivas, a coberturas planas de edifícios correntes (Figura 1).

(a) (b) Figura 1 - Coberturas planas de edifícios correntes (Parque das Nações, Lisboa): (a) Campus da Justiça; (b) Edifício de

habitação. 2. IDENTIFICAÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DO ESTUDO 2.1 Objectivos a atingir O estudo a desenvolver apresenta como objectivos principais: o desenvolvimento de estudos nacionais de ACV da pro-dução de materiais utilizados nas coberturas planas, usando dados recolhidos directamente em fábricas; a aplicação de uma metodologia inovadora1 para a selecção de um conjunto coerente de dados de ACV, de materiais e sistemas de construção, que possam ser usados como genéricos no contexto nacional, podendo esta metodologia também ser usada para confirmar a validade de resultados de ACV obtidos neste estudo em comparação com os disponíveis em estudos anteriores de investigação; a aplicação de um método para a avaliação simultânea do desempenho ambiental, económico e energético das coberturas planas dos edifícios, baseado nos dados do ACV dos seus elementos, inovador a nível inter-nacional, e que pode auxiliar na minimização da depleção de importantes recursos empregues na construção de edifí-cios; a criação de uma base de dados de ACV de coberturas planas de edifícios em Portugal, a qual será a primeira a ser construída no país. 2.2 Âmbito De entre os vários elementos que compõem a envolvente exterior dos edifícios, as coberturas planas foram escolhidas de forma a ser definido um âmbito mais estreito e realista da proposta para este estudo e também pela sua importância como elemento da envolvente dos edifícios, condicionando o seu isolamento face à humidade e às variações térmicas exteriores, assim como pelo facto de incluírem materiais de diferentes proveniências na sua constituição, revestimento e isolamento (e.g. minerais, poliméricos, lenhosos e metálicos). As coberturas planas, além de serem um elemento construtivo fundamental na garantia da estanqueidade à água e à humidade da envolvente exterior dos edifícios, representam uma das zonas por onde ocorre grande parte das trocas térmicas com o exterior, levando a que o comportamento térmico das fracções individuais do último piso de um edifí-cio, e do edifício como um todo, sejam condicionados pelo melhor ou pior desempenho desse elemento construtivo. Ao constituírem toda a envolvente horizontal de um edifício, estas coberturas são ainda um elemento construtivo bastante significativo em termos de recursos materiais afectos à sua execução, aumentando assim a importância da avaliação ambiental dos vários materiais de construção que as constituem. Acresce também que, embora seja reconhecida a im-

1 Inovadora porque permite selecionar de forma sistemática os dados de ACV a utilizar em cada país em função dos dados existentes no Universo Europeu.

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portância destes elementos no desempenho global da envolvente dos edifícios, ainda é reduzida a disponibilidade de informação interligando as suas características ambientais e funcionais. De entre os diferentes tipos de coberturas planas, serão estudadas as soluções apresentadas nos edifícios correntes em Portugal, nomeadamente as que se encontram incluídas na publicação ITE 50 - Coeficientes de transmissão térmica de elementos da envolvente dos edifícios - do Laboratório Nacional de Engenharia Civil [3]. As coberturas planas (em terraço) utilizadas nos edifícios correntes em Portugal são constituídas, entre outras camadas, por uma estrutura resis-tente, soluções de isolamento térmico e soluções de protecção exterior. Na Figura 2, sugere-se uma possível classifica-ção para este tipo de coberturas. Alguns autores sugerem a possibilidade de as coberturas serem classificadas também de acordo com a posição relativa do isolamento térmico em relação ao sistema de impermeabilização (normal ou inver-tida). Em face da diversidade de soluções possíveis para constituição da camada de forma, que se destina a regularizar a camada superior do elemento resistente e a dar-lhe a necessária pendente de escoamento, optou-se por uma solução convencional de referência constituída por betão cavernoso de agregados de argila expandida com massa volúmica seca da ordem de 600 a 800 kg/m3 e uma espessura média de 0,10 m (podendo no entanto ser consideradas no desenvolvi-mento deste estudo soluções adicionais em que os agregados leves são constituídos por outros materiais) [3].

Figura 2 - Resumo de diversos tipos de classificação de coberturas planas.

Este estudo propõe assim a realização da ACV das soluções de coberturas planas (em terraço) dos edifícios correntes, a qual será obtida numa perspectiva do berço ao berço. Isto significa que serão detalhados todos os processos pelos quais os materiais de construção utilizados em coberturas planas passam, desde a extracção das matérias-primas até ao depó-sito final ou reutilização. Os dados relacionados com estes materiais, incluindo a produção, transporte e montagem dos mesmos no local de construção do edifício serão recolhidos sempre que possível de fabricantes e revendedores portu-gueses e, complementarmente, de bases de dados internacionais de Inventários de Ciclo de Vida (ICV). 3. METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO Para atingir os objectivos referidos, será necessário estabelecer a natureza e o encadeamento de cada uma das tarefas individuais que, em conjunto e depois de concluídas, permitirão a obtenção desse desiderato. Assim, ir-se-á realizar a ACV, do berço ao berço, das soluções mais comuns de coberturas planas dos edifícios correntes em Portugal, as quais serão seleccionadas logo no início dos trabalhos, e serão enumerados os materiais de construção que as compõem. Seguir-se-á o benchmarking dos ICV incluídos em bases de dados internacionais, possibilitando assim a obtenção do ICV de todos os materiais de construção (incluídos nas soluções de coberturas planas seleccionadas) ajustados ao mer-cado português. Posteriormente, a ACV desses materiais de construção e a ACV das soluções de coberturas planas de

Tipo

(RCCTE)

Cobertura em terraço

Acessibilidade

Limitada

Acessiveis à circulação e

permanência de pessoas

Acessiveis à circulação e

permanência de veículos

Especiais

Protecção

Sem Protecção

Com protecção

leve

Com protecção

pesada

Pendente

(UEAtc)

Classe I

Classe II

Classe III

Classe IV

Estrutura

Rígida continua

Rígida descontínua

Flexivel

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edifícios correntes serão determinadas através de uma ferramenta comercial de ACV e do correspondente Método de Avaliação de Impacte Ambiental (MAIA; Environmental Impact Assessment Method - EIAM). Este trabalho será realizado pela segunda vez em Portugal [2], permitindo assim avaliar a sustentabilidade de uma solu-ção construtiva através de uma abordagem quantificada baseada nas normas internacionais em vigor. A ACV obtida no passo anterior será comparada com ACV contidas em bases de dados internacionais de forma a identificar as grandes diferenças entre elas, permitindo uma correcção final rigorosa dos resultados obtidos. Como corolário deste estudo, os parâmetros ambientais, energéticos e económicos de cada solução de cobertura plana seleccionada serão confrontados. Esta comparação será de grande importância para a fase de projecto do edifício, mini-mizando o consumo de alguns dos mais importantes recursos e contribuindo para uma construção sustentável. Como resultado, serão sugeridas as classificações das soluções em classes de decrescente desempenho entre a classe A++ e a classe E (tal como definidas no sistema LiderA) [4]. 4. ESTUDOS A DESENVOLVER 4.1 Compilação e selecção das soluções de coberturas planas mais comuns nos edifícios em Portugal A compilação das soluções de coberturas planas (CP), mais comuns nos edifícios em Portugal incluirá o balanço e a análise das principais referências bibliográficas portuguesas nesta matéria embora, como referido, a referência principal seja a publicação ITE 50 do LNEC [3], assim como eventuais soluções construtivas inovadoras produzidas em Portugal (Figura 3). Com base nesta consulta bibliográfica, serão escolhidas as soluções mais comuns de CP no projecto e na construção de edifícios em Portugal. Para o grupo de soluções seleccionadas, será elaborada uma lista dos materiais de construção correspondentes, a qual deverá incluir os materiais aplicados na estrutura resistente, e nas soluções de isola-mento térmico, de impermeabilização e de protecção exterior.

Figura 3 - Constituição das soluções mais comuns de coberturas planas nos edifícios em Portugal [5].

Este processo permitirá validar ou complementar a bibliografia de referência (ITE 50) no que respeita ao grupo de solu-ções que se considerarão para investigação. Como ponto de partida para o levantamento das soluções mais usuais em Portugal, considera-se que as soluções aplicadas na estrutura resistente incluirão: laje maciça de betão armado, com 0,10 a 0,20 m de espessura ou lajes aligeiradas com espessuras variáveis entre 0,13 a 0,15 m e 0,33 a 0,35 m que inclu-em a camada superior de betão de regularização aplicado em obra (com 0,03 a 0,05 m de espessura) integrando vigotas pré-fabricadas de betão armado ou pré-esforçado e blocos de cofragem. A camada de forma seguirá os critérios defini-dos em 2.2. Não serão consideradas soluções resistentes de chapa metálica nervurada, uma vez que as mesmas são nor-malmente empregues na construção de edifícios industriais, que se encontram fora do âmbito desta investigação.

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Nas soluções de isolamento térmico, serão consideradas as que não incorporem qualquer elemento específico destinado ao isolamento térmico e as que incorporem isolante térmico aplicado pelo exterior, em posição superior à estrutura resistente, de forma a protegê-la contra variações térmicas de origem exterior. Tal deve-se ao facto de ser tecnicamente desaconselhada a utilização, pelo interior deste tipo de coberturas, de isolante térmico sob a estrutura resistente, em virtude de agravar com frequência as solicitações termomecânicas na estrutura e no revestimento exterior da cobertura, além de conduzir ao risco de ocorrência de condensações de humidade no interior do elemento resistente e de reduzir a inércia térmica interior do edificado [3]. As soluções de isolamento térmico consideradas serão as que desempenham a função de suporte de impermeabilização (Figura 4) e as aplicadas sobre a impermeabilização (solução conhecida como cobertura invertida). Os matérias empre-gues nestas soluções incluirão placas de aglomerado de cortiça expandida (ICB), placas de lã mineral de massa volúmi-ca elevada (MW), placas de poliestireno expandido moldado (EPS) e placas de espuma rígida de poliisocianurato (PIR) ou de poliuretano (PUR). Nas soluções de coberturas invertidas, considera-se apenas a utilização de placas de poliesti-reno expandido extrudido (XPS). A inclusão do aglomerado de cortiça expandida (ICB) neste estudo é da maior impor-tância para Portugal, dado que este material de construção possui um elevado potencial de exportação. O ICB tem ainda vantagens ambientais, algumas já quantificadas pelos autores deste artigo, necessitando as mesmas de ser complemen-tadas, através de métodos científicos rigorosos, e comparadas com as de outros materiais de isolamento com desempe-nho térmico semelhante, de forma a serem inequivocamente aceites a nível nacional e internacional.

Figura 4 - Colocação do isolamento térmico numa cobertura plana tradicional [9].

Para soluções de impermeabilização, destinadas a impedir a passagem de água para o interior das coberturas, serão consideradas as mais correntes constituídas por: soluções rígidas com base em ligantes hidráulicos (argamassa com aditivo hidrófugo ou modificada com polímeros); membranas de ligantes hidrocarbonados (asfalto ou betume) ou sinté-ticos (epóxido, acetato de polivinilo, resinas acrílicas); telas flexíveis pré-fabricadas asfálticas (asfalto oxidado ou modi-ficado com polímeros) ou de polímeros (butílica - poli isso butileno isopreno, EPDM - monómero de etileno propileno dieno, PVC - policloreto de vinil e PEAD - polietileno de alta densidade). No caso de aplicação de telas asfálticas em soluções de cobertura invertida, poder-se-á aplicar uma camada de geotêxtil entre a tela e o isolamento térmico. Por fim, nas soluções de protecção exterior (mecânica e climática), serão consideradas duas correntes: protecção leve e protecção pesada. A primeira é constituída como autoprotecção em coberturas não acessíveis utilizando partículas de xisto, cerâmicas ou metálicas na camada superior do sistema de impermeabilização sem necessidade de protecção cli-mática complementar. A segunda solução é constituída por camadas de seixos ou de brita sem finos, lajetas sobre apoi-os pontuais ou soluções de massa unitária relativamente elevada. Considera-se como comum, para estas protecções, uma espessura igual à do isolante térmico, com um mínimo de 0,005 m. Este tipo de protecção é empregue em ambas as soluções de coberturas planas (normal ou invertida). No caso de cobertura invertida, considera-se ainda uma solução constituída por uma camada de protecção mecânica aplicada em fábrica e aderente às placas do isolante térmico, em geral realizada por um revestimento de ligantes e agregados minerais de pequena ou média dimensão (areia ou gravilha) ou por elementos cerâmicos.

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4.2 Definição dos ICV conceptuais A investigação será iniciada com a estruturação do ICV conceptual dos materiais de construção que compõem as solu-ções de CP escolhidas, ou seja, a definição do objectivo e do âmbito da análise a realizar, no âmbito da ACV (impactes ambientais e desempenho ao longo da vida das CP), incluindo o inventário dos processos envolvidos no ciclo de vida completo desses produtos e a enumeração das respectivas entradas e saídas do sistema. Para cada um desses processos, serão identificadas as possíveis fases, em Portugal ou no estrangeiro, e escolhidas as principais actividades, materiais e entidades envolvidas. A unidade funcional será o peso mínimo do material (kg) necessário para a execução de um metro quadrado de uma CP, com enfoque nas suas matérias-primas mais importantes e até ao nível de detalhe de informação que seja necessário. Os materiais que serão estudados (confirmados à data de elaboração do presente artigo) são: betoni-lha de regularização; EPS granulado virgem, triturado e triturado aditivado (usados como agregado para betão leve); placas de EPS; membrana de betume modificado auto-protegidas com xisto na face superior e polietileno na face inferi-or e armadura de feltro de poliéster; membrana de betume modificado auto-protegida em ambas as faces com polietile-no e armadura de fibra de vidro; membrana de betume modificado auto-protegida em ambas as faces com polietileno e armadura de feltro de poliéster e, por fim, membrana líquida de base acrílica. Nesta fase do trabalho, será ainda analisada a necessidade de construir outros ciclos de vida dos materiais mais impor-tantes, devido quer ao seu peso próprio quer a outro critério ambiental (e.g. toxicidade). Deste trabalho, resultarão o ICV conceptual esquemático detalhado de cada material de construção e a identificação das entidades que terão de ser contactadas de modo a ser obtida informação para completar os mesmos. 4.3 Análise e escolha de uma ferramenta informática de ACV e correspondente MAIA Nesta fase, será realizada a análise das ferramentas informáticas internacionais de ACV (ex.: SimaPro, GaBi, TEAM e Boustead) adequadas para a determinação da ACV dos materiais de construção incluídos nas CP, de modo a que possa ser escolhida a mais apropriada para os objectivos desta investigação. Este software terá de permitir a utilização do MAIA definido na norma Europeia de referência (ex.: a EN 15804:2012+A1:2013 define a utilização do método pro-posto pelo Institute of Environmental Sciences (CML) da Universidade de Leiden, na Holanda, nomeadamente da ver-são 4.1 do CML-IA de Outubro de 2012 [6]). Para isso, realizar-se-á a simulação da ACV de uma das soluções de CP mais comuns de edifícios em Portugal (de entre as seleccionadas) com cada uma das versões de demonstração das fer-ramentas informáticas, de modo a confirmar as capacidades das mesmas. A simulação será executada de acordo com o ICV conceptual já definido para cada material de construção. As bases de dados e os MAIA incluídos em cada ferra-menta serão testados e todos os resultados serão analisados e comparados. As conclusões obtidas permitirão, através de critérios científicos, definir o ICV dos materiais de construção em estudo e escolher a ferramenta mais adequada para realizar a ACV de materiais de construção e de soluções construtivas, em conjunto com o correspondente MAIA. O uso da ferramenta de ACV e do MAIA mais adequados é essencial para justi-ficar, através de métodos científicos, os dados a obter na determinação das ACV. Este trabalho validará a aplicação dos dados obtidos como referência para a ACV das CP dos edifícios em Portugal. 4.4 Comparação entre os ICV existentes dos materiais de construção Esta fase da investigação incluirá a selecção e a análise detalhada de bases de dados internacionais (de Declarações Ambientais de Produto - DAP, mas também de ICV como as Ecoinvent, BUWAL 250, IDEMAT 2001, e IVAM data-base) e permitirá identificar os materiais de construção, de entre os enumerados no ponto 4.1, com impacte ambiental mais significativo e com maior variabilidade geográfica de dados, com base nos respectivos ICV que já existam. O objectivo desta fase será o de identificar os materiais de construção cujo ICV tem de ser detalhado de acordo com o mercado português e, por oposição, os materiais de construção cujo ICV pode ser aplicado directamente. Uma das grandes dificuldades de efectuar a ACV de um processo ou produto é a sua variabilidade geográfica. Como tal, o ICV sobre o qual a ACV é realizada tem de ser ajustado às características do país onde a ACV tem de ser representativa [7]. Como resultado, será construída uma base de dados de ICV dos materiais de construção incluídos neste estudo compa-tíveis com o mercado português e serão identificados os materiais de construção que necessitam de um ajuste no respec-tivo ICV para se adequarem ao mercado português. Serão também solicitados aos respectivos fabricantes os dados dis-poníveis em Portugal relacionados com a ACV dos materiais de construção incluídos nas soluções de CP seleccionadas para estudo, de modo a poderem ser utilizados de forma directa. Para alguns dos casos em que esta informação não

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esteja disponível, serão seleccionados e contactados fabricantes nacionais de modo a que seja recolhida em fábrica e incluída no correspondente ICV toda a informação relacionada com a produção (e também com o transporte e monta-gem em obra) dos materiais, utilizando-se assim estes dados locais em vez de dados oriundos de outros países. 4.5 Determinação da ACV dos materiais de construção incluídos nas CP dos edifícios em Portugal e benchmarking Após a definição do ICV (adaptados ao mercado português), será realizada a ACV destes materiais de construção inclu-ídos nas CP mais comuns nos edifícios em Portugal e a ACV das correspondentes soluções construtivas. Primeiramente, o ICV dos materiais de construção identificados como tendo parâmetros não-conformes com o mercado português tem de ser ajustado. Este ajuste será feito através da recolha de dados junto dos fabricantes desses materiais, das empresas de construção e do Instituto Nacional de Estatística. Seguidamente, para os materiais e fabricantes nacionais selecciona-dos, será recolhida toda a informação relacionada com a produção, transporte e montagem em obra para construir o respectivo ICV. A determinação da ACV dos materiais de construção será realizada através dos ICV definidos e das ferramentas esco-lhidas. Será em seguida aplicada uma metodologia inovadora (NativeLCA [2]) para confirmar a validade dos resultados de ACV obtidos com base na sua comparação com os já disponíveis em estudos anteriores de investigação. 4.6 Determinação ACV das CP e benchmarking A ACV das CP resultará da composição das ACV dos materiais de construção individuais, tendo em consideração as vidas úteis estimadas para cada um dos materiais de construção e seguindo, além dos princípios descritos na norma internacional ISO 14040:2006 - “Environmental management - Life cycle assessment - Principles and framework” [8], preferencialmente a abordagem de ACV baseada em processos [6]. Estes resultados serão os primeiros a ser obtidos em Portugal, nesta área do conhecimento e permitirão a publicação, pela primeira vez no país, de dados actuais obtidos com base científica relacionados com a ACV do berço ao berço de materiais de construção e soluções construtivas empregues em coberturas planas. Desta forma, a anterior base de dados iniciada pelo terceiro autor deste artigo, para materiais e soluções construtivas empregues em paredes exteriores, poderá ser complementada, caminhando-se, juntamente com futuros estudos de ACV de diferentes elementos dos edifícios, para a construção de uma base de dados actual, com base científica, relacionados com a ACV do berço ao berço dos materiais e soluções construtivas de edifícios produzidos e instalados no país. Para se validar e calibrar as ACV obtidas, estas serão comparadas com as ACV incluídas em algumas das mais reco-nhecidas ferramentas internacionais de avaliação da sustentabilidade de edifícios (ex.: Athena no Canadá, Ecobat na Suíça, BEES nos EUA), para a mesma solução construtiva. Seguir-se-á uma análise crítica dos resultados obtidos da qual poderão resultar alterações às ACV obtidas, se estas forem muito divergentes, daquelas incluídas nas bases de dados estudadas. 4.7 Análise detalhada da relação entre a ACV das CP e o correspondente Custo do Ciclo de Vida (CCV; Life Cycle Cost - LCC) e desempenho térmico (por metro quadrado de área de cobertura) e respectiva classificação Será realizada uma análise detalhada da relação entre a ACV das CP obtidas e o correspondente CCV e desempenho térmico (por metro quadrado de área de cobertura). Para tal, será aplicado um método inovador a nível internacional para a avaliação simultânea do desempenho ambiental, económico e energético de soluções construtivas de edifícios (3E-C2C). O desempenho térmico será caracterizado de acordo com os coeficientes de transmissão térmica, de cada solução de CP, incluídos na publicação de referência do LNEC, ITE 50 [3], a qual é correntemente utilizada, e reco-mendada na legislação em vigor, para o cálculo do desempenho térmico dos edifícios em Portugal. Este estudo poderá ser complementado com a análise de sensibilidade a alguns dos parâmetros considerados, como a espessura da camada de isolamento térmico ou a taxa de utilização dos equipamentos de climatização. Desta análise, resultará um mapa comparativo entre todas as soluções existentes para vários níveis de desempenho tér-mico, o qual será da maior importância para todos os projectistas de edifícios uma vez que poderá permitir a minimiza-ção do custo e do impacte ambiental do berço ao berço das soluções construtivas e a maximização do correspondente desempenho térmico. Pretende-se, desta forma, identificar as soluções com um balanço global positivo entre o impacte ambiental e os ganhos de energia e aquelas cujo balanço é negativo e que devem ser descartadas na prática.

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O desempenho ponderado de cada solução construtiva (e dos respectivos materiais) será classificado entre ambiental-mente regenerativo (A++), o que significa que terá um elevado impacte ambiental positivo, e impacte altamente negati-vo (E). A atribuição de uma classificação quantitativa, entre A++ a E permitirá contribuir para a escolha operacional e prática dos materiais a prescrever no processo construtivo da solução definida. Esta classificação poderá ser disponibili-zada através de uma ferramenta de apoio ao projecto de edifícios, permitindo assim a avaliação comparativa da susten-tabilidade de soluções construtivas mesmo que não apresentem desempenho funcional semelhante. 5. CONCLUSÃO Pretende-se que os resultados deste trabalho contribuam para acrescentar dados ambientais referentes a materiais e solu-ções construtivas empregues na indústria da construção em Portugal, e permitir a avaliação da sustentabilidade de solu-ções construtivas em coberturas planas de edifícios com desempenho funcional semelhante (ou diferente) através de critérios normalizados e definidos de forma cientificamente rigorosa. Para tal, será continuada a metodologia de ACV desenvolvida pelo segundo autor deste artigo, adequada para soluções construtivas, a qual foi aplicada a paredes exteriores e agora será aplicada a coberturas planas. Esta investigação permi-tirá ainda validar, sistematicamente, a sua aplicação na ACV de soluções construtivas dos edifícios. Os resultados obtidos na ACV das soluções de coberturas planas permitirão obter um mapa comparativo entre todas as soluções existentes para vários níveis de desempenho térmico, incluindo os respectivos custos e impactes ambientais, do berço ao berço. Estes objectivos são, normalmente, as principais prioridades do projectista quando pretende alcançar os pressupostos da construção sustentável. Como resultado complementar, surgirá a classificação das soluções adoptadas de CP por clas-ses, da melhor para a pior (A++, A+, A, B, C, D e E) em termos de desempenho ambiental de modo a facilitar a comu-nicação e o uso da informação obtida na ACV. Esta classificação permitirá a selecção das soluções de coberturas planas com melhor desempenho ambiental de uma forma consciente e com base científica, possibilitando uma efectiva evolução rumo a uma construção mais sustentável através da minimização das cargas poluentes sobre o meio ambiente e, desta forma, um modesto contributo para um futuro mais sustentável de Portugal. 6. REFERÊNCIAS [1] Ferrão, P. C. (2009) Ecologia Industrial. Princípios e ferramentas. Colecção Ensino da Ciência e da Tecnologia:

Vol 29. Lisboa: IST Press - Instituto Superior Técnico. [2] Silvestre, José (2012) Life cycle assessment “from cradle to cradle” of building assemblies - Application to

external walls, Tese de Doutoramento em Engenharia Civil, Instituto Superior Técnico - Universidade Técnica de Lisboa, Lisboa, Portugal.

[3] Santos, P. d., & Matias, L. (2006) Coeficientes de transmissão térmica de elementos da envolvente dos edifícios. Informação Técnica de Edifícios: Vol. 50. Lisboa: Laboratório Nacional de Engenharia Civil.

[4] Pinheiro, M. D. (2008). Sistemas de gestão ambiental para a construção sustentável. Tese de Doutoramento em Engenharia do Ambiente, Instituto Superior Técnico - Universidade Técnica de Lisboa, Lisboa, Portugal.

[5] Pombo, J. (2014). Aula: Sistemas de impermeabilização em edifícios. Revestimentos de coberturas em terraços. Tecnologia, patologia e reabilitação. [Apresentação em Power Point]. Curso de Mestrado em Construção e Rea-bilitação. Instituto Superior Técnico. Lisboa: Academia Imperalum.

[6] EN 15804:2012+A1. (2013) Sustainability of construction works - Environmental product declarations - Core rules for the product category of construction products: Comité Européen de Normalisation - CEN, Brussels, Belgium.

[7] Filho, A. C. C. (2004). Análisis del ciclo de vida de productos derivados del cemento - Aportaciones al análisis de los inventários del ciclo de vida del cemento. Thesis Doctoral, Escola Técnica Superior D´Enginyers de Camins, Canals/Ports de Barcelona., Barcelona, Spain.

[8] ISO 14040:2006(E). (2006). Environmental management - Life cycle assessment - Principles and framework: International Organization for Standardization - ISO.

[9] DOW. (25 de Setembro de 2014). Obtido de Website de DOW Chemical: http://www.dow.com/